Ao desfilar em SP e no Rio, Thelma Assis festeja a resiliência das mulheres negras
Já são 18 anos entrando na avenida do samba, em São Paulo, mas o frio na barriga continua o mesmo! Thelma Assis (38), a Thelminha, tem uma longa história com o carnaval e, em 2023, terá missão dupla na folia. A médica e apresentadora desfilará pela Mocidade Alegre, na capital paulista, e brilhará na Mangueira, no Rio.
“A minha maior terapia é o carnaval. Não tem como passar por essa avenida sem ser feliz!”, comemora ela, em bate-papo exclusivo com CARAS, no Sambódromo do Anhembi, palco da folia paulistana. Dividindo-se entre a Medicina e o quadro Bem Estar, no global É de Casa, a vencedora do BBB20, nesse momento, só quer saber de uma coisa: sambar!
– Qual a importância de desfilar no carnaval?
– É muita responsabilidade desfilar em uma escola de samba. Você tem que se dedicar. Ao longo do ano, tento sempre estar presente. Coloquei na agenda as datas dos ensaios para não deixar nada a desejar. Fui me apaixonando pelo carnaval, não só pela festa, mas por tudo que envolve a folia. Desde a divulgação o enredo, acompanho a sinopse, a escolha do samba, cada passo para chegar até o desfile. Muita gente gosta só de curtir a festa, mas sigo cada detalhe. Eu recomendo para todo mundo, pelo menos uma vez na vida, prestigiar essa festa assistindo ou desfilando. Você não tem noção da energia que é!
– E o que passa na cabeça e no coração ao pisar na avenida?
– Fico muito nervosa antes de cada desfile, o coração bate mais forte. Sentimos uma emoção diferente a cada ano. Às vezes, o enredo tem muito a ver com você, como neste ano com a Mangueira, falando de África, Bahia e mulheres pretas. Às vezes, você passou por um ano muito difícil e é no carnaval que você aproveita para se jogar, se recuperar, renovar todas as energias. Às vezes, é uma comemoração. Eu desfilei para comemorar que eu tinha ganhado uma bolsa de 100% na faculdade de Medicina. As emoções são diferentes, mas no final a sensação é a mesma, é muito gostoso. Depois de uma pandemia em que nos questionamos até se as coisas iriam voltar a ser como antes, ter um carnaval fora de época, em 2022, foi importante. Mas neste ano voltamos com tudo. Tenho certeza de que todo mundo que é sambista está muito feliz.
– Que balanço faz de tudo que conquistou desde o BBB?
– O BBB me abriu muitas portas. Foi um portal de boas oportunidades e possibilidades que nunca imaginaria ter, lugares a que não imaginaria chegar. É muito gratificante olhar para trás e ver tudo que passou. Eu me inscrevi de forma bem raiz, mandei vídeo, fiquei lá os 98 dias e depois saí para me deparar com tanta coisa bacana. Estar aqui nesta matéria, desfilar na Fashion Week, escrever um livro... Não conseguiria fazer nada disso se não fosse o BBB.
– Qual a responsabilidade de ter se tornado símbolo para outras mulheres negras no Brasil?
– É uma grande responsabilidade ser exemplo. Quando eu saí, não tinha essa noção. Eu me via lá dentro e me via sozinha, a solidão da mulher negra que tanto se fala. Ocupar um espaço de uma forma solitária, se olhar e não se enxergar. Me tornar esse exemplo para outras mulheres pretas é muito importante. Quando elas falam comigo na rua, me olham nos olhos e dizem como fui importante para a trajetória delas é recíproco. Olho para elas e sinto isso também. A gente é criticada, lida com o ódio da internet, mas o feedback dessas mulheres me move.
– E como enfrenta o ódio que, às vezes, recebe nas redes?
– Eu me inspiro muito em quem já viveu isso há muito tempo, figuras públicas que deixaram um legado para nós. Recentemente, perdemos a Elza Soares e imagina tudo o que ela já passou! Às vezes,
quando fico chateada, penso que o que estou passando, perto do que elas viveram lá atrás, não é nada. Elas correram para que pudéssemos andar. A gente vai continuar apanhando e batendo de frente. Se tiver que ser combativa, vou me fortalecendo junto com outras mulheres que também passam por isso.
– O ano de 2023 ainda está só no início. Quais as expectativas?
– Foi um ano que virou de forma esperançosa. Eu costumo dizer que as pessoas não podem viver dentro de uma bolha. Não adianta só eu estar me sentindo bem, com saúde, com o dinheirinho no banco que ganhei do BBB, se vivemos em uma sociedade desigual, com gente sofrendo, pessoas passando fome e desempregadas. Isso gera algo negativo que afeta a todos nós e, enquanto não se conscientizarem disso, não vamos viver plenamente. Eu espero que a gente viva em uma sociedade mais justa, que respeite as mulheres, que seja menos racista. Eu acredito muito nas futuras gerações. Quando a gente conversa com as crianças e vê uma dose de esperança no olhar delas... é uma lição.
– O que espera do futuro?
– Uma das grandes oportunidades foi conciliar a Medicina com a comunicação. Eu faço meus quadros, meus VTs no Bem Estar e quero continuar nesse caminho. Eu também quero seguir fazendo o Sambadela, meu evento voltado aos sambistas. A ideia é que seja aberto para o público nas próximas edições.
FOTOS: MARTIN GURFEIN; BELEZA: GIL DARF