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Revista / ENTREVISTA

Majur reconhece a força de sua trajetória: 'Acredito no poder de ser você'

Em entrevista à Revista CARAS, Majur celebra sua primeira turnê internacional e diz viver seu auge na vida pessoal e profissional

A cantora e compositora Majur - Foto: Cadu Pilotto | Look: Dendezeiro
A cantora e compositora Majur - Foto: Cadu Pilotto | Look: Dendezeiro

Com apenas seis anos de carreira, Majur (29) acumula feitos históricos e tem ganhado cada vez mais espaço na indústria musical. Primeira mulher trans a cantar no Palco Mundo do Rock in Rio e em um camarote na Sapucaí, ela é símbolo de representatividade e sabe disso.

Realizada, ela celebra a carreira que está prestes a ganhar holofotes internacionais com uma turnê que se inicia em maio pela Europa. Da Bahia para o mundo, a artista quer compartilhar com o público sua música e sua filosofia de vida.

Leia também: Majur rebate o preconceito no Brasil: 'País que não aceita mulheres trans'

"Acredito muito no poder de ser você, de escrever sua história a partir do que você deseja e acredita",
afirma Majur, em papo exclusivo com a Revista CARAS, que aconteceu em seu apartamento, localizado no Rio de Janeiro.


Você diz que tudo é maré. E você está em uma maré boa!
Muito! É a primeira vez que alcanço o auge de mim mesma. Obviamente, quando a música AmarElo foi lançada, foi um auge, mas agora é sobre mim, sobre meu corpo, a minha história, como eu me sinto: completa de mim mesma. Não tenho as disforias que tinha antes. Eu já tinha contado um pouco sobre como foi o processo do meu corpo e de me sentir, de me buscar. Agora, de fato, é um momento auge para mim, em que me encontrei. Sei que essa é minha casa e, se eu modificar mais alguma coisa, o Brasil vai ver e será por uma questão minha de estética. Estou muito satisfeita comigo, com a minha carreira, com a minha família, com meus fãs, que agora se inclinam para esperar o álbum que estou há dois anos dizendo que estou criando. Estou com uma turnê internacional, passando por mais de dez países, então é um momento muito fantástico.

Você disse uma vez que queria estar bem-sucedida aos 30 anos. Você ainda não trintou, mas já é bem-sucedida!
Minha mãe falou que quando eu chegasse perto dos 28 para os 29 aconteceriam rupturas, que eu iria destruir algumas coisas, construir outras e entender outras. De fato, muitas coisas aconteceram. Perto dos 28 me separei; quando entrei nos 28, eu olhei para tudo que estava acontecendo e percebi que tinha alguma coisa me chamando para frente e aí eu tinha duas decisões: ou olhava para trás e permeava tudo que vivi ou eu continuava. Eu só segui. Fiz muitos shows importantes, me senti extremamente feliz de estar vivendo aquilo. Aí vem a minha morada no Rio de Janeiro, já modificando toda a minha vida, uma casa nova, comprando móveis novos, tendo acesso a novos lugares. Para completar, chega minha manager e fala que estava construindo a turnê internacional, que seriam vários lugares e que o festival Mighty Hoopla, em Londres, me chamou. Eu surtei na hora! Vou cantar no mesmo dia que a Ciara! É muito doido! Foi um ano de virada. Agora, as coisas estão no seu devido lugar, eu estou no meu devido lugar —que é em mim mesma, viajando o Brasil, viajando para o mundo—, fui até para a Itália fazer parte de um passeio a convite de uma marca. Retornei e me apresentei na Sapucaí; foi a primeira vez que uma pessoa trans cantou na Sapucaí, isso foi um feito histórico incrível! Lá no Sambódromo, a primeira rainha foi uma mulher trans —Eloina dos Leopardos—, então, para mim, ser a primeira dentro da Sapucaí cantando é colocar mais um pouco nessa história, é contar a nossa existência, dizer para as pessoas que a gente existe e merece todas as coisas como todo mundo. A gente merece viver, merece amar, merece lazer, merece estar em qualquer lugar.

