Astro dos musicais, o ator Tiago Barbosa volta ao Brasil e dispara: 'o racismo está aí'
O bom filho a casa torna! A máxima se aplica com perfeição ao ator Tiago Barbosa (37), que, após consagrar-se internacionalmente — nos últimos sete anos ele brilhou nos palcos espanhóis ao estrelar os musicais O Rei Leão e Kinky Boots —, regressou ao Brasil para se reconectar com suas raízes e com o público. E missão dada é missão cumprida! Ele protagonizou o espetáculo Clube da Esquina – Os Sonhos Não Envelhecem, no qual deu vida a Milton Nascimento (80), e conseguiu a façanha de levar Fernanda Montenegro (93) às lágrimas. “Ela veio falar comigo logo após o primeiro ato. Foi uma espécie de autenticação do meu trabalho. Na hora, fiquei paralisado. Ao fim da sessão, ela voltou a falar comigo, perguntou quem eram meus pais, onde estudei, se eu era feliz... isso me desmontou. Vai além de ser uma diva, é uma pessoa de alma nobre”, falou ele, um dos maiores nomes do teatro musical do País.
A ligação com o público brasileiro foi tão intensa que segue ecoando. Ao se despedir do musical, o ator pretendia regressar à Espanha, mergulhar nos estudos e tirar merecidas férias. No entanto, tudo
mudou após receber o convite para ser um dos protagonistas do espetáculo Wicked, com estreia para
março, em SP. “Fazer Wicked é o sonho de qualquer ator de teatro musical, é um clássico da Broadway. Vamos realizar um espetáculo atual e com um elenco multirracial, a cara do Brasil!”, avisa ele.
E quem vê Tiago transitando com desenvoltura e naturalidade pelos palcos, pode não notar, mas o ator tem entre seus predicados uma certa dose de timidez. “Entre amigos, sou brincalhão, falo besteiras, mas, no geral, fora dos palcos, sou tímido e reservado”, conta ele, provando o seu lado discreto quando questionado sobre o coração. “O meu coração está batendo forte e muito saudável, fiz exames faz pouco tempo e está uma loucura! Estou bem e feliz, acho que isso responde muita coisa”, dispara.
– Como tem sido esse reencontro com o público brasileiro?
– O Brasil é muito generoso, é uma mãe que acolhe e eu me sinto abraçado. Estar no palco e ver os seus amigos, a família, as pessoas que sabem de suas lutas e vitórias... me arrancou lágrimas, pois fazia anos que não vivia isso.
– Como se descobriu na arte?
– Meu pai era músico, minha mãe cantava, desde a infância eu já tinha estímulos. Era impossível não se contaminar com a arte.
– Ao longo de sua trajetória, já sofreu com o preconceito?
– Esse desafio a gente encara o tempo todo. O racismo ainda está aí e a gente precisa cada vez mais mostrar e evidenciar, porque ele existe. Já passei por várias situações desconfortáveis, tendo que provar por A mais B por que estamos ocupando aquele espaço. Às vezes, não basta você ter o talento, é preciso ter duas vezes mais o talento para que te reconheçam.
– É uma carreira difícil?
– É a carreira dos resilientes. Não basta só estar preparado e ser bom. Precisa mais do que isso. Não adianta cair nessa carreira achando que você vai surfar em uma onda, porque a gente conta nos dedos quem veio para ficar. Você ouve mais não do que sim. Nas audições, você tem um minuto para provar tudo o que é capaz e isso é complicado, como condensar uma carreira em tão pouco tempo? Mas esse é o processo.
– Tendo atuado fora do Brasil, como enxerga a valorização do teatro no País se nós compararmos com outros lugares?
– Temos bons atores, atores de primeira grandeza, mas acabamos nos colocando em um lugar desprivilegiado, em terceiro lugar, mas temos muita qualidade. Claro, ainda existem produções que precisam aprender como fazer o teatro musical, porque é mesmo difícil, são horas e horas de dedicação, mas não perdemos em nada para nenhum outro país.
– Que balanço faz após interpretar Milton nos palcos?
– Acho que nunca conseguirei mensurar o que foi esse espetáculo na minha vida e na carreira. Foi a primeira vez em um trabalho biográfico e também foi a primeira vez que o Brasil me viu com outros olhos.
– Nos palcos você já se consagrou. Com o que sonha agora?
– Meu grande sonho já estou realizando, que é ser um homem respeitado dentro daquilo que me proponho a fazer. Meu foco é começar a trabalhar no streaming, novelas... sair do teatro e ir para as telonas ou para as telinhas.
FOTOS: OSMAR LUCAS; AGRADECIMENTOS: BELINT BELA CINTRA, KUAVI, TEATRO LIBERDADE