Muitos ainda receiam dizer o que querem da relação. A mulher teme ser taxada de fácil se assumir que não deseja compromisso. O homem, como que para se vingar da liberdade de escolha dela, seduz e engana. Se fossem honestos, sofreriam menos.
por <b>Rosa Avello</b>* Publicado em 11/01/2010, às 23h35 - Atualizado às 23h44
Outro dia, uma paciente chegou ao consultório decepcionada e muito triste. Ela acabara de descobrir que o homem por quem estava apaixonada mantinha outros relacionamentos. "Eu o considerava especial, diferente da maioria", disse, expondo a sua desilusão. "Como descobriu?", eu perguntei. "Foi ele mesmo quem me contou. Falou que queria ser honesto e que terminaria com as outras se o namoro continuasse bacana."
No passado, homens que desejavam ter várias mulheres ao mesmo tempo enfrentavam dificuldades para alcançar esse objetivo. Seu caráter era questionado e os pais instruíam as moças para evitá-los a todo custo.
No entanto, os tempos agora são outros. As mulheres de hoje se dão o direito de escolher como e com quem se relacionar. Muitas também desejam ficar com vários homens, sem assumir compromissos, outras querem algo mais consistente, algumas buscam somente sexo, e existem aquelas que fazem um composée disso tudo. Há, portanto, homens e mulheres para os mais diversos gostos e cada um vive como deseja.
Entretanto, a grande maioria ainda dissimula suas intenções no início do relacionamento. Certos homens, como o namorado de minha paciente, seduzem e esperam que a mulher se apaixone para só então contar que ela não é única. Eles até pensam que estão sendo honestos e dando à mulher a possibilidade de "eliminar a concorrência". Tal bom mocismo,longe de ser correto, coloca a mulher em um dilema: se abre mão do homem, amarga a perda e fica sem saber se poderia ganhar a corrida maluca para tê-lo só para ela; se tenta manter o relacionamento, assume posição humilhante e torna-se insegura, pois, sem saber quantas e como são as suas concorrentes, sente-se vulnerável.
As duas opções - ficar ou romper a relação - são extremamente dolorosas e colocam a mulher à mercê do homem, que definiu as regras do jogo.
Todo esse constrangimento poderia ser evitado se as pessoas fossem sinceras e expusessem, logo no começo, o que pretendem com os relacionamentos. O problema é que mulheres que desejam uma relação consistente geralmente têm medo de assustar os homens e estes, por seu turno, parecem não se importar com os sentimentos femininos. Como se quisessem castigar as mulheres pela liberdade que conquistaram, tanto iludem quanto submetem. É uma maneira de manterem o controle. Esse jogo de esconde-esconde, naturalmente, acaba produzindo muito sofrimento e também uma enorme perda de tempo.
Os novos costumes pedem uma nova ética nos relacionamentos amorosos Se no passado era considerado de mau gosto explicitar logo o que se pretendia, agora já não precisa ser desse modo. Antes, se as mulheres verbalizassem o desejo de compromisso, podiam ser interpretadas como desesperadas, até mesmo encalhadas. Se, ao contrário, dissessem que pretendiam manter relações abertas podiam ser rotuladas de fáceis, oferecidas. Já os homens só eram bem-vistos se declarassem desejo pelo compromisso. Qualquer outro tipo de intenção os transformava em cafajestes.
Por tudo isso, a maioria dos homens e das mulheres ainda esconde as intenções afetivas nos tempos atuais. Talvez não tenham percebido que o mundo mudou. Vivemos dias de urgência. Declarar a que se veio é uma necessidade. Não dá mais para perder tempo com pessoas que têm expectativas completamente diferentes das nossas. Mesmo correndo o risco de sermos mal interpretados, é mais honesto dizermos logo quais são as nossas pretensões. Isso mostra que temos respeito pelo direito de escolha do outro e ainda abre a possibilidade de se construir alternativas que contemplem as expectativas de ambos.
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