Em entrevista à CARAS Brasil, André Torquato reflete sobre o cenário nacional do teatro musical e detalha retorno aos palcos com o espetáculo 'Tatuagem'
Publicado em 24/01/2025, às 11h30
André Torquato (31) retorna ao palco no Espaço Cia. da Revista em 1º de fevereiro com o espetáculo Tatuagem, que lhe rendeu o Prêmio Bibi Ferreira de Melhor Ator Coadjuvante em Musicais de 2022. Em entrevista à CARAS Brasil, Torquato destaca o aumento de obras nacionais no teatro musical e comenta bastidores da produção: "Inacreditável", compartilha.
Depois de brilhar nos palcos com Clara Nunes: A Tal Guerreira, André volta a viver Paulete em Tatuagem, espetáculo que explora a resistência artística em meio à ditadura militar brasileira. Para o artista, estar de volta ao musical é como reencontrar um tesouro raro: “Tatuagem é uma daquelas joias que aparece poucas vezes na carreira de alguém. Foi um encontro bonito demais de artistas com histórias distintas, mas que se transformaram numa grande família”, comenta.
A reestreia da peça, que também celebra os 25 anos da Cia. da Revista, é marcada pelo espírito coletivo e pela espontaneidade. André destaca o quanto a sinergia entre o elenco faz toda a diferença. “Toda vez que nos reencontramos para fazer a peça, é como se nunca tivéssemos saído dos camarins da Cia. da Revista. A peça sempre flui de uma maneira inacreditável. E o próprio Chão de Estrelas [troupe retratada na peça] pede uma espontaneidade que o elenco todo adora. Qualquer erro vira piada e a plateia vai abaixo”, relembra.
Tatuagem tem a trama ambientada na década de 1970 e, através do clima da época, aborda questões sociais e políticas que ressoam nos dias de hoje. O intérprete enxerga no espetáculo não só o potencial artístico, mas também revolucionário ao revisitar o passado para promover uma reflexão sobre o presente.
Segundo o ator, as discussões sobre a ditadura, muito em pauta no Brasil pelo sucesso de Ainda Estou Aqui, indicado ao Oscar de Melhor Filme e Melhor Filme Internacional, precisam se fazer presentes. Ele destaca a importância da arte como meio para apresentar esses temas ao público: “Revisitar o passado para repensarmos o presente e nos prepararmos para o futuro é uma das grandes funções da arte".
"O momento político que vivemos mundialmente hoje é assustador, com a extrema-direita ganhando cada vez mais força e a esquerda se mostrando desarticulada perante tal força. Que essas obras possam causar uma sensação de inquietude, para que o público se sinta convocado a agir", reflete.
Com 15 anos de carreira, André tem uma visão apurada sobre a evolução do teatro musical no Brasil. Ele lembra que, quando começou, o cenário era dominado por produções internacionais replicadas da Broadway ou do West End. Hoje, há uma valorização maior das obras brasileiras e autorais.
“Lá em 2009, quando comecei, o teatro musical ainda era recheado de produções internacionais que seguiam um método de réplica. Um time de fora vinha dirigir o espetáculo, mas, hoje em dia, essas produções estão cada vez mais escassas. Acredito que esse seja o futuro e gostaria muito que os produtores e investidores apostassem nos nossos roteiristas, compositores e dramaturgos”, analisa.
Apesar das conquistas, o intérprete também destaca os desafios enfrentados por companhias independentes, como a Cia. da Revista. "Grupos de teatro em São Paulo, assim como o Chão de Estrelas [retrato em Tatuagem], correm um constante risco de acabarem. É impressionante a resistência dos diretores desses grupos e a capacidade de passar por tanta adversidade. A falta de incentivo e financiamento quase fechou as portas da Cia. da Revista mais uma vez, por mais que ela tenha um papel importantíssimo para a cultura paulistana", compartilha.
André aponta, ainda, a importância de incentivos governamentais para as produções culturais nacionais. "A Cia. se mantém em 2025 graças ao Fomento ao Teatro da Secretaria de Cultura da cidade de São Paulo. Qualquer mercado ou indústria precisa de subsídios estatais para existir, e a cultura, como bem imaterial e direito resguardado pela Constituição, deve ser incentivada pelo Estado".
Apesar de transitar entre diferentes linguagens artísticas e reconhecer que experiências no cinema e no streaming, como a participação no filme Fox Sisters — previsto para estrear ainda este ano —, abrem novos horizontes, ele admite que o teatro é onde se sente mais em casa.
“Acho que o teatro é minha segunda casa, porém tenho cada vez mais vontade de explorar o audiovisual. O Fox Sisters já foi uma primeira experiência avassaladora, um filme de época, todo falado em inglês, com muitos efeitos especiais. Sinto que pelo meu trabalho no teatro já estar mais consolidado, não tenho tanta pressa pra os projetos de audiovisual”, declara.
Após Tatuagem, André se prepara para encarar um desafio completamente diferente: uma nova montagem da versão brasileira do musical Meninas Malvadas. A mudança entre os universos das duas produções é algo que o ator vê como enriquecedor: “Eu adoro estar no Recife dos anos 70 e, ao mesmo tempo, numa escola de ensino médio nos tempos atuais. Uma das coisas que eu mais gosto na minha profissão é essa possibilidade de habitar universos diferentes”.
Mesmo com tantos projetos no horizonte, ele mantém os pés no chão e o foco na arte como forma de transformar e conectar. “Acredito que essa versatilidade é que me possibilita continuar trabalhando e emendando um trabalho no outro. É muito rico poder vivenciar diferentes produções, cada uma me ensina uma coisa diferente à sua maneira”, conclui.
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