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Escolher parceiro para agradar a outras pessoas é fracasso na certa

CARAS Publicado em 24/07/2013, às 18h30 - Atualizado em 10/05/2019, às 11h20

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Outro dia alguém me fez uma provocação: o “doutor” já pensou que as mulheres possam estar em busca de um genro ou de um pai para se casar? E que os homens possam querer como mulher uma mãe ou uma nora? Pego de surpresa, demorei alguns segundos até que a ficha caísse e eu compreendesse o que a pessoa queria dizer. Referia-se às mulheres e homens que, diante da escolha do parceiro,
pensam menos no que desejam para si e mais naquilo que poderia agradar aos pais, no genro ou na nora que eles gostariam de ter, no marido ou na esposa ideal, esta, uma mãe perfeita para os filhos que vierem, aquele, um futuro provedor econômico e afetivo para a família.

Eles e elas realmente podem ter como critério para levar um amor adiante as características que foram acostumados a valorizar em suas famílias e, portanto, os parceiros e parceiras escolhidos seriam naturalmente do agrado delas, e ainda prováveis bons pais e mães de seus futuros filhos. Nenhum problema, se não houver dissociação entre o desejo amoroso e todos esses fatores. Na verdade, observamos muitos casamentos que têm êxito nesta conciliação, e até os vínculos são reforçados pela afeição compartilhada por todos. Há casos, porém, em que ele e ela não sabem exatamente a origem de seu desejo. Todos nós somos atravessados por influências diversas, sejam familiares, sejam culturais ou de outras fontes, inconscientes. Em boa proporção, só os que fazem Psicanálise, não sem sofrer resistência, conseguem vislumbrar de onde vêm essas influências. Não é tão comum que cheguemos ao ponto de ser apenas marionetes de desejos alheios que falam de dentro de nós, mas há momentos em que isso realmente pode acontecer. Dizendo de forma simples e simbólica, é sempre interessante saber “qual é o pente que o penteia”.

 Digo isso porque, uma vez conscientes dessas influências, tornamo-nos mais capazes de filtrar, depurar os desejos e adequá-los ao que realmente queremos, em lugar de agir conforme o desejo dos outros, somente para agradá-los. Essa, que para muitos é uma operação inconsciente, constitui para outros verdadeira estratégia premeditada para se livrar da responsabilidade
pelo próprio desejo. E aí configuram-se, sim, situações como a de escolher parceiros para agradar aos outros, em geral os pais. A operação consiste na abdicação da própria vontade, vista como temerária ou má, em prol de nobres ideais, como os de prestigiar a família e garantir a prole — como se a escolha de uma pessoa amada não pudesse ser coerente com o agrado aos pais e aos futuros filhos. Afinal,
embora haja casos em que a família realmente implica com a escolha, as estranhezas tendem a passar com o tempo. Ou não, fazer o quê? 

Renunciar às próprias escolhas para agradar quem quer que seja, na verdade, é uma estratégia para se livrar dos riscos que uma opção pessoal e singular poderia trazer em termos de incerteza e angústia. Esta escolha estaria comprometida com o que o sociólogo francês Alain Badiou (76) — estudioso interessado na reinvenção do amor — chama de “concepção securitária” do amor, ou o “amor com risco zero”. É o casamento arranjado em nova roupagem, constituído de forma subliminar ou premeditada — que, convenhamos, de risco zero só tem a intenção, pois, na realidade, onde amor não há, o risco de viver a dois é enorme.