Em entrevista exclusiva à Revista CARAS, Susana Vieira relembra conquistas e confessa arrependimento
Uma das grandes damas da TV brasileira, Susana Vieira (81) viu sua história na arte se confundir com as transformações da sociedade. Por meio dos seus personagens, mostrou avanços como, por exemplo, a primeira mulher divorciada da teledramaturgia, em A Escalada, de 1975. Foi pensando em fatos como este que o escritor Mauro Alencar (62) a chamou para escrever a biografia Susana Vieira – Senhora do Meu Destino.
Ainda celebrando a vitoriosa trajetória, recentemente, ela gravou a série Tributo, especial do Globoplay sem data de estreia definida. Olhar para o passado a fez refletir e ter dimensão de seu tamanho. “Vivo intensamente o dia de hoje e estou sempre pensando no dia de amanhã. Nunca olho para trás. Se tiver que lembrar das coisas, lembro, mas nada do meu passado me pesa”, diz a atriz, em papo exclusivo com CARAS em sua casa, no Rio.
– Como surgiu o livro?
– O Mauro falou que sou uma atriz que conta a história da TV brasileira e queria escrever o livro. Combinei de ele me perguntar as coisas, a gente sentava por quatro, cinco horas e eu fui ficando entusiasmada, tinha coisa que não lembrava e, para mim, foi maravilhoso, porque não tenho nenhum trauma do passado. Eu nunca me afastei do trabalho, nunca abri uma loja para vender nada, eu nunca larguei uma peça para ir atrás de marido, meu objetivo era sempre a carreira artística.
– Abriu mão de que para isso?
– Sinto que deixei a minha vida particular e pessoal muito de lado, porque me preocupei só com isso, meu objetivo era ser atriz e usufruir de todas as benesses que ser atriz te oferece. Não é ser famosa, ser famosa qualquer um fica do dia para a noite. A mídia só sabe falar de quem não faz nada, você vira famoso e pronto, às vezes, está contracenando até com a gente. Nunca me dei o valor de coisas como ‘fiz a melhor novela’, mas comecei a ver que estava deixando de fazer novelas, começou a reduzir o ritmo de trabalho para mim.
– Rever tudo isso te fez aflorar algum arrependimento?
– Eu não fiquei dramática no livro, não consegui ficar triste, a não ser a coisa mais triste que me aconteceu, que foi a morte da minha mãe. Esse sentimento é irreversível. Sou muito triste por a minha mãe n ã o t e r m e acompanhado, porque eu queria que ela tivesse visto isso tudo, foi ela que me deu o estímulo. Eu me arrependo de muita coisa, não sou daquelas pessoas que não se arrependem de nada e fariam tudo de novo. Não, tem várias coisas que eu não faria. Mas a gente só tem essa sabedoria com a idade, com o tempo, então não adianta, né? Sei que depois que minha mãe morreu, eu mudei de personalidade. Fiquei muito mais agitada, mais sem paciência, ansiosa. Fiquei anos tentando reverter isso e não tinha ninguém, porque minha família mora longe e eu ficava aqui, dentro dessa casa, com alguns maridos que tive, mas ninguém supria a falta e o colo dela. Então, a minha biografia serviu para, mais uma vez, eu saber que sou sozinha, mas sou feliz sozinha. Ainda assim, eu sinto falta da minha família.
– Seu filho e seus netos moram nos EUA. Como lida com essa distância?
– A saudade que tenho eu já superei, senão vou ficar sofrendo a vida inteira. Sinto falta de não ter Dia das Mães, quase nunca tive. Eu nunca fui avó, sou avó de vez em quando e eu gostaria de ter tido a ideia de como é morar perto, buscar no colégio. O crescimento dos meus netos eu perdi e isso é a minha maior tristeza depois de perder a minha mãe. Porque meu filho, Rodrigo, saiu de casa com uns 30 anos, então convivi com ele, íamos até para a boate juntos.
– Tem diferença da figura artística Susana para a física Sônia ou já se tornou uma coisa só?
