Casal ioiô não consegue viver junto nem separado. Fica no vaivém
por Paulo Sternick* Publicado em 29/10/2010, às 18h41 - Atualizado às 21h08
Brinquedo conhecido há mais de 2500 anos, o ioiô perdeu espaço para os jogos tecnológicos. Mesmo assim - que paradoxo! - emprestou seu nome a um estilo de namoro, e de casamento, cada vez mais frequente nos complexos tempos atuais.
É fato que ao longo da história quase nenhum casal se livrou, pelo menos uma vez na vida, de um momento ioiô, um começar, terminar e começar de novo, fruto da natural instabilidade dos sentimentos e desejos, hesitação que não raro precede a decisão de assumir a relação ou terminá-la de vez. Normal. Já os relacionamentos ioiô caracterizam-se por um sem-fim dessas idas e vindas, resultando em uniões hesitantes e conflituosas.
Às vezes, é um dos parceiros quem brinca de ioiô, o outro fica à mercê de sua instabilidade, sofrendo anos a fio - é de perguntar se também não tem inadvertida, porém passiva, aversão a relações constantes. Ocorre também de os dois se alternarem no processo de terminar e voltar - lembrando a música dos Beatles, Hello Goodbye: "Você diz sim, eu digo não, você diz pare, eu digo vamos, você diz adeus, e eu digo olá, eu não sei por que você diz adeus, eu digo olá". E acontece, ainda, de o casal brincar junto de ioiô, numa harmonia que evoca a lógica do porco-espinho: quando se distanciam, sentem frio e se procuram; quando se reaproximam, se espetam e se repelem.
Curioso - e irônico - é que nas Filipinas, onde o ioiô (o brinquedo!) é muito popular, a palavra que o denomina quer dizer volte aqui. A tradução vale também para a união ioiô: ela prende os parceiros na trama do vá embora! e do volte aqui! , numa instabilidade que revela a intolerância, a dificuldade de suportar as diferenças, o paradoxo do amor e do ódio, do querer e do não querer, de se resignar com o bom, o mau e o feio das relações.
Para casais assim, viver perto é tão difícil quanto viver longe um do outro. Eles se separam e acabam reatando, muitas vezes após tentar relações com pessoas idealizadas - e que logo viram sapos.
Os parceiros enredam-se nos ioiôs por motivos que só uma terapia pode elucidar. Mas Sigmund Freud (1856-1939), o criador da Psicanálise, dá umas dicas. Ele relata a observação de uma criança que jogava para fora de sua visão um carretel preso por uma cordinha e depois o puxava de volta, com exclamações de felicidade. Freud atribuiu uma significação a esse jogo: a de que o menino, de forma lúdica, passava a ter o controle fantasioso do sumiço e do retorno de sua mãe. Assim, defendia-se de ficar sujeito à perda e à solidão.
Como já foi dito, toda relação, mesmo as mais constantes, têm seu lado ioiô, mas na maioria dos casos a alternância se dá no interior da própria união. Ninguém está livre dos altos e baixos da paixão e dos afetos. Toda relação estável é instável nas emoções e nos estados mentais dos envolvidos, pois as pessoas não são inertes em seu mundo subjetivo, mas movimentam-se num amplo espectro de sentimentos e impressões. Os mais equilibrados são capazes de aderir melhor a um sentimento de identidade. Isso favorece constância no amor, pois o êxito de uma relação depende de os parceiros serem previamente "casados consigo mesmos", ou seja, de saberem definir o que querem, ou de quem gostam, ou até se são correspondidos.
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