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Teatro / ENTREVISTA

Beto Marden encara desafio de levar reflexões de Renato Russo para os palcos: 'Temas muito atuais'

Em entrevista à CARAS Brasil, Beto Marden, que vive Renato Russo em ‘Será - Um Grito Musical’, fala de preparo para personagem e estreia de temporada

Beto Marden caracterizado em Será - Um Grito Musical - Divulgação
Beto Marden caracterizado em Será - Um Grito Musical - Divulgação

Após protagonizar uma apresentação única no dia 3 de dezembro,Beto Marden (43) se prepara para o retorno aos palcos como Renato Russo (1960-1996) no espetáculo Será - Um Grito Musical, que terá uma temporada inédita em 2025 e contará mais sobre o emocional do artista ao mergulhar em reflexões pessoas registradas em seu livro-diário. Em entrevista à CARAS Brasil, o ator fala sobre encarar o desafio de levar os pensamentos de Renato Russo para os palcos: "Temas muito atuais", revela.

O impacto das reflexões de Renato Russo

O intérprete revela que o que mais o impactou ao ler as reflexões de Renato Russo no livro Só por Hoje e Para Sempre foi a “força e a potência daqueles textos”. Para o ator, a combinação de “drama e poesia” nos registros do cantor, que documentavam seu tratamento e suas angústias, oferece uma conexão profunda e atual.

"O que me impactou foi ver todo esse material com essa força toda de alguém que já não está mais aqui, mas com muita atualidade", afirma Marden. Segundo ele, as questões abordadas no livro, como angústias e medos, ressoam de maneira intensa no contexto atual. A ideia de transformar esses textos em algo artístico surgiu ao perceber que esses pensamentos estavam mais vivos do que nunca.

Para Marden, o desafio foi transformar esse material emocionalmente carregado em uma adaptação teatral que não buscasse imitar a figura de Renato Russo, mas sim criar uma representação das diversas facetas de sua vida. O espetáculo não conta a história de Russo, mas oferece uma versão fictícia de seus pensamentos, por meio de cinco arquétipos inspirados em sua vida e obra. "Não contamos a história do Renato, mas usamos os arquétipos criados pelos textos, entrevistas e falas dele", explica o ator.

Criação do roteiro teatral

O processo de adaptação das ideias de Russo para o palco também foi desafiador, mas fundamental para o espetáculo ganhar forma. Marden compartilha que, no início do processo, a pesquisa sobre o autor foi o primeiro passo: "Fui atrás dos livros, ouvi mais as músicas, vi filmes e entrevistas. Tudo isso me ajudou a entender melhor a psique do Renato, o seu raciocínio, sua consciência".

O ator trabalhou diretamente com o autor Rafael Gama, que, após receber o material, desenvolveu o roteiro, incorporando as ideias de Russo em cinco arquétipos distintos, cada um representando uma fase ou aspecto de sua personalidade. A escolha foi uma maneira de capturar a complexidade do artista sem reduzi-lo a uma única figura.

Cada arquétipo reflete uma parte de Russo: o menino, o jovem rebelde, o adulto, o feminino e o comunicador, que serve como anfitrião do espetáculo. "Essa ideia trouxe um dinamismo incrível para o roteiro", afirma Marden, destacando como as diferentes energias e comportamentos de cada arquétipo se manifestam durante a peça. Segundo ele, cada momento de transição entre os arquétipos é carregado de energia e uma nova forma de expressar as mensagens de Russo, seja em momentos mais introspectivos ou explosivos.

Preparação intensa e transformação pessoal

Marden revela que o processo de dar vida a um texto tão íntimo e pessoal trouxe mudanças significativas não só no âmbito profissional, mas também para si mesmo como pessoa. "Nunca tinha feito algo que acessasse tanto o meu espiritual, tanto a minha alma", diz. Para o ator, imergir na mente e no legado de Russo foi um caminho sem volta:

"Eu me senti um pouco ignorante no começo, mas à medida que fui acessando essas informações, me senti mais forte, mais conectado com o meu próprio processo criativo". Marden destaca que o trabalho, com mais de um ano de preparação, intensificou sua percepção sobre a arte e sua missão como ator.

Um dos maiores desafios na construção do personagem foi a representação do arquétipo feminino: a dificuldade estava em capturar a essência feminina sem cair em estereótipos, algo que, para o ator, foi um exercício de empatia e respeito às diferentes formas de expressão. Marden revela que procurou representar esse arquétipo de forma fluida, autêntica e com uma “alma feminina”. "A ideia não era fazer algo forçado, mas sim incorporar uma mentalidade e uma forma de pensar delicada, com uma inteligência diferente", diz.

A atualidade dos temas

Renato Russo sempre abordou questões como saúde mental, sexualidade e preconceito com uma coragem rara. O intérprete reconhece a ousadia do artista em levantar essas questões no passado e destaca que, apesar de alguns avanços, muitos desses temas ainda permanecem atuais. “O público vai se surpreender com a atualidade dessas questões, apesar de 30 anos terem se passado”, diz.

Para ele, a essência dos pensamentos de Russo, especialmente sobre direitos humanos e igualdade, ainda são fundamentais: "Renato falava que todos somos iguais, que todos devem ter os mesmos direitos. E isso ainda é uma bandeira que precisamos levantar."

O ponto de virada no espetáculo acontece em um momento de grande intensidade, quando o personagem se desnuda emocionalmente. “Durante todo o espetáculo, só não fico pelado, mas estou completamente nu”, brinca Marden, destacando o impacto emocional desse desfecho. Quanto à música, ele explica que o repertório, embora recheado de clássicos da Legião Urbana, precisou ser selecionado de forma cuidadosa.

"Tínhamos 30 músicas para escolher, mas optamos pelas que realmente se encaixavam no enredo", explica. Marden destaca a importância de não sobrecarregar o espetáculo com muitas músicas, para garantir que o foco fosse mantido nas emoções e nas mensagens do texto.

Poder da arte

Com o espetáculo, Marden espera transformar a percepção do público sobre a capacidade transformadora da arte: "Espero que leve a sensação de que a arte cura e de que a arte é um caminho de informação e de libertação. Já que a segregação é fruto da ignorância, do medo do desconhecido, é preciso informar e deixar claro quem somos. E assim, quando nos escancaramos, nos expomos, fica mais fácil atingir o outro, já que, ao mostrarmos nossas feridas, as pessoas têm a possibilidade de se enxergar nelas também", compartilha.

O artista acredita que a identificação é o caminho e que Será - Um Grito Musical é uma ferramenta para a construção de uma sociedade melhor: "Essa é a sensação que eu quero levar para as pessoas: a de que a informação pode nos tirar do abismo", conclui.

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