Na Ilha, eles defendem a cultura
Além de eterno galã, Antonio Fagundes (70) é ícone de inspiração. Como ator, faz sucesso na TV, no teatro e por onde mais se arrisca. No último ano, por exemplo, encarou com maestria um dos papéis mais encantadores da televisão com o Alberto de Bom Sucesso, onde inspirou milhares a retomar o hábito da leitura – ou, por que não, se iniciar nele –; celebrou mais de 300 mil espectadores na peça Baixa Terapia, que fica em São Paulo até 29 de março e estreia no Rio de Janeiro em 1º de maio; produziu o musical Carmen – A Grande Pequena Notável; se arriscou com as novas tecnologias ao entrar para o Instagram; e ainda encabeçou um clube do livro derivado da novela. Acha pouco? Ele não para.
Se na vida profissional é assim, na pessoal, ele prefere manter discrição. Mas está casado com a também atriz e produtora Alexandra Martins (40), que conheceu 13 anos atrás. Ela é a sortuda de ter um homem romântico e apaixonado ao seu lado. Sim, Fagundes abre a porta do carro, se preocupa com o bem-estar da amada, com quem troca olhares cúmplices e beijinhos a todo momento. “A gente até nem gosta muito de falar, a gente prefere viver. A relação está boa”, resume o astro sobre a união com sua musa inspiradora.
Nos últimos tempos ou, como ele mesmo gosta de definir, “desde sempre”, o par se tornou símbolo de defesa da arte no País, com opiniões fortes, graças à experiência de anos na luta para viabilizar seus projetos. Na Ilha de CARAS, em Ilhabela, litoral norte de SP, ele expressou sua indignação com o atual panorama.
– Está mais difícil produzir no Brasil?
Antonio – Sempre foi difícil. O que mudou agora é que percebemos uma energia ruim, uma vontade de que dê errado. A gente não precisa disso porque já temos problemas suficientes para enfrentar e tem muita gente torcendo contra. Eu sempre falei isso: não quero ajuda do governo, quero que o governo não atrapalhe. Se o governo não atrapalhar, vai ser ótimo para todo mundo. E este governo agora está atrapalhando. Este é o problema do Brasil. Sempre foi difícil, é complicado, desde 1500, a política cultural do País é complicada. É um problema de Estado, de entender que a cultura é importante. Peguemos, por exemplo, esse filme que ganhou quatro Oscar, OParasita, foi um projeto de governo da Coreia do Sul. Eles começaram isso em 1990 e, em 30 anos, resolveram o problema do cinema e o transformaram do nada em algo extraordinário, dentro da Academia de cinema norte-americana. É um projeto do país, de projetar sua cultura. Não é um filme a favor do governo. Pela mentalidade tacanha daqui do Brasil, esse filme não seria feito porque não é chapa-branca. Você vê ali a força do cinema coreano em menos de uma geração. É uma coisa que realmente só o Brasil não pensa.
Alexandra – Precisamos respeitar a cultura como indústria. Foi um recado muito bonito da Academia, mostrando sua força e pensamento. Foi um Oscar de representatividade.
Antonio – Parasita foi feito com 11 milhões de dólares, é um filme de baixo orçamento, isso não é nada. Ele já faturou 165 milhões até o Oscar, imagine a partir de agora quanto vai ganhar. É uma entrada de divisas para a Coreia do Sul que nenhuma empresa leva.
Alexandra – Produzir é muito trabalhoso, é algo que não para. Principalmente porque o Antonio fica à frente de tudo, mesmo tendo uma equipe muito boa. É bom, mas dá uma cansadinha.
– E quando conseguem tirar férias?
Antonio – Férias longas, faz tempo, uns dois anos. Mas conseguimos sempre dar uma passeadinha. Em Portugal, por exemplo, a gente não consegue desligar cem por cento. Fomos antes da equipe porque tivemos que trabalhar na divulgação da peça, era a quarta vez por lá.
Alexandra – Claro que a gente se diverte e aproveita um pouquinho.
Antonio – Tomamos um vinhozinho, lógico, porque ninguém é de ferro!
– Como é, após tantos anos, tantas novelas, ainda fazer sucesso com uma obra na TV?
Antonio – Bom Sucesso foi uma delícia de fazer. Incentivar a leitura foi o mais importante. É nosso universo. Fizemos poesia na TV aberta. Elenco pequeno, todos muito queridos, unidos, com talentos com quem nunca havia trabalhado, como a Grazi Massafera.
Alexandra – Além disso tudo, achei corajoso “matarem” o protagonista. Se bem que ele vive para sempre em nossas memórias.
– Da novela, surgiu um clube do livro...
Antonio – Foi um dos prazeres de fazer esta novela. Surgiu na internet, em formato de podcast, e vai ter até uma segunda temporada. É muito importante usar a tecnologia a favor do contato pessoal, da sociabilidade. Não podemos abandonar isto. A brincadeira do clube do livro é interessante por isso, apesar de a proposta ter sido estimular as pessoas a lerem. Em 21 programas, cheguei a indicar pelo menos cem livros. A ideia me emociona porque naquela semana as mesmas pessoas irão ler o mesmo livro e depois irão conversar sobre ele. É uma conquista que não se pode jogar fora, assim como a televisão, o teatro e o cinema.
– No teatro, continua um sucesso...
Antonio – Estamos há três anos em cartaz e ansiosíssimos para estrear no Rio. Eu, particularmente, porque faz dez anos que não faço uma temporada lá, vamos ficar três ou quatro meses. Já viajamos por 27 cidades do Brasil, três nos EUA e nove em Portugal. É um prazer fazer esta peça, o público ri muito, se diverte muito, é muito gostoso ver a plateia vibrando e ainda tem um final surpreendente.
Alexandra – Baixa Terapia funciona muito naquela troca com os espectadores e isso no teatro acontece na hora. É uma comédia muito forte, que se relaciona com o público desde a primeira frase que a gente diz. O desafio é que são seis atores em cena o tempo inteiro. Temos que ir no tempo da plateia e trazê-la para a gente. O elenco é uma delícia. Nossa expectativa é muito grande, para o Antonio mais ainda. Temos um carinho muito especial pelo Rio porque somos de lá, temos muitos amigos e familiares. Os ingressos já estão à venda.