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Admitir que o outro pode pensar diferente é atalho para harmonia

Rosa Avello * Publicado em 09/08/2010, às 17h13 - Atualizado às 17h14

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Rosa Avello - Arquivo Caras
Rosa Avello - Arquivo Caras
Talvez as razões mais frequente de brigas entre casais sejam a falta de respeito ao modo de percepção do outro e a tentativa de convencê-lo a ver o mundo de acordo com determinada óptica. Só que as pessoas são diferentes e não adianta lutar contra essa realidade. Já em 1923 o psiquiatra suíço Carl G. Jung (1875-1961) presenteou a humanidade com sua Teoria dos Tipos Psicológicos. Com base em 20 anos de observação do ser humano, ele concluiu o que agora os exames de imagem e os avanços da neurociência confirmam: o cérebro possui formas preferidas de perceber o mundo. Isso mesmo: cada um "lê" as coisas do seu jeito. Alguns captam melhor o que é concreto, tangível e mensurável, outros registram preferencialmente o abstrato, o que "pode vir a ser", o que está no terreno das possibilidades. Como decorrência dessa diferença cerebral, os primeiros têm foco no presente, os segundos, no futuro. Recentemente, em uma reunião social, presenciei acalorada discussão entre um casal que descrevia um acidente de carro. Ela, mais focada no concreto, relatava os detalhes, a sequência de eventos que resultaram no acidente. Ele, mais conceitual, apresentava suas impressões gerais. Ambos desejavam manter os ouvintes focados no que consideravam mais "real" e acabaram se irritando mutuamente. Ele, impaciente com as minúcias dela, ela, intolerante com a superficialidade dele. A situação constrangeu a todos. Conflitos assim, causados por tipos de percepção diferentes, podem ir muito além de discussões como a descrita acima. Administrar o orçamento familiar vira um transtorno quando um entende que o dinheiro é um bem que deve ser gasto com prudência e o outro, mais confiante no futuro, gerencia os gastos sem cuidado. Numa viagem, o tempo pode fechar quando o que manuseia o mapa é o mais voltado para o abstrato. Ele pode irritar uma pessoa com a percepção no concreto, que consegue focar grande quantidade de informações e, portanto, lê mapas com facilidade. Na educação dos filhos, a confusão é certa se, por exemplo, um quer brecar as saídas da filha adolescente, porque visualiza perigos futuros, e o outro, mais ligado no presente, prefere liberá-la, pois acredita que "tudo está sob controle". Qual está certo? Nenhum. Ou todos. Não há um tipo melhor do que o outro. Cada um têm seus alcances e limitações. Quando uma relação é significativa, chega inevitavelmente num ponto em que essas diferenças aparecem e devemos nos posicionar. Podemos transformar esse momento numa oportunidade para criar soluções originais ou, por falta de entendimento, postergamos a solução e mantermos o problema - a última, infelizmente, é a escolha mais comum. Quando se sabe que o processo cerebral direciona nossa percepção, a atitude é mais confiante na busca de saídas que satisfaçam os envolvidos. Diferenças entre tipos podem ser comparadas às diferenças na linguagem. Quanto mais soubermos a linguagem do outro, mais fácil será entendê-lo e valorizá-lo. Nem todos os problemas dos casais, claro, vêm das diferenças de funcionamento cerebral. Mas, sabendo que elas existem, podemos nos tornar mais tolerantes e criativos para desenvolver relações harmônicas e prazerosas.