Em entrevista à CARAS Brasil, Dimas Novais, roteirista do Festival Negritudes, da TV Globo, reflete sobre experiência palestrando em fórum da ONU
O jornalista, pesquisador e roteirista do Festival Negritudes, da TV Globo, Dimas Novais (36) foi um dos convidados do Fórum de Minorias Sociais do Alto Comissariado pelos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, em Genebra, Suíça. Em entrevista à CARAS Brasil, o comunicador detalha sobre sua passagem na Europa e reforça importância de abordar sobre este tema.
O evento, que aconteceu até domingo, 1, discutiu temas ligados à representatividade de grupos sociais minorizados em espaços públicos, educação, mídia, artes e cultura. Durante sua passagem, Dimas Novais participou do debate sobre representatividade nas mídias globais, falando sobre sua experiência nas mídias brasileiras. O jornalista fala sobre suas impressões.
"Minha experiência na Europa tem sido muita gratificante por ter tido seu ápice no que me trouxe aqui: representar o Brasil em um dos eventos mais importantes do mundo em Direitos Humanos, para cerca de 600 ativistas, representantes de Estados e de governos, lideranças da ONU, etc. Fui convidado para fazer um discurso no dia 29, durante o painel sobre sub representação na mídia. Gostaria de ter levado dados mais esperançosos sobre nosso povo, mas levei informações sobre a violência cotidiana, que nos atinge há séculos. Fiz isso para justificar a importância de termos uma mídia com mais representatividade do povo negro e com representações mais dignas. É sobre o fomento de um futuro melhor para todos", declara.
O palestrante reforça que é importante debater sobre representatividade no audiovisual, pois essa é uma forma de reflexo da sociedade: "A arte nos oferece imaginários que podem nos direcionar pra quem quisermos ser. Ao ver histórias de potência, de realidades diferentes das nossas, podemos vislumbrar futuros possíveis e desejá-los".
"O noticiário precisa dar conta da realidade e mostrar as mazelas que nos atingem diariamente. Mas as artes podem questionar porque seguimos com uma realidade tão infeliz, mesmo sendo o Brasil um país diverso em sua essência, como falei no meu discurso na ONU. A tragédia virou nosso cotidiano e as notícias de violência contra a população negra revelam isso pra gente todo dia. As artes nos convocam a pensar: se somos a maioria da população (mais de 55%, segundo dados do IBGE) por que estamos tão longe dos acessos? Por que não temos mais representantes políticos negros? Por que apresentadores de TV negros são tão raros? Por quê? Por quê?", questiona.
Dimas Novais explica que existe diferença entre representatividade e representação. O jornalista, que tem passagem pela Contigo!, destacou que não é só sobre retratar determinados grupos nas peças audiovisuais, mas é importante estar atento em como eles são representados.
"Não é sobre o número de pessoas não brancas inseridas numa trama de ficção, como uma novela, apenas, mas é sobre como elas estão sendo exibidas. Se foge de estereótipos, se possibilitam novos horizontes pra uma pessoa ocupar na sociedade, se são personagens que guiam seu próprio destino e não ficam apenas a mercê de personagens brancos. Tudo isso importa", avalia.
Pela primeira vez na história, o cenário das novelas brasileiras conta com três mulheres negras ocupando o protagonismo em todas as faixas. Dimas destaca Garota do Momento, atual trama das seis da Globo.
"Acredito que o cenário das telenovelas brasileiras, hoje, é bonito. Tenho amigos queridos que muito me orgulham envolvidos em 'Garota do Momento'. Esse folhetim é um abraço nos sonhos de nossos ancestrais ao mostrar uma garota negra ascendendo como expoente de beleza nas décadas de 50/60. Se houvesse essa explosão de autoestima pra nosso povo lá atrás, seríamos outra nação, hoje", avalia.
Dimas é nascido em Salvador e tem raízes na cidade de Maracás, sudoeste baiano. Durante sua fala na ONU, o pesquisador declarou :'ser do Nordeste me traz perspectivas específicas’. O roteirista da Globo explica sobre suas experiências e reforça a importância do Nordeste para cultura brasileira.
"As culturas nordestinas são muito plurais. As minhas são ligadas, por exemplo, aos festejos juninos do interior, ao carnaval de Salvador e à música baiana produzida, por exemplo, pelo rei Gil. Cada verso cantado traz um pouco de quem somos. A culinária afro indígena brasileira e a fé sincrética são o comum, não a exceção. Por minha vida inteira, vi pessoas se dizendo católicas, mas jogando flores para Iemanjá no mar. Isso é lindo. Fé é pessoal e ninguém deveria se incomodar sobre como a outra pessoa professa a sua. Uma criança aprende intolerâncias com o passar do tempo e aprende a ser intolerante também. Se tiver acesso a mais dignidade nas representações na mídia, mais pode aprender a ser respeitoso com o próximo. O Brasil tem muito a aprender com o Nordeste", finaliza o jornalista Dimas Novais.
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