As crises nem sempre são ruins e podem até fortalecer a relação
Nahman Armony Publicado em 23/03/2007, às 15h11
Toda relação passa por períodos de tensão. Muitos namoros que começam em mar de almirante depois de algum tempo enfrentam tempestades e balançam entre o naufrágio e a salvação. Esses períodos de tormenta são praticamente inevitáveis, mas a consciência de que podem ajudar no amadurecimento da relação ajuda os parceiros a enfrentá-los.
As borrascas ocorrem porque cada um tem a sua peculiar estrutura psíquica, fatalmente diferente da do parceiro. E só aos poucos, dependendo das situações vividas pelo par, as várias facetas da personalidade de cada um se fazem presentes. A cada vez que se confrontam diferenças inéditas, afloram emoções intensas, atirando o casal num redemoinho de acusações, contra-acusações, culpas e desvalorizações. Um caos. Quando as tensões amainam, voltam a preponderar os sentimentos afetuosos. Se o par não percebe de onde surgiram os mal-entendidos, pode se depositar no fundo de seu psiquismo um ranço negativo que, acumulado com sobras de outras brigas, torna problemática a convivência amorosa e confiante. Já uma compreensão das motivações do desentendimento faz o casal mergulhar em regiões ainda não visitadas nas quais pode se deparar com preconceitos e suscetibilidades até então não percebidas ou mal percebidas. Cada um poderá, então, agradecer ao parceiro pela chance de ampliar a percepção de si e do outro e pelo conseqüente
aumento do sentimento de união criativa.
Dou um exemplo. Um casal está saindo daquele período inicial em que um sempre procura agradar o outro e combina que ambos serão sinceros quanto aos seus próprios desejos e sentimentos. Esse casal acerta um fim de semana a dois e de repente a mãe do marido exige, implora que ele vá vê-la. Fiel à prévia e madura combinação a esposa diz que, embora contrariada, desistirá do programa íntimo e o acompanhará à casa da mãe. O parceiro sente sua fala como uma desconsideração com a mãe e reage com um profundo desagrado que se expressa em sua mímica corporal. A companheira, chocada com o que ela considera uma falta de reconhecimento de seu esforço para tornar a relação mais madura e uma traição ao acordo, reage atacando o companheiro, que, por sua vez, contra-ataca, daí surgindo uma altercação. Podemos especular que a intensa reação emocional se deva a questões psicológicas prévias, como necessidade de reconhecimento, sentimentos de rejeição, dependência excessiva dos pais, ou qualquer outra coisa. Se o rapaz percebesse o esforço da companheira em ser madura e se esta percebesse que a reação dele estava referida não a ela, mas à sua inconsciente dependência dos pais, o episódio teria um outro desenrolar. Como, porém, pela primeira vez núcleos inconscientes foram mobilizados pela relação seria irreal pedir ao casal um comportamento sensato. O conflito é inevitável. Só depois de os sentimentos se expressarem se torna possível um exame ponderado.
Outra situação hipotética. Ela está gripada e pertence a uma família cujos princípios incluem a idéia de cura pelo repouso. Já os princípios da família dele preconizam que a pessoa se cura enfrentando a gripe e continuando as suas atividades. Ele a convida para jantar e ela recusa o convite, em função de seu estado de saúde. Imerso nos princípios de sua família, ele se sente rejeitado e reage com raiva. Ela, imersa na própria cultura familiar, não entende a raiva do parceiro e conclui que ele não se preocupa com a sua saúde. Arma-se o conflito. Explicitam-se conteúdos inconscientes. Passada a tempestade e se estabelecendo um diálogo amoroso, o casal pode vir a entender a subjetividade do outro. Desfazem-se as confusões, aprofundando-se o conhecimento de si, do parceiro e da dupla. Casais que souberem atravessar essas crises de equívocos, esclarecendo-os, se tornarão muito mais maduros e unidos.
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