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Decoração / Anuário

O arquiteto do luxo: Denis Montel

Denis Montel cria os espaços mais sofisticados do mundo, e conta por que a ostentação é o oposto do chique

Redação Publicado em 27/07/2011, às 03h50 - Atualizado em 08/08/2019, às 15h43

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O arquiteto preferido da Hermès - Divulgação
O arquiteto preferido da Hermès - Divulgação

Há doze anos trabalhando para o escritório de arquitetura francês RDAI, Denis Montel alcançou um lugar de destaque ao idealizar projetos inovadores para Loewe, Boucheron, Mikimoto e principalmente,
para a francesa Hermès. Montel tem o desafio diário de criar projetos de lojas que expressem o conceito da marca, mas que não serão consumidos como as bolsas Birkin e os desejados lenços cor de laranja. Além disso, cada criação tem a complexidade de revelar culturas e costumes diferentes e próprios de cada cidade, e todo esse processo envolve mais do que somente inaugurar mais uma nova loja. O último lançamento da Hermès projetado pelo escritório RDAI foi a charmosa loja em Rive Gauche, à esquerda do Rio Sena, em Paris. O prédio da década de 1930 era uma antiga piscina e foi adaptada para receber as mais desejadas peças da marca. Alguns elementos da estrutura foram mantidos na nova construção e essa é uma das surpresas de quem visita o espaço.

Formado pela Escola de Arquitetura de Paris – La Défense, Montel trabalhou em diversos escritórios desenhando casas e escolas, mas foi na criação de lojas que ele se consagrou. Montel esteve no Brasil para participar do Atualuxo, evento que discute o mercado de luxo, e conversou com o Anuário CARAS de Decoração.

O que define o luxo na arquitetura?

Os lugares de luxo permitem usar bons materiais mas, sobretudo, permitem ter tempo. Tempo de concepção, de construção, para criar em partes e poder detalhar o projeto. Isso é luxo para mim. Ostentar não me interessa de maneira nenhuma, porque isso não é o  verdadeiro luxo, é somente o que você quer mostrar para os outros e não o que você quer para viver.

A loja da Hermès na Rive Gauche tem uma fachada simples em comparação com outras lojas da marca. Por que isso acontece?

O prédio foi construído na década de 1930 e nós não podíamos alterar alguns elementos da estrutura. A fachada é simples mesmo, mas ela tem o objetivo de criar uma expectativa. As pessoas logo se surpreendem ao entrar na loja, elas gostam de descobrir o seu interior. É interessante porque quando os clientes entram você percebe que eles estão se divertindo. Eles não dão  gargalhadas, claro, mas é fácil ver os sorrisos de surpresa. Essa era uma das propostas, porque essa loja tem um lado lúdico, de brincadeira de criança.

Ou seja, o luxo não precisa ser formal...

Pensamos em como fazer para que as cabanas das crianças ficassem sofisticadas e isso também dá uma ideia de aldeia. A escada, por exemplo, lembra um escorregador. O piso da loja é uma característica da  antiga piscina que ainda continua no ambiente. Nós pensamos que não existem mais clientes e sim visitantes desse espaço.

Qual é o desafio de se reformar lugares?

Sempre tento tirar um tempo antes de começar uma reforma para entender o local em que vamos trabalhar. Ver as vantagens e desvantagens da construção que já existe é importante. Eu gosto de trabalhar com a história dos prédios e tento enfatizar o que já existe. Por exemplo, fizemos um projeto de loja em um prédio que já existia. Enquanto pensava como aproveitar o espaço que tínhamos, percebi que se puséssemos vidros na parte  superior, ganharíamos luz natural na obra. O espaço ficou completamente diferente. Ainda é o mesmo, mas de repente, ficou cheio de luz.

A questão da luz tem a ver com sustentabilidade? Você busca o sustentável ou o belo?

Sim. Acho que nós precisamos viver com luz, de preferência luz natural. Quando você anda por uma loja de departamentos, por exemplo, você não sabe se é de manhã ou de noite, porque não existem janelas. É por isso que sempre trabalho com luz natural. Por outro lado, eu procuro fazer com que a luz artificial também faça parte do ambiente. Gosto de trabalhar com as sombras
porque onde há luz, há sombra e eu brinco com esses elementos em um projeto. A sustentabilidade é uma questão importante em nossos espaços e trabalhamos sempre com especialistas e consultores para essa questão, equilibrando e combinando o belo e o sustentável.

