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Laura Vicentini transformou fazenda canavieira em exemplo de sustentabilidade e economia circular

De mudas pré-brotadas a cachaça orgânica, a agrônoma inovou na forma de produção e aproveitamento da cana-de-açúcar

Redação CARAS
por Redação CARAS
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Publicado em 17/08/2024, às 08h00

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Laura Vicentini transformou fazenda canavieira em exemplo de sustentabilidade e economia circular - Foto: Divulgação
Laura Vicentini transformou fazenda canavieira em exemplo de sustentabilidade e economia circular - Foto: Divulgação

Laura Vicentini, 38 anos, nasceu em Ribeirão Preto (SP) e sua essência sempre foi ligada ao universo rural. Tanto a família materna como paterna tinham fazendas voltadas à cafeicultura nas cidades paulistas de Serra Azul e Altinópolis. Por isso, na hora de escolher a profissão, não teve dúvidas: seguiria a carreira de Engenheira Agrônoma para se dedicar à área de café.

Em 2004, iniciou o curso de Agronomia na Unesp de Jaboticabal (SP). Ao longo da faculdade sua visão foi se ampliando e a cana-de-açúcar, que não era vista com bons olhos por ela até então, passou a fazer parte de sua rotina. “A cana de açúcar estava muito demandada na nossa região. Mas eu tinha receio de migrar para essa cultura, porque achava o café muito mais instigante, diferente e profissionalmente desafiador. Os canaviais eram meio apáticos, tudo igual, não me despertavam interesse”.

A mudança de rota começou quando Laura teve oportunidade de trabalhar com manejo integrado de pragas na faculdade. “Passei a ver a riqueza e a maravilha da cultura de cana e todas as possibilidades que proporciona. Foi amor à primeira vista. Depois de formada, trabalhei por mais de 10 anos em usinas (Santa Fé e Raízen) e já estou há quase duas décadas atuando no setor canavieiro”.

E por falar em amor, foi por meio da faculdade e da cana que ela conheceu seu marido, Rodrigo Spina, 39 anos, que deixou a aviação (é piloto de helicópteros) para se tornar agrônomo. Em 2016, o casal começou a planejar em como atuar empresarialmente dentro do setor para poder crescer.

Em 2017, Laura e Rodrigo abriram uma empresa chamada Spinagro na fazenda canavieira da família dele no município de Batatais (SP). O foco? Explorar uma lacuna que havia no mercado: a produção e comercialização de Mudas Pré-Brotadas (MPB) de cana-de-açúcar. "Em uma parte da fazenda produzimos cana convencional e, em outra, extraímos as gemas da cana, que rebrotam em local climatizado e posteriormente são encaminhadas a estufas; lá, se transformam em mudas que são vendidas para produtores de todos os portes e para usinas, dando origem a novos canaviais", explica Laura. A empresa se tornou referência nessa atividade.

A visão empreendedora do casal fez com que vislumbrasse outra oportunidade, lastreada nos pilares da agenda ambiental: a produção da cachaça orgânica SôZé Sustainable Cachaça. A ideia surgiu como forma de aproveitar os resíduos gerados na produção das MPBs, os toletes, a parte de cima da planta, que é nobre e pode ser consumida pura, direto do pé como se fazia antigamente, ou ser base para preparo de alimentos, bebidas ou rações.

A gente tentava aproveitar dando os resíduos para o gado, mas tínhamos poucas cabeças e sempre ficava um excedente que era subutilizado. Começamos a estudar formas de processar esses resíduos nobres de maneira a aproveitá-los melhor. Concluímos que a produção de cachaça era uma ideia viável e promissora”.

Para fazer a ideia sair do papel, eles contaram com a ajuda de uma consultoria, montaram toda a planta da destilaria e depois executaram o projeto. Hoje, existe uma cadeia de produção dentro da fazenda totalmente integrada, cadenciada e sustentável. Desde 2018, todos os processos no manejo dos canaviais deixaram de ser químicos, dando espaço para 100% de bioinsumos; os resíduos da destilaria se transformam em adubo para a lavoura; o sistema de captação de água da chuva possibilita reutilizar essa água para a lavagem das moendas e pátios.

