Homenageado no Festival de Gramado, Marcos Palmeira brilha na novela Pantanal e analisa e própria trajetória: 'Estou tomando consciência do tempo que passou. E o saldo é positivo'
Se a vida é feita de ciclos, o ator Marcos Palmeira está apenas começando a vivenciar um dos principais deles: a maturidade. Carioca, vascaíno ferrenho, filho de um ícone da sétima arte brasileira — o cineasta Zelito Viana (84) —, e sobrinho do mestre do humor Chico Anysio (1931-2012), ele acaba de completar 59 anos e não deixa dúvida: tem motivos de sobra para festejar. “Estou tomando consciência do tempo que passou. E o saldo é positivo”, analisa ele, durante sua passagem pela 50ª edição do Festival de Cinema de Gramado, na Serra Gaúcha.
Responsável por dar vida ao lendário José Leôncio, da novela global das 9, Pantanal, o ator consolida-se como um dos principais artistas do País, título que lhe cai como uma luva não apenas por suas atuações emblemáticas e sensíveis ao longo de seus mais de 50 anos de carreira como também pela defesa da cultura, da cidadania e de um mundo melhor para todos. Não à toa, foi homenageado com o Troféu Oscarito, concedido pelo festival aos grandes talentos das artes. Emocionado diante da plateia que aplaudia em pé, Marcos reconheceu: “Este momento, esta homenagem, me leva a uma reflexão profunda sobre minha própria vida”, disparou.
E a vida, de fato, parece ser feita de ciclos. O ator, que interpretou Tadeu na primeira versão de Pantanal, em 1990, agora volta à cena com uma dose a mais de experiência e sabedoria. Sim, os cabelos encaracolados estão chamuscados de branco, assim como a barba de seu personagem. As rugas aparecem nos cantos dos olhos da pele bronzeada de sol. E o charme do quase sessentão só aumenta, afinal, uma vez galã, sempre galã! O espírito, contudo, parece seguir como o da criança que nasceu em uma produtora de cinema fundada pelo pai e pelos cineastas Leon Hirszman (1937-1987) e Glauber Rocha (1939-1981). “Eu atendia o telefone em casa, ainda moleque, e dizia ‘por favor, liga para o outro número que a produtora fica no andar de baixo”, recorda. Era mesmo impossível fugir da carreira artística! “Eu dizia para a minha mãe me proibir de fazer cinema porque queria jogar bola e brincar. Depois, cheguei a pensar em fazer Veterinária, Psicologia, ser indianista... mas tudo levava para o teatro”, conta ele.
Foi em um mergulho na tribo indígena Araras, porém, que Marcos teve a certeza de seus passos na área artística. “Eu imitava como era o homem branco da cidade, fazia praticamente um stand-up para eles, e eles eram divertidos, amavam aquilo”, emociona-se ele, cuja rotina segue agitada. “Há quase um ano, gravo de segunda a sábado. Nunca decorei tanto texto! Pelo menos, mantenho o Alzheimer longe”, brinca o ator.
Reencontrar a trama de Benedito Ruy Barbosa (91) também é descobrir um Pantanal diferente. “O Pantanal está seco. Aquele monte de água que se via quando gravamos, em 1990, não se vê mais. Precisamos estar atentos para o aquecimento global”, frisa. Sobre o seu Zé Leôncio, Marcos acredita dar novas cores ao papel que foi do amigo Claudio Marzo (1940-2015). “Creio que o sucesso de Pantanal se dê pela humanidade que seus personagens demonstram, com seus lados positivos e negativos, dúvidas e afirmações, justamente como somos”, avalia ele, envolvido na história até outubro, quando terminam as gravações da trama. Na sequência, comandará a série documental A Era dos Humanos, para o Globoplay.
Para além das artes, ele também admite ter atingido a maturidade como empresário, coordenando a Fazenda das Palmeiras, que adquiriu em 1997. “Aproveitei a pandemia e fiquei uns dez meses na fazenda. Entendi melhor meu próprio negócio, aprimorei a gestão e, hoje, tudo funciona bem”, diz ele, sobre a produção de orgânicos.
Na gaveta, o projeto de uma série com a sua mulher, a cineasta Gabriela Gastal (47), baseada no livro Dezamores, de Pedro Ayres. Marcos viverá o personagem principal e assumirá a direção pela primeira vez. Será, também, o primeiro trabalho em comum do casal, junto desde 2014. “Esse projeto reflete o amadurecimento da nossa relação”, sinaliza. “Meus pais têm 60 anos de casados e minha mãe sempre me diz que relacionamento precisa de investimento diário, de quebra de rotina. Aprendi muito com a Gabriela essa coisa de entender o espaço do outro, de ouvir, de ter a escuta para o outro. É uma construção diária”, aponta ele, ávido para seguir trilhando sua história. “É preciso resistir e ser persistente. Sinto que consegui fazer o que queria, que é contar histórias que entretenham, emocionam e façam as pessoas pensar. E ainda quero contar muitas outras”, resume.
Fotos: Liane Neves