Em entrevista à Revista CARAS, Juan Paiva relembra origem pobre e comemora conquistas recentes com sucesso em projetos da TV Globo, como Renascer
Não há dúvidas de que Juan Paiva (26) é um expoente da nova geração de atores da teledramaturgia brasileira. Só este ano, ele protagonizou a global Renascer, a série Justiça 2, do Globoplay, além do filme De Pai para Filho. Elogiado pelo público e pela crítica, o rapaz do Vidigal, comunidade carioca, tem colhido os frutos de sua dedicação e talento.
Em conversa exclusiva com CARAS no DarkCoffee, no Rio, o artista refletiu sobre paternidade — ele precisou amadurecer rápido por conta da chegada da filha, Analice (10) —, racismo, representatividade e avisa: ainda não chegou aonde quer. “Tenho conquistado lugares interessantes, mas a gente nunca está satisfeito, a gente sempre quer mais”.
– Este ano de 2024 é seu?
– É um ano especial para mim, para minha carreira, para minha família e pelo que acredito e venho construindo na trajetória. É também um momento interessante para abrir espaço para os outros. Todo ano é ano de fazer acontecer, de se jogar, de aproveitar. É um momento de caminhar para frente e ir desenhando o futuro. O meu futuro é agora, então faço agora para colher depois.
– A arte te salvou?
– Com certeza. A arte salva vidas, não há uma pessoa no mundo que não consiga viver de arte. A pessoa ouve música, assiste a filme ou qualquer outro tipo de conteúdo... a arte salva a vida de todo mundo mesmo. E, em mim, ela fez uma transformação no período que eu era cheio de dúvidas. Sempre tive certeza de que queria viver da arte, só não sabia como. E quando passo por uma transformação de vida, que foi o nascimento da minha filha, foi um pouco desesperador, porque eu queria viver de arte, não sabia como e precisava ter um retorno financeiro para viver. Eu ficava na dúvida se era isso mesmo, mas minha filha veio trazendo essa bênção que foi a minha primeira novela, Totalmente Demais, e as coisas foram acontecendo a partir dali. O que era desesperador se tornou alívio.
– Antes disso você chegou a pensar em trabalhar na praia, mas a sua mãe não deixou, não foi?
– Sim! No desespero, querendo resolver as coisas pra já, eu disse para ela que queria trabalhar na praia para ajudar em casa e arcar com as despesas da minha filha, que estava para nascer. Mas minha mãe me deu a oportunidade e o privilégio de continuar estudando, de lutar pelos meus sonhos.
– Você foi pai muito cedo. Isso te fez amadurecer rápido?
– Me amadureceu, me reeducou e me fez um homem melhor. E todas essas virtudes eu precisava naquele momento e preciso também como ser humano, ainda mais sendo pai de menina. Mas também tem um outro lugar, que é o da liberdade do jovem, aquela coisa que talvez seja até gostosa, da inconsequência, de você não pensar muitas vezes nas atitudes e só querer viver. Já tive que pensar muito antes da hora.
– Sente falta dessa liberdade?
– Eu tive a minha liberdade, mas ela estava em outro lugar, ela vinha carregada de uma responsabilidade, então naturalmente a sua cabeça muda. Não sinto falta disso, mas acho que deixar uma fase passar, por exemplo, a de adolescente, jovem, isso passou. Ela pode se repetir daqui a um tempo, mas naquele momento senti um pouco falta de ter essa liberdade de fazer o que eu quisesse sem pensar muito. Eu tive que ter uma responsabilidade de não me permitir errar em alguns lugares e isso me ajudou. Agradeço muito, mas acho que a gente tem que viver
uma coisa de cada vez, cada momento certo da melhor maneira.
– Você já teve Natal sem ceia em casa. Hoje tem conforto. Conseguiu mudar sua vida?
– Não só a minha, como a da minha família. A gente consegue confraternizar juntos e fazer uma janta bacana, uma comemoração em dias especiais É a vida de um cidadão comum, sem aquela escassez, sem a preocupação do pão de amanhã. A gente está na busca ainda, todo mundo trabalha para conquistar as coisas, mas hoje não estou naquele lugar do desespero, hoje está tudo mais tranquilo.
