Uma pesquisa feita com 3 000 britânicos concluiu que os casais brigam por volta de 10 minutos por dia e em média 312 vezes por ano. Encomendado por uma empresa de vendas on-line, o estudo descobriu também que a maioria das brigas tem motivos banais, como entupir o ralo do chuveiro com cabelo, esquecer as luzes da casa ligadas e zapear a televisão.
Apesar de se referir ao Continente Europeu, o resultado se assemelha bastante ao que venho observando no dia a dia do consultório. Por isso já me perguntei muito: por que, afinal de contas, os casais brigam tanto por bobagens? Vejo dois motivos principais: primeiro, porque estão habituados a brigar e, segundo, porque os motivos banais não são as verdadeiras razões das brigas — e, como as causas reais ficam sem solução, as desavenças continuam. Vou analisar aqui apenas a primeira razão. Em outra oportunidade abordarei a segunda.
Brigar por hábito é um dos problemas mais frequentes entre os companheiros. A verdade é que algumas pessoas confundem intimidade com falta de educação. Comunicar queixas com clareza e calma, de modo sucinto, firme e objetivo faz parte das habilidades daqueles que têm preparo para a convivência afetiva e para as relações humanas. Essa habilidade se aprende no convívio familiar, nos momentos em que os pais comunicam suas queixas aos filhos ou quando os alertam para os erros cometidos.
Infelizmente, a maioria dos pais ignora a importância desses momentos e desperdiça oportunidades valiosíssimas para ensinar os filhos a negociar diferenças sem brigar. São mães ansiosas, que se habituam a falar sempre aos gritos com as crianças; pais que não têm calma para discutir alternativas com os filhos adolescentes; casais sem firmeza e coerência que toleram os erros dos filhos até não aguentar mais e explodir de raiva por alguma bobagem; pais que, diante dos filhos, se dirigem aos empregados de maneira arrogante; casais que brigam
por picuinhas na frente da família. Todos exemplos de uma educação que “deseduca”, que gera adultos habituados a resolver diferenças fazendo “barraco”. E gente “barraqueira” briga tão-somente para ter razão, por nada mais. Não aprendeu o meio-termo. Acha que só existem dois lados de uma questão: o seu e o do outro. Esse aprendizado “torto” é levado para o casamento. Quando desaparece a vontade inicial de “fazer bonito” e o casal se permite agir com “intimidade”, isto é, sem se preocupar com o conceito que um tem do outro, cai a máscara e o barraqueiro acaba aparecendo. Se ambos estão acostumados a se deixar levar pelas intempéries emocionais, as brigas serão tão frequentes que se tornarão a forma habitual de o casal se relacionar. Não importa o motivo, naturalmente, precisam brigar para “confirmar” o vínculo.
Essa cumplicidade contribui para a falta de respeito mútua e o desencanto com o relacionamento amoroso. Aos poucos, ambos os parceiros deixam de se intimidar com alterações de voz ou ameaças e passam a banalizar os impropérios. Para surtir efeito, as agressões vão se tornando cada vez mais intensas, desgastando tanto as pessoas quanto o relacionamento.
Infelizmente, o ser humano se adapta a tudo e alguns casais vivem durante anos nesse clima de tensão. Para eles, a discórdia é um hábito. Brigam na frente dos outros, sem se preocupar com a própria exposição nem com o constrangimento de quem assiste. E, mesmo quando querem, têm dificuldade para mudar esse (mau) hábito.