Em entrevista à CARAS Brasil, Luciano Mallmann comenta o fim de Elas por Elas e revela desejo de retornar aos palcos do teatro
Prestes a se despedir de Elas por Elas, Luciano Mallmann (52) celebra a naturalidade com que Carlinhos, seu primeiro personagem fixo, foi inserido na trama das 18h. Com o fim da novela, ele não esconde a vontade de voltar aos palcos do teatro e nega o título de "exemplo de vida". Para o artista, a superação é um trabalho de todos.
"Quando não só eu, mas toda pessoa com deficiência, é considerada assim, é como se todos os esforços para romper as barreiras que mundo e a sociedade nos impõem fossem de nossa exclusiva responsabilidade. E não: a superação deve ser conjunta. O fato de eu ter conquistado algum tipo de evidência, não quer dizer que eu seja um exemplo de vida e superação, um super-herói."
Mallmann diz se sentir honrado por, atráves de seu trabalho, contar sua história, falar suas percepções e ajudar no processo de descontrução do preconceito. Porém, o ator ressalta que sabe de seus privilégios —tanto financeiros, quanto de ter uma rede de apoio— e que nem todas as pessoas com deficiência se sentem representadas por ele.
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O ator pontua a importância de personagens como Carlinhos aparecerem nas tramas de forma natural, mostrando que a deficiência é apenas uma de suas características, e de, cada vez mais, existir acessibilidade, inclusão e diversidade em todas as suas dimensões.
Após o trabalho para a Globo, Mallmann já se prepara para apresentar ao público Cassiano, seu personagem na série Justiça 2. Na história, ele será um advogado cadeirante que teve sua carreira como atleta olímpico interrompida após um ataque violento que o deixou paraplégico.
"Cassiano tem um temperamento muito diferente do meu, nunca aceitou ter a sua carreira interrompida por um ataque homofóbico muito violento, que o tornou cadeirante. Claro que não foi fácil o meu processo de reabilitação. Mas não me tornei uma pessoa revoltada". O ator sofreu um acidente em 2004 ao praticar acrobacia aérea com tecido de circo, e perdeu o movimento das pernas.
"Nesse ponto, interpretar o Cassiano, buscar a sua verdade e suas motivações foi bem desafiador. Por outro lado, me ajudou bastante o personagem ter sido criado e escrito com tanta verdade, com muitas camadas e possibilidades", acrescenta.
Agora, o ator pretende retornar à área comercial em uma empresa de diversidade, e não esconde a vontade de retornar aos teatros com seu monólogo Ícaro. Além disso, ele também irá fazer um longa metragem no segundo semestre. Abaixo, Luciano Mallmann fala mais detalhes de Elas por Elas, comenta sua relação com as redes e sua carreira. Leia trechos editados da conversa.
Como está o coração nesta reta final de Elas por Elas?
Apertado. Elas Por Elas foi a primeira novela que trabalhei do início ao fim. Foram sete meses vivendo intensamente o ritmo das gravações, convivendo com uma equipe muito unida para obter sempre o melhor resultado do trabalho. Eu moro em Porto Alegre, vim para o Rio de Janeiro para fazer Justiça 2 e em seguida comecei a gravar a novela. Ou seja, foi um ano direto trabalhando e morando no Rio de Janeiro, cidade que eu adoro. Apesar da saudade que estou da minha casa, não tem como não ficar meio nostálgico.
Qual a importância da naturalização da deficiência de Carlinhos na novela?
O Carlinhos é um personagem cadeirante. A deficiência é apenas uma de suas características, não o que justifica a sua existência na novela. Ele trabalha, se relaciona, se apaixona. Assim como na vida, inevitavelmente, nós, pessoas com deficiência, acabamos falando sobre este assunto. No caso do Carlinhos isso foi acontecer somente lá no meio da novela. Mas até lá, a sua simples presença inserida de forma natural na história já foi de grande importância para esse processo.
Você é um exemplo para muitas pessoas com deficiência. Qual a importância, para você, de contar sua história?
Eu me sinto honrado de poder fazer parte deste processo de desconstrução do preconceito através do meu trabalho e ocupar este lugar de representatividade para alguém que possa se identificar comigo. Ao mesmo tempo sei que nem todo mundo com deficiência se sente representado por mim. Tenho plena consciência de que sou uma pessoa privilegiada, de classe média, com condições de ter um plano de saúde, tenho acesso à informação e transporte e apoio da família e amigos. Infelizmente no nosso país, quem não tem um mínimo de condições financeiras e tem alguma deficiência pode levar uma vida sub-humana. Sempre que tiver oportunidade de contar minha história e falar do meu trabalho quero sempre deixar isso bem claro.
Além disso, o fato de em determinado momento eu ter conquistado algum tipo de evidência, não quer dizer que eu seja um exemplo de vida e superação, um super-herói. Quando uma pessoa, não só eu mas toda pessoa com deficiência, é considerada assim, é como se todos os esforços para romper as barreiras que mundo e a sociedade nos impõem fossem de nossa exclusiva responsabilidade. E não: a superação deve ser conjunta, de todos. No meu caso, eu estou tendo a oportunidade de estar aqui contando um pouco da minha história e falando a respeito das minhas percepções sobre o assunto, porque tiveram pessoas que me deram oportunidade de trabalho, que criaram estes personagens, que me escalaram para os projetos, me dirigiram e proporcionaram as condições de acessibilidade necessárias para eu poder trabalhar. É sempre um processo coletivo.
Antes de retornar à atuação, você passou um tempo trabalhando como publicitário. O que te motivou a voltar a trabalhar com arte?
A minha essência é de artista e ser ator sempre vai ser mais importante que meu trabalho de publicitário, ainda mais diante de uma oportunidade tão especial como essa, de participar de Justiça 2.
No Instagram, você costuma compartilhar seus trabalhos, cliques em eventos e momentos do seu dia a dia. Qual sua relação com as redes sociais?
O que me motiva a usar as redes sociais, na verdade só uso o Instagram, é saber que estou conectado com quase todos os meus amigos de diferentes fases da minha vida e poder compartilhar com eles alguns dos bons momentos que vivo. Mas com certeza utilizo a rede social muito mais para poder divulgar o meu trabalho.
Você tem novos projetos que possa contar?
Vou retomar meu trabalho na área comercial de uma empresa de diversidade, em que tenho muita liberdade para fazer meus trabalhos como ator. No segundo semestre vou fazer um longa metragem e quero retomar as apresentações de meu monólogo teatral “Ícaro”, espetáculo que escrevi e com o qual fiquei em cartaz por cinco anos.
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