por Deonísio da Silva* Publicado em 21/06/2010, às 17h24 - Atualizado às 17h25
Africâner: do holandês Afrikaander, incluindo Afrikaan, africano, e der, de Hollander, designando língua falada na África do Sul e em parte da Namíbia, originada do holandês do século XVII. Em A Enxada e a Lança, do escritor e diplomata Alberto da Costa e Silva (79), especialista em assuntos africanos, lemos: "A esse quadro há que acrescentar: o malgaxe, língua malaio-polinésia, trazida pelos indonésios que ocuparam, faz muitos séculos, Madagascar; o africâner, aparentado ao neerlandês, desenvolvido pelos colonos brancos da África do Sul; e o português". A seleção da África do Sul, treinada pelo brasileiro Carlos Alberto Parreira (67), cuja língua materna é a portuguesa, recebe instruções em inglês. Ao lado do africâner e do inglês, são oficiais também o sessoto e o setsuana.
Diversidade: do latim diversitate, cujo étimo é versum, particípio de vertere, verter, mudar. Na língua, é impossível recusar a diversidade, soando a preconceito querer que todos falem da mesma maneira. No futebol as diversidades linguísticas têm sutis complexidades. O técnico do Brasil, Carlos Caetano Bledorn Verri, o Dunga (46), é gaúcho e jogou alguns anos na Itália. Todos os jogadores são brasileiros, mas a maioria deles mora e joga em outros países. Vanderlei Luxemburgo da Silva (58) não sabia espanhol quando treinou o Real Madrid em portunhol. Luís Felipe Scolari (63), neto de imigrantes italianos, não falava inglês quando treinou o Chelsea, da Inglaterra. Fazia suas preleções e dava as orientações à beira do campo em "portinglês". O sueco Sven-Goran Eriksson (64) é o técnico da Costa do Marfim, seleção adversária do Brasil nesta Copa, mas as línguas oficiais são o francês, o diula e o baulê. De todos, o mais divertido foi Joel Santana (64) com seu imperdível inglês macarrônico no comando da seleção da África do Sul.
Novidade: do latim novitate, declinação de novitas, aquilo que é novo, como na expressão novitas anni, a novidade do ano, no caso a primavera; ou as novitates pugnae, as novas formas de luta, como o uso de elefantes por Pirro II (318-272 a.C.), cujo nome significa cor de fogo, nas batalhas de Heracleia e de Áusculo. Ele venceu as duas, porém na segunda disse: "Mais uma vitória dessas e estarei perdido". Nascia ali a expressão "vitória de Pirro", que desmerece o vencedor, como é o caso das seleções que ganham, mas jogam feio, esquecidas rapidamente, ao contrário das que perdem, mas jogam bonito, como as brasileiras de 1982 e 1986, sempre lembradas. Melhor mesmo é jogar bonito e ao mesmo tempo vencer, como em 1958, 1962 e 1970.
Preleção: do latim praelectione, lição dada antes de que seja cumprida uma tarefa, conferência com fins didáticos, educativos. É o que faz o técnico de futebol, chamado de professor pelos jogadores, antes de cada jogo, explicando a eles como atuar diante dos adversários. O nome erudito é acreose, palavra que veio do verbo grego akroáomai-oômai, escutar, e designa tarefa que só poderá ser bem executada se entendidas as instruções prévias. No futebol prevalece nessas instruções a variante popular da língua e por isso Claudio Coutinho (1939-1981), técnico do Brasil na Copa de 1978, foi muito criticado por usar palavras do inglês como overlapping, sobrepor, avançar. Todos os laterais brasileiros campeões do mundo avançaram sobre o adversário, bem antes dele, sem saber que estavam fazendo overlapping.
Torcedor: de torcer, do latim torquere, torcer, dobrar, curvar, olhar bem para algum lugar. Provavelmente veio a designar a pessoa que, ouvindo o jogo pelo rádio ou assistindo pela televisão, torce, dobra ou curva as mãos, de olhos fixos no que vê e ouve. Torquere aquam remis (remar contra a corrente) não é o que fazem os torcedores que apoiam seu time, esteja perdendo ou ganhando? No português, torcer aparece num verso do rei poeta Afonso X, o Sábio (1221-1284): "Com grande medo deixeilhe o anel torcer quando ferisse a pelota". Pelota era a bala de chumbo das armas de fogo. No futebol encontramos palavras de guerra: atacar, defender, vitória, derrota, massacre. O cartão amarelo, por metáfora, designa o ferido, que no próximo lance pode morrer, isto é, ser expulso. Na Inglaterra, onde nasceram as regras que ainda hoje legislam o futebol, supporter, cujo étimo é o mesmo de support, ajudar, proteger, defender, designa tanto o torcedor quanto o patrocinador. Os portugueses designam o torcedor por adepto. As palavras trazem os conceitos embutidos. O futebol, na Itália, é denominado calcio, do latim calx, coice.
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