– Não consigo me sentir essa Susana Vieira que tanto falam, porque eu ainda tenho muita insegurança. Eu tenho uma segurança da minha força espiritual e física e uma frase que falo sempre é: ‘Tudo vai dar certo!’. Eu tenho a impressão de que a Sônia é a que sofre, é a que se desespera, que sente falta da família, que se espanta quando vê que tem uma conta muito alta para pagar. Sônia depende do dinheiro da Susana. Quem acalma Sônia são os cachorros, porque eles me distraem tanto e me dão tanto trabalho... A minha obsessão são duas coisas, o trabalho e os cachorros. A parte do trabalho a Dany Tavares, assessora, conduz e me acalma, está resolvido. Agora a parte dos cachorros é a parte afetiva... eles estão ficando velhos, estão ficando doentes e eu também estou ficando. Por mais que eu tenha força de vontade, graça e leveza, a preocupação de eles não me terem amanhã é muito grande! Minha maior preocupação é com quem vai ficar meus cachorros ou como é que eu vou reagir a quatro cachorrinhos que podem morrer de repente (se emociona).
– Apesar das preocupações, você tem vocação para ser feliz.
– Tenho. Antes de dormir eu penso em todos os problemas que aconteceram ou que podem acontecer no dia seguinte. Penso nisso, tiro a maquiagem e coloco o meu perfume para dormir, mesmo sozinha. Aí, ligo a TV para assistir a séries! Descobri que elas me tiram da realidade. Então, eu vou dormir e sorrio, porque eu vejo os cachorros dormindo no quarto, parece que tudo melhora, que os problemas dispersam e agradeço a Deus pelo dia, pelo alimento, pelo teto, pela saúde, por tudo. É claro que acordo louca e aí volto à realidade! É a agenda que mudou, a viagem para o dia tal e, nesse ponto, misturo a Sônia com a Susana. Mas a Sônia, lá no meu quarto, precisa de sossego, precisa da minha solidão para ter essa reconexão com Deus e comigo mesma.
– Foi essa força que fez sua doença entrar em remissão, não é?
– Eu tenho leucemia linfocítica crônica e anemia hemolítica autoimune, achei de cara que ia morrer e pensei ‘vou fazer tudo, viajar, aproveitar!’. Eu ia para a Paraíba com a família toda, mas não pude porque passei muito mal e me recuperei. Acho, primeiro, que eu tenho confiança nos médicos e tenho uma confiança de que Deus sabe que eu tenho vontade de viver e tenho muitas pessoas que dependem de mim. E não digo que precisam de mim economicamente, precisam da minha presença, porque quando a minha mãe morreu eu tinha uma irmã e um irmão pequenos e esses meninos precisam de mim.
- Você comprou um apartamento em Miami. Pensa em ficar uma temporada nos Estados Unidos?
– Eu pensei que ia me mudar no ano passado, quando a TV Globo começou a reformular e as pessoas começaram a ser dispensadas. Eu achei que ia ser também, nunca achei que eu era melhor que os outros, era muita gente boa saindo. Então eu pensei: ‘Não vou ficar aqui, na rua, depois me desfaço das coisas’. Corri lá nos Estados Unidos para comprar um apartamento ao lado do meu filho.
– E aí a emissora renovou o seu contrato...
– Quase me arrependi de ter comprado, porque achei que a TV Globo ia me chamar em seguida. A TV Globo não me chamou para uma novela, mas já fiz toda a programação da emissora. Sou uma pessoa que dá crédito para a empresa e estou disponível para ela. E ela me dá um status também, estou na TV Globo, me dá uma tranquilidade. Eu agradeço, assim como dei minha vida para eles, eles me ofereceram isso. Então, eu estou feliz e querendo fazer novela!
– Valeu a pena abrir mão de parte da sua vida pessoal para se dedicar ao lado profissional?
– Valeu, mas eu podia ter diminuído o ritmo. Meu medo sempre foi não ter dinheiro para sustentar meu filho, para dar a ele o melhor, então até ele completar 20 anos eu trabalhava dia e noite no teatro, no cinema, na televisão... eu fazia tudo! Quando ele se casou, eu já estava tão habituada a ter aquilo tudo, que nunca parei de trabalhar, acho que entrei no vício. Eu tenho um filme que chama Susana Sempre Sim, que a Leona Cavalli até quer fazer comigo, porque eu digo sim para quase tudo, dou meu telefone para qualquer pessoa, eu digo sim para a vida!
– Em nossa última capa, você disse que estava pronta para amar. E aí, encontrou alguém?
– Por acaso eu terminei um amor à distância ontem (risos).
– E está bem?
– Claro (risos)! Quando acaba é porque está bom demais sem!
Fotos: Vinícius Mochizuki