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Música / Lollapalooza 2019

Silva defende Tribalistas como headliner: 'Cabeça fechada tem no festival e na bancada do Bolsonaro'

O cantor, que também irá se apresentar no evento, comentou sobre a polêmica que envolve o trio brasileiro

Baárbara Martinez Publicado em 05/04/2019, às 11h10 - Atualizado às 11h38

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Silva - Wilmore Oliveira
Silva - Wilmore Oliveira

Em uma semana onde somos bombardeados com informações sobre o massacre em Suzano, que matou 8 pessoas em uma escola estadual, nada mais impactante do que conversar com alguém que tem esperança no Brasil. Confiança que fez Silva nomear seu último álbum como Brasileiro.

Leveza. É isso que você sente no compositor quando escuta as últimas canções do cantor e isso só reflete no modo como o artista é. "Vou me lembrar do dom / Que é poder respirar", diz a canção Duas da Tarde que abre o disco.

Atração do Lollapalooza 2019, conversamos com o novo queridinho da MPB sobre a estrada que o artista de 30 anos tem trilhado.

AMADURECIMENTO

O músico ganhou mais visibilidade em seu terceiro disco nomeado como Júpiter, lançado em 2015. Comparado com seu último trabalho, o artista ressalta que muita coisa mudou desde então. "Eu falo muito da minha vida no meu trabalho, eu sempre estou fazendo uma música que tem a ver com o que eu estou vivendo. Talvez porque eu faço parte da composição junto com o meu irmão, produzo, faço os arranjos, então tudo isso acaba imprimindo realmente a minha cara".

"Na época do Júpter eu tinha 27 para 28 anos e agora eu estou com 30, parece pouco tempo, mas desse período para cá minha cabeça mudou tanto, não só pela música, mas pela minha vida mesmo, onde eu moro, da minha família e nas minhas relações afetivas. Com o tempo eu ganhei experiência, sou um músico mais experiente. Hoje o Silva sabe onde está pisando, é mais alto confiante, mais alegre também. Eu comecei a ficar com preguiça de compor muita coisa melancólica, eu era mais melancólico. Acho que as pessoas gostam mais de compartilhar alegrias que tristezas, pelo menos pra mim, eu comecei a gostar mais", ressalta.

BRASIL EM TEMPOS DIFÍCEIS  

Em seu último disco, ele pergunta “Como é que a gente vai ser brasileiro?” nos primeiros segundos da canção Nada Será Mais Como era Antes. Chegou a hora do artista responder essa dúvida que persegue os brasileiros todos os dias. “A gente consegue ser brasileiro se conhecendo. É tão importante a gente entender nossa própria biografia. Saber que a nossa história sempre foi de luta, sangrenta e violenta. Só que ela [história] é contada de uma forma meio conto de fadas. Eu comecei a ler coisas quando sai da escola, depois de adulto, e me deparei com algo cru e assim você percebe que não foi ensinado a entender desta forma. Isso começa a te dar uma visão do país muito mais ampla, muito maior e assim a gente para com essa coisa de endeusar os Estados Unidos”.

Segundo Silva, há algumas soluções que não ajudam ao coletivo. “Caso contrário, você compra uma passagem e vai para o lugar mais próximo que tiver, fugir daqui. Não critico quem faz, acho que cada um faz o que bem entender, mas eu pelo menos quero contribuir para esse país ficar um pouquinho melhor. Eu quero poder dizer que eu tentei”.

FÃ ASSUMIDO

Outro projeto que o fez conquistar um grande público foi o disco Silva Canta Marisa, onde o moreno deu uma nova visão para canções de uma das maiores artistas deste país.

Após o sucesso, o compositor fez questão de comemorar o resultado. "Esse trabalho foi um acerto. No começo muita gente duvidou, tenho amigos no meio da música que vieram me questionar: ‘’Poxa, você vai fazer um projeto cantando Marisa Monte, que é uma cantora tão grande?”. As pessoas tem essa coisa de fazer tributo só para quem já morreu, para quem já foi, e fazer um tributo para alguém que está aí ainda tão relevante, tão grande como aMarisa Monte, pensei: Porque não, né”.

Criticando os modos da geração mais nova, o artista ressalta a importância de sua família na sua formação musical. "Parece que a memória das pessoas está ficando cada vez mais curta. Eu lembro quando eu era pequeno ouvia junto com o meu avô Lupicínio Rodrigues, Dorival Caymmi, essas coisas lá das antigas e eu vejo essa geração hoje me parabenizando por ter feito as músicas Não é Fácil e Não Vá Embora [músicas de autoria da Marisa]. É uma coisa que pode até ser pretensioso da minha parte falar isso, mas de qualquer forma eu estou apresentando para as gerações mais novas coisas que elas não conhecem".