Moda e arquitetura são parecidas?

Existem algumas similaridades, mas eu acho que são diferentes. Eu busco o eterno, o discreto. Em meus projetos, procuro enfatizar produtos e o ambiente em que as pessoas vivem. Já o designer de moda precisa criar uma coleção nova a cada seis meses, é muito rápido. Eu quero fazer projetos que durem não somente seis meses ou um ano. E é por isso que eu tento não seguir as tendências, não estou interessado em arquitetura fashion porque sei que isso não vai durar.

Muitos estilistas começaram a investir no design de móveis e acessórios para casa. O que você pensa disso, já que você também cria objetos para casa?

Alguns são criativos e outros não são. Alguns podem ser estilistas fantásticos, mas não se saem tão bem como designers de móveis. É outro campo, completamente diferente, é preciso outro olhar. Como disse antes, eles estão acostumados a produzir rapidamente, a  cada seis meses, mostrar sempre peças novas. Para mim, criar esses produtos leva tempo e você não vai querer mudar toda a sua casa a cada seis meses, porque precisa escolher os objetos e planejar. Existem peças que ficam mais bonitas depois de cinco anos de uso, por exemplo. Crio para um ambiente. Os acessórios que penso e desenvolvo, quando são lançados, podem ser incorporados nas  coleções que já existem.

Quais são as suas fontes de inspiração?

Sou muito curioso, costumo abrir muitas portas (risos). Eu sempre acreditei nos meus instintos. Às vezes, fico querendo uma ideia e não consigo achar uma solução. O acúmulo de coisas que você já viu, algo que você leu em um livro, viu em uma exposição e lugares que visitou se combinam e você pensa de repente: “Acho que tenho uma ideia!”. Trabalho bastante com essa mistura de elementos. Normalmente, isso leva um tempo. Não acredito em gênios que dizem que acordam de manhã e pronto, já têm a solução dos problemas! Gosto de pensar bem nas minhas ideias, checar as possibilidades, voltar atrás.

Em algumas lojas da Hermès que a RDAI construiu existem características próprias de cada país. Na loja de São Paulo isso não parece ser tão visível. Mas quais elementos da nossa cultura você representaria?

Colocamos essas características específicas em lojas como a de Seul, que acompanha as tradições das casas coreanas, e a de Pequim, que tem elementos da cultura chinesa como a cor dourada, e é iluminada com uma luz laranja, típica da Hermès. Não consigo pensar em um projeto para o Brasil agora, porque teria de ser um mix de escolhas, além de precisar conhecer e estudar a cultura a fundo. Fizemos a loja da Hermès em São Paulo (no shopping Cidade Jardim) e é diferente quando você está em um local fechado, em que as lojas são uma ao lado da outra. Os espaços são muito limitados, você não pode comunicar nem construir espaços assim. É por isso que é muito mais inspirador construir, ou reformar, grandes espaços que as pessoas vão conhecer pelo endereço. Lojas de shopping não têm endereço próprio, é um só para várias marcas.

Qual o maior desafio que você já enfrentou ao longo da sua carreira?

Nós estamos trabalhando agora em um enorme projeto para a Hermès, um complexo com seis prédios, o Cité des Métiers, em Paris. É um espaço urbano, de arquitetura e de decoração. É um grande desafio porque estamos construindo há três anos e a maior dificuldade é manter a mesma qualidade até o final. É como se fosse uma cidade da marca. Como você vê a arquitetura francesa hoje em dia? O  clássico e neoclássico ainda predominam para representar o luxo? A arquitetura francesa tem essa característica do clássico, mas nós temos hoje muitos arquitetos contemporâneos e a geração nova está transformando esse conceito.

Quais dicas você daria para um arquiteto que está começando a carreira?

É uma pergunta bem difícil. Mas eu falaria para ele ser o mais curioso possível. É fácil fazer uma única escolha e seguir sempre nesse mesmo caminho. Entretanto, nem sempre a solução vai estar nessa direção. É fundamental manter os olhos abertos para tudo, sempre.