Na questão social, todos os colaboradores são formalizados, segundo CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), com controle de saúde e segurança. Tudo adequado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) propostos pela Organização das Nações Unidas (ONU). “Nossa essência é o agro, não tínhamos histórico de indústria, mas buscamos conhecimento e estamos sempre aprendendo. Procuramos ter humildade para encontrar quem sabe fazer, porque sozinhos não conseguiríamos. Contamos principalmente com um apoio muito forte do Sebrae na estrutura de processos de compra e venda, precificação, comunicação etc, e da Apex, que educa os produtores para serem exportadores. Estamos sempre adaptando as demandas conforme a empresa vai crescendo”.

Para Laura, o maior desafio de criar uma marca sustentável do zero é formar uma equipe alinhada com esse propósito para que seja possível, no dia a dia, manter e criar maneiras modernas de nutrir o campo. Por isso, a Spinagro investe em treinamento constante para seus colaboradores. Em abril, essa trajetória de Laura foi reconhecida, fazendo com que ela entrasse para a lista dos 100 mais influentes do Agro, prêmio promovido pelo Grupo Mídia, em Ribeirão Preto. “Nunca me vi influenciando alguma coisa ou alguém. Isso foi acontecendo naturalmente e é uma grande responsabilidade. Uma missão desafiadora, mas gratificante”.

Sobre o papel da mulher no Agro, Laura acredita que “a mulher não está tomando lugar de ninguém, muito menos do homem. Ela só está ocupando o lugar que lhe pertence quando ela gosta e sabe o que faz”. Na empresa, o casal tem funções diferentes, que se complementam. “Meu marido fica mais na gestão financeira e eu na gestão técnica/operacional e de pessoas. Essa visibilidade que acabei tendo ao tomar a frente na área de comunicação só é possível porque eu tenho a retaguarda do Rodrigo”. Ela também conta com uma rede de apoio para ajudá-la nos cuidados com o filho Augusto, de 2 anos, que desde bebê já frequenta a fazenda.

Com o tempo o casal se encantou com a cachaça e hoje ela faz parte até de seu ambiente social. “Enobrecemos a degustação, treinamos bartenders que usam a cachaça para a produção de drinques diversos e inovadores. Vislumbro um crescimento imenso desse mercado e a valorização da cachaça, um produto genuinamente brasileiro e que deve ser orgulho para o País”. A produção é toda exportada, não há ainda comercialização no mercado interno. Segundo Laura, no exterior já é mais valorizada a questão da sustentabilidade. No Brasil, ainda está se criando essa cultura. Mas conforme a produção vai ganhando mais volume, a tendência é abrirem também para o mercado nacional.

A receita não tem muita novidade, é praticamente a mesma de cachaças originais, mas o processo é ultratecnológico e limpo. A proximidade entre a área de produção rural e a destilaria própria faz com que a bebida já seja envasada dois dias após o corte da cana. "Por manter o frescor, sem ser envelhecida, é uma cachaça que agrada ao paladar europeu", afirma.

A cachaça é um título brasileiro. Pode até existir produção de aguardentes em outros países, mas não levam esse nome. Essa é uma bandeira do Brasil, assim como a Tequila é para o México. Por isso, Laura leva a brasilidade em tudo o que envolve o produto, como as cores do rótulo, do lacre e o nome: SôZé, uma homenagem a José Augusto Tomazela, pai da sua sogra, que adotava práticas sustentáveis quando ninguém falava disso. “É uma homenagem singela a quem há 60 anos já fazia questão de preservar nascentes de água, ter Áreas de Preservação Permanente, quando isso nem era previsto em legislação, inclusive com área superior à atualmente exigida (20% do total); que nunca permitiu que se prendessem animais; que colocava música para vacas durante a ordenha. São exemplos simples de sustentabilidade de quem nunca pronunciou essa palavra, mas a colocava em prática com maestria. SôZé também é um jeito carinhoso de pronunciar Senhor José, um dos nomes mais populares do Brasil”.

Laura Vicentini transformou fazenda canavieira em exemplo de sustentabilidade e economia circular

Laura Vicentini transformou fazenda canavieira em exemplo de sustentabilidade e economia circular

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Laura Vicentini transformou fazenda canavieira em exemplo de sustentabilidade e economia circular