São muitas conquistas em poucos anos de carreira. Já caiu a sua ficha?
Para mim é um show de representatividade para as pessoas negras, trans. Cada vez que vou a esses lugares e eu sou a primeira, penso que estou sendo a primeira para que haja a segunda, a terceira, a quarta... E realmente vem acontecendo. Sou muito magnética e acordo todos os dias dizendo: 'O que eu quero, eu consigo', de uma forma muito poderosa. Não desacredito do que estou falando de maneira nenhuma. Se eu preciso, vou ter que ter. Digo para as pessoas exercitarem isso, porque traz coisas boas. Não desacreditem de vocês. E é muito difícil não desacreditar, porque o mundo todo diz o contrário.

Mulher trans, negra, nordestina, filha de uma mãe solo que catava materiais recicláveis. Era tanta coisa te dizendo não e mesmo assim você fez ser possível...
Minha vontade de querer alcançar era porque tudo aquilo que eu vivia era ok, não era bom. Eu queria descobrir o que era o bom. Depois que cheguei ao bom, quis descobrir o que era o melhor. Se existe alguma forma de deixar isso aqui como uma vibração, uma energia para as pessoas, que seja por meio das minhas canções, como faço hoje por meio dos meus shows. Eu queria tanto que as pessoas também pudessem ser assim na sua própria vida. Desde quando comecei a lançar as músicas, muitos fãs escrevem para mim, contam histórias de depressão, de viver LGBTfobia. É muito difícil ver tudo isso. Mas, ao mesmo tempo, ser essa imagem que pode significar para essas pessoas a possibilidade de sair disso é muito importante. Muitas pessoas cisgênero me veem e sentem coragem, algo que algumas delas não têm.

Como assim?
Eu entendi que quando a gente não consegue ser algo melhor para a gente, mas consegue ver isso em outro alguém, aquela possibilidade dá um gás. Antes de mim vi a Liniker, vi a Lacraia, vi a Leo Kret, lá em Salvador, na Bahia, vi a Ariadna no BBB... Então, que a força desse espelho possa ser suficiente o bastante para que as pessoas possam ser elas mesmas, ser cem por cento elas, a melhor versão de si mesmas. É muito ruim morrer e se arrepender de não ter feito algo. Então, por favor, vivam! Eu acredito muito nesse poder de ser você, de escrever sua história a partir do que você deseja, de ir atrás dos seus sonhos. Tudo que construí hoje é fruto de muito trabalho, de muita dedicação, esperança, fé. Então, que eu seja um espelho para essas pessoas.

E no País que mais mata pessoas trans e travestis você ser essa referência de sucesso é muito importante.
Muito mesmo! E não tem como não fazer isso. É impossível. Ou eu faço para melhorar o meu ambiente ou, então, eu vou ser só a primeira e isso não quero. Não faz sentido para mim ir para um lugar e só me ver, olhar para o lado e não ver uma semelhança. Quero estar nos lugares de mais visibilidade, sim, para que outras meninas possam se ver através de mim, ser elas mesmas e estarem lá junto comigo. Quantas modelos trans existem? Quantas cantoras trans existem? A Liniker acaba de nos provar que uma travesti pode ser a número 1 do Brasil e pode ser a artista do ano.

Você vive hoje algo que sonhou no passado. Como é?
Quando me imaginei cantora, ainda criança, me imaginava no palco, famosa, com uma casa, exatamente tudo o que aconteceu comgo. Eu posso estar em qualquer lugar que eu queira, o tempo que eu quiser, posso me mudar, posso ir, posso voltar. Eu criei essa liberdade de ser eu, de chegar a esses espaços. Agora, daqui para frente, é construir coisas. Quero ter mais apartamentos, quero criar uma renda para minha família ou para ter os meus filhos quando eu quiser ter. Estou trabalhando para um futuro mais leve. Alcancei grandes coisas e posso dizer que eu me sinto satisfeita. Agora, eu quero o mundo. Quero que o mundo me conheça, quero que as pessoas do mundo saibam que tudo isso aconteceu aqui, no Brasil, nesse País com tanto preconceito e que, ao mesmo tempo, pôde abraçar uma travesti e posicionar ela em um lugar tão poderoso como esse. Agradeço muito aos brasileiros, às pessoas que escutam as minhas canções, que estão lá comentando positivamente sobre o meu trabalho e todas as pessoas que contribuíram para minha carreira, porque foi muito importante para mim e eu não me esqueço de nenhuma delas.

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