Li recentemente uma reportagem sobre infidelidade que me deixou intrigada. Os entrevistados, homens bem-sucedidos na faixa de 29 a 40 anos, eram praticamente unânimes ao afirmar que traição com o objetivo de variar o cardápio sexual não é traição. Disseram eles coisas como: “É um exercício de afirmação da autoestima. É da natureza masculina conquistar e demarcar território” ou “A relação com a esposa pode estar perfeita, e mesmo assim pode rolar sexo com alguém que deu mole”.
Não é de hoje que os homens se justificam com o argumento de que, se a natureza fez assim, é assim que tem de ser. O que me surpreende é o fato de tal argumento ainda prevalecer entre homens jovens e aparentemente modernos. Se essa justificativa fosse válida estaríamos todos até hoje pelados e comendo com as mãos. Afinal, a natureza não nos fez adeptos do terno e gravata ou do garfo e faca.
No passado, quando a sociedade era mais, digamos, “quadrada”, justificar as traições desse jeito até fazia sentido, pois quem dissesse o contrário corria o risco de ser considerado menos macho. A infidelidade não era considerada um erro, mas um fato que deveria ser aceito com naturalidade.
A sociedade atual, porém, não é nada homogênea, nem dita regras tão rígidas. O padrão de conduta hoje dominante é o individualismo, cada um faz e pensa o que quer sem precisar se explicar — desde que siga a lei, obviamente. Por isso, hoje faz mais sentido entender a infidelidade como um direito das pessoas, uma escolha que pode ser feita igualmente por homens e mulheres.
O argumento naturalista peca por desconsiderar que somos dotados de reflexão crítica, qualidade que nos distingue dos outros bichos. Somos capazes de pensar e analisar nossas ações e pensamentos, validando-os ou não. É por meio da reflexão e da análise que descobrimos como nosso inconsciente nos sabota e nos mantém escravos de condicionamentos e autoenganos. Mas somos capazes de trabalhar para romper esses condicionamentos. Um exemplo: suponha leitor que um homem trai a esposa e é descoberto. Ela ameaça deixá-lo. Ele não quer perdê-la, se arrepende e decide não repetir o feito. Entretanto, diante de uma nova oportunidade de sedução, deixa-se levar (leia-se “obedece a seus condicionamentos genéticos e culturais”) e, mesmo sentindo culpa, é infiel novamente. A esposa, então, rompe a relação.
Diante da perda ele pode justificar-se para ela, para si e para o mundo com o argumento de que não podia ter agido diferente, pois os homens não foram feitos para ser monogâmicos. Mas, se for zeloso de sua integridade e coerência, vai se questionar: “Afinal, o que estou fazendo comigo mesmo? Se eu quero uma coisa, por que faço outra? O que este conflito revela a meu respeito? Qual é o sentido que quero dar a minha vida?
Ao exigir de si mesmo uma explicação, ele denota maturidade e crença na evolução. Toma as rédeas da sua vida. Muitas vezes isso é tão difícil que se faz necessário buscar ajuda, mas vale a pena.
Ao final, não importa se ele decidirá ser monogâmico ou polígamo, desde que se sinta inteiro e confiável para si mesmo. Sua autoestima não precisará ser afirmada, e o único território que terá de conquistar e demarcar será o território que compõe seu mundo interno.
Em breve voltaremos ao tema infidelidade.