– Sua filha, Analice, já vive outra realidade...
– Eu acho que ela nem imagina como era. Da mesma forma também que a vida da minha mãe ainda era de maior vulnerabilidade do que a minha e dos meus irmãos. Minha filha chegou num momento interessante, com muita coisa pra evoluir e para mudar, mas já é um lugar tranquilo, ela não precisará passar por alguns perrengues que eu passei.
– Te perguntam muito se você pensa em deixar o Vidigal?
– As pessoas me perguntam e, na verdade, eu nem sei o porquê. Como em qualquer comunidade, ela já teve seus momentos de fragilidade e acho que essa pergunta fazia mais sentido para a primeira geração do Nós do Morro, no sentido de ‘você não vai se precaver?’ E isso virou uma pergunta automática. Mas hoje o Vidigal é um ponto turístico, é movimentado por pessoas de fora, por turistas, gringos, o comércio gira, tudo acontece por lá. É um lugar tranquilo para se morar, é bem família. Eu sairia só se fosse por uma questão de acesso, para facilitar, porque como moro muito em cima, às vezes, para chegar algumas coisas existe uma dificuldade; ou quando estou atrasado, em vez de ter que descer o morro inteiro, já estou ali por baixo. Se eu sair é mais por essa necessidade, por essa questão de logística, mas vou estar sempre por ali, porque meus colegas e minha família estão ali. Também acho que é uma vivência interessante para minha filha, para saber como funciona o morro, o asfalto, para ela se construir como pessoa.
– A fama te blinda do racismo ou você ainda sofre com isso?
– Acho que não tem essa de fama ou conhecimento, tem um lugar de me respeitarem pela pessoa que eu sou e quando conhecem o meu outro lado, o profissional, também me traz outro respeito. Confesso que antes eu sofria mais, mas não significa que hoje eu tenha deixado de sofrer. O racista é racista em qualquer lugar, independente de qualquer coisa.
– Esses dias, você comemorou que estava em uma revista de moda e falou para sua mãe que não era uma notícia de um negro como vilão. Agora você está na capa da CARAS. Isso é importante nessa trajetória...
– Com certeza! É uma conquista ter um negro estampado em uma revista. Quantos de nós não tiveram seu rosto exposto na foto de uma delegacia, por exemplo, de forma injusta. Então, para mim, é uma vitória. A gente vem batalhando para inspirar outras pessoas e para deixar nossas mães orgulhosas, porque elas têm um passado difícil, duro, com poucas oportunidades. Pessoas do lugar que venho se desdobram para conquistar seu lugar ao sol, então acho que serve de motivação mesmo. Temos que nos orgulhar e celebrar essas vitórias.
– O roteirista e diretor Paulo Halm disse que você é um dos maiores atores da atualidade e te definiu como um galã da cor do Brasil. Como você recebe e encara esse título?
– Me sinto lisonjeado. O Brasil é negro, o Brasil é indígena, o Brasil é essa mistura, essa miscigenação. Essa fala dele também mexe no lugar da autoestima que o negro não pode perder nunca, uma vaidade boa e que é até a sua segurança, porque durante muito tempo as pessoas negavam a beleza do negro e isso é muito louco. Hoje, tem vários rostos pretos na TV, estampando campanhas, no esporte, em qualquer lugar estamos aparecendo de forma positiva. Isso tudo só comprova que no Brasil a maioria é negra e que a gente precisa se valorizar e entender que somos lindos, cada um do seu jeito e de formas diferentes.
– Diante de tudo isso, já chegou aonde você queria?
– Não, eu acho que falta muito, tenho só 26 anos. Tenho conquistado lugares interessantes, mas acho que a gente nunca está satisfeito, a gente sempre quer mais. Eu não sei quando vou chegar ao lugar que quero, mas eu sei que, enquanto estiver insatisfeito, vou continuar fazendo, fazendo e fazendo. Eu não pretendo parar. O que vier de trabalho eu estou abraçando, vou agradecer e me dedicar como eu sempre fiz.