Em entrevista exclusiva, Nívea Maria fala sobre a volta na novela 'Encontro Marcado' e critica o 'endeusamento' de novas estrelas da televisão
Ao falar sobre a personagem que interpreta no espetáculo A Última Sessão, que reestreia nesta sexta-feira, 28, no Teatro Raul Cortez, em São Paulo, Nívea Maria resume um pouco sua vida: “Faço uma mulher praticamente igual a mim: uma atriz de sucesso – e digo sucesso por vocação, não por talento – que tem seus problemas afetivos, mas que continua sempre com muita energia e tem uma personalidade muito grande”. Com 68 anos de vida, sendo 50 de carreira, ela conta para a CARAS Digital que está aberta para encontrar um novo amor, fala sobre sua personagem na próxima novela das seis, Encontro Marcado, e critica o ‘endeusamento’ de novas estrelas da televisão: “O dinheiro vem muito fácil e eles se perdem”.
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- Quando a senhora escolheu a carreira de atriz imaginava que iria conquistar tudo que conquistou?
Quando escolhi a carreira eu tinha certeza que ela ia ser longeva porque eu tinha achado o prazer em um trabalho, a felicidade no que estava fazendo. Tive grandes professores, grandes colegas de trabalho, grandes experiências na televisão e no teatro. Trabalhei com Bibi Ferreira e com grandes nomes do nosso cenário artístico. Tudo isso foi um aprendizado e continua sendo. Tinha certeza que ia dar certo na profissão que escolhi porque tinha vocação. Não estou falando de talento, isso é uma coisa que eu discuto um pouco.
- Talento não é suficiente para seguir a carreira?
Nessa profissão você precisa não ter só talento, mas ter a responsabilidade de um ator. A partir do momento em que você interpreta o texto de alguém, você tem a responsabilidade com essa pessoa que criou e com o público que vai te ouvir. Então é preciso levar discussões para essa sociedade tão complexa e tentar conquistar todo tipo de público, desde o que mora em um casebre no meio do mato até quem mora em um palácio. Se você tocar o coração de uma dessas pessoas, você acertou no que você escolheu e na missão que você tem.
- A senhora acredita que os jovens atores perderam essa visão sobre a ‘missão do ator’?
Alguns sim, mas não todos. Existem pessoas mais jovens que querem seguir a carreira e têm interesse, têm curiosidade, que aprendem a dificuldade e as regras da profissão, que é ter disciplina, respeitar o outro, cumprir horários... Alguns perderam sim, mas mais que culpar os jovens atores, eu culpo a mídia e a sociedade que endeusam esses atores muito rápido, valorizam antes de eles estarem maduros e preparados para isso. Às vezes ele diversifica a atuação dele: vira modelo, manequim, ator... mas não canaliza naquilo que quer fazer. São tantos caminhos que você se perde. Mas tem aqueles que seguem com força e paciência. Não é fácil. É um país que culturalmente não valoriza o teatro. Há um público que precisa ler, que precisa se interessar por todo tipo de arte, e nós, os atores brasileiros, temos que brigar para sobreviver.
- No ano passado, surgiu uma discussão no meio artístico quando o Caio Castro disse que não ia ao teatro. A senhora se manifestou dizendo que era ele era ‘muito jovem e imaturo’. Qual sua opinião sobre o artista que não consome arte?
Isso é uma coisa pessoal. Você tem que gostar de arte. Não precisa ir ao teatro, mas vá ao cinema, leia um livro, converse com pessoas que são do meio. É preciso estar em contato com pessoas que tenham uma história. Não quer dizer que os mais velhos sejam professores, mas já é uma informação, uma bagagem para você. O que também acho que impede as pessoas é que o dinheiro vem muito fácil para o profissional jovem que está aí. O que a gente conseguiu em 50 anos, ele consegue em três meses e isso dá uma deslumbrada, um visão errada do que é nossa profissão.
- Algumas atrizes entram em crise por conta da idade, achando que não vão conseguir bons papéis na televisão. Isso aconteceu com você?
Houve uma preocupação, mas não me assustou. É o que estou dizendo: a carreira é muito difícil. O mercado é muito apertado, não tem espaço para todo mundo. Sempre foi difícil, sempre foi lutado. Mas os períodos em que fiquei fora foram realmente muito poucos, me sinto privilegiada.
- E como lidou com a chegada da maturidade?
A gente não envelhece, a gente desgasta. O corpo se desgasta como um caco velho, você não tem a mesma energia física, mas a sua cabeça é a igual a de um jovem. Se você quiser, você entra na internet, você pesquisa, estuda... as informações estão aí! A cabeça é sempre jovem e rica, cheia de coisas. Se não está trabalhando, troque experiências com alguém. Você pode dizer que sou otimista, sou sim! Eu tenho saúde, tenho uma família muito querida, tenho sorte na minha profissão, e tenho netos maravilhosos que resgatam a minha energia. Os netos, se você estiver sozinha na maturidade, sem marido e longe dos filhos, eles fazem você retornar com toda energia, aquela brincadeira e aquele olhar de criança, sem medo de ser ridícula. Sou tudo isso e sou uma pessoa normal.
- A senhora disse ter se tornado mais forte depois que superou a depressão causada pelo fim do casamento de 27 anos com diretor Herval Rossano [em 2002]. Atualmente, a senhora procura um novo amor?
Não me preocupo, mas estou aberta. É difícil. Eu busco sempre o bom humor. Não é uma questão de inteligência, mas uma pessoa que seja esclarecida, que não seja preconceituosa, que goste de rir. Está difícil de encontrar. O brasileiro está vivendo em um país com muita dificuldade de sobreviver: de comer, de trabalhar, de se locomover. Isso tudo vai estressando as pessoas. Mesmo quem tem condições financeiras e vive bem tem seus problemas. É muito difícil encontrar uma pessoa que pense como eu, que tenha a visão real de que não é tudo maravilhoso e cor de rosa... Mas de que adianta dar um tiro no peito? Dar murro em ponta de faca?Acho que a gente deveria ser mais espontâneo.
- Pode falar sobre seu retorno à televisão em Encontro Marcado [próxima novela das 18h, de Elizabeth Jhin]?
Volto muito feliz com um personagem muito denso, muito forte ao lado da Irene Ravache. Nós vamos trocar figurinhas, energia, experiências. Vou ser a Zilda, uma governanta de época na primeira fase da novela, que tem um filho. Ela é amarga, frustrada e um pouco revoltada, um pouco dura, mas que volta na segunda fase completamente diferente. Minha alegria é voltar para a televisão em uma novela de época, que é uma coisa que eu gosto muito de fazer para criar personagem e emocionar o público. Personagens de época são muito densos. Estou muito feliz.
Serviço – A Última Sessão
Em São Paulo: a partir do dia 28/03, no Teatro Raulo Cortez, sextas, sábados e domingos.