Ainda sobre Monte, o cantor conta que isso fez seu público ficar mais eclético. "Eu sou muito agradecido. O meu público no show sempre era de pessoas mais novinhas e depois desse projeto comecei a ver cabecinhas brancas no show, pessoas de outras idades, de outros meios. Foi muito importante pra mim, me fez crescer muito como músico, foi desafiador também, me fez evoluir. Sou muito grato".

INDÚSTRIA MUSICAL

Com essa onda dos aplicativos e plataformas digitais, o consumo musical mudou. As pessoas que antes corriam para as lojas para comprar discos físicos hoje tem tudo na palma da mão com um simples clique. Sobre esse consumo desenfreado do digital, o compositor explica porque os artistas tem corrido cada vez mais para estarem presentes no mercado. "Eu converso com pessoas que trabalham em plataformas digitais, pessoal do Spotify, Apple Music, Deezer, e todos eles me dizem que os catálogos são pouquíssimos acessados. As pessoas escutam só o que é lançado agora. Por exemplo, um disco lançado por uma banda em 2016/2017 não é mais procurado pelas pessoas. A não ser que a banda tenha lançado algo neste momento".

SE RENDEU A FUNKEIRA

O capixaba gravou um feat com Anitta na canção Fica Tudo Bem. A mistureba fez sucesso e mostrou que a funkeira pode muito bem migrar para a música popular.

Comentando sobre os diversos gêneros, Silva afirma que gosta de sair de sua zona de conforto. “Eu adoro misturar [gêneros], é uma das coisas que eu mais gosto de fazer. Meus amigos brincam que sou um cara muito entediado, enjoo muito rápido das coisas. E quando eu começo a ficar entediado eu já quero achar uma coisa desafiadora para mim. Acho importante na carreira você se associar com alguém que ninguém nunca imaginou”.

“Eu gosto exatamente disso, deste lugar, porque se não a gente acaba cantando para as mesmas pessoas de sempre, canta o mesmo estilo de música e fica ali no mesmo lugar. Então acho que isso te faz evoluir, fazem as pessoas abrirem a cabeça também, pensarem fora da caixinha”, disse ele, que pretende alcançar públicos diversos.

TRIO POLÊMICO

Assim que os shows do Lolla foram divulgados os frequentadores do evento criticaram a produção por escolher os Tribalistas, trio composto por Marisa Monte, Carlinhos Brown e Arnaldo Antunes, como headliner do festival - principal atração do dia.

Defensor da música brasileira, o músico não poupou palavras para criticar o público que não aceitou os cantores. “Eu entendo essa crítica. Eu sou da geração criado com a MTV, de ligar a televisão e dar de cara com aqueles clipes gringos todos. Hoje a gente vive em um mundo que se você não quiser saber nada de música brasileira você não precisa, você pode evitar completamente porque a internet é muito seletiva, de repente você segue certo tipo de coisa e não vai ter acesso a outras se você não quiser”.

“Acabam pensando: “Porque não chamaram a Lana Del Rey ao invés da Marisa?” Eu entendo esse lugar, mas entendo também que é uma coisa de gente nova também, que tem pouca cultura, ou tem uma cultura seletiva demais. Gente com cabeça fechada tem no festival e na bancada do Bolsonaro. Tem em todo canto”, disse, não poupando sua opinião sobre o atual governo.

Achando normal esse estranhamento, ele afirma que já teve a fase de endeusar a cultura internacional. “Eu já tive essa fase adolescente de achar que eu era londrino ou nova-iorquino e hoje eu morro de vergonha disso, eu olho umas fotos e penso: ‘‘Que falta de identidade a minha". A gente vive uma crise brasileira, a gente só fala mal da gente mesmo, também está difícil da gente se gostar”.

O QUE ESPERAR EM INTERLAGOS?

Para seu show, o moreno irá agradar seus fãs de longa data. “É uma responsabilidade muito grande tocar em um festival desses que junta tantas tribos. Eu quero fazer uma coisa bem alegre porque o show é pela parte da tarde, quero que seja uma coisa realmente solar. Claro que o foco vai estar no meu disco Brasileiro, mas eu vou cantar coisas que eu acho que foram importantes para quem me acompanha, algumas coisas da Marisa [Monte], algumas coisas de Júpiter. Vou dar uma brincada com as músicas, mudar um pouco os arranjos”.

Silva toca dia 6 de abril (sábado) no palco Onix às 3:05 horas.

Além dele, a banda Scalene, Duda Beat, Dubdogz com Vitor Kley, IZA, entre outros compõe o grupo de brasileiros que irão se apresentar em São Paulo. Já as atrações internacionais ficam com a banda Arctic Monkeys, Lenny Kravitz, Kings Of Leon, Kendrick Lamar, Jorja Smith, entre outros.