Sim, eu assino - Com tantos detalhes para pensar antes do casamento, a parte burocrática acaba ficando em segundo plano. Mas não deveria, já que alguns cuidados evitam futuros problemas
Estar casado é dividir os planos, as despesas e a casa. É conviver intensamente dia após dia e pensar num futuro em comum que ainda pode incluir filhos, casa própria, conta bancária conjunta e até plano de saúde familiar. Com ou sem formalidades, assinar um documento legal pode tornar essa convivência - ou o fim dela (porque, sejamos realistas, perante a lei o que o homem uniu, ele também pode separar) - mais fácil. Por isso, reunimos as perguntas mais comuns de casais que pretendem se casar ou já moram juntos e querem saber os seus direitos. Mas a nossa torcida é que a parte da separação de bens não seja nunca necessária.
Qual é a diferença entre casamento civil e união estável?
Ambas são formas de estruturação familiar conforme a Constituição Brasileira e tanto uma como outra estabelecem a comunhão plena de vida com base na igualdade de direitos e deveres das partes. "Embora, na prática, algumas vezes em muito se assemelhem, casamento é uma coisa e união estável é outra", diz a advogada Priscila da Fonseca. "O casamento é um ato formal e solene, que exige o preenchimento de uma série de requisitos para sua constituição, como, por exemplo, um processo de habilitação prévia dos noivos, publicação de proclamas, dentre outros”, explica. “A união estável, por sua vez, é um instituto estritamente de fato, que, ao contrário do casamento, prescinde de qualquer formalidade para ser constituída, bastando, portanto, a manutenção de vida em comum”, completa. Esta união pode ou não ser regulamentada por um contrato, o qual é conhecido como contrato de união estável.
Para Luiz Kignel, advogado do Pompeu, Longo, Kignel e Cipullo, muitos casais simplesmente não querem as formalidades do casamento civil e optam pela união estável, mas, ainda assim, devem assinar um “pacto de conviventes” para regular seus direitos e obrigações. É importante que fique claro que o contrato não é essencial para a constituição da união estável, já que trata-se de instituto que não exige quaisquer formalidades ou atos solenes. O contrato, portanto, não é uma forma de constituição da união estável, mas sim um instrumento utilizado para regulamentar os efeitos dessa união – principalmente aqueles de caráter patrimonial –, e comprovar a sua existência perante terceiros. Como terceiros, entende-se, por exemplo, bancos e planos de saúde. “É uma decisão de caráter pessoal”, diz Kignel. Para o casamento civil, as partes devem ser obrigatoriamente solteiras, divorciadas ou viúvas. Os separados judicialmente não podem se casar, mas podem manter união estável. Outra diferença é que o casamento civil acontece no registro civil, que exige endereço, e o contrato de união estável pode ser lavrado em qualquer cartório de notas.
O que se estabelece no contrato de união estável e no casamento civil?
Segundo o advogado Luiz Kignel, são obrigações inerentes ao casal a fidelidade recíproca, a vida em comum, no domicílio conjugal (apenas para os casados, não para os companheiros em união estável que podem residir em domicílios distintos), a mútua assistência, o sustento, a guarda e a educação dos filhos, o respeito e a consideração mútuos. O casamento e a união estável também definem o regime de bens que regulamentará as relações jurídicas referentes aos bens pertencentes ao casal. “A escolha do regime patrimonial pode ser feita tanto no casamento civil como na união estável. E quando o casal não elege um regime específico, a regra geral é a da comunhão parcial de bens”, diz Kignel. “Regras específicas da relação do casal são tratadas no pacto antenupcial”, completa.
É possível trocar de regime depois do casamento ou da união estável?
Sim. “O novo Código Civil permite a modificação do regime de bens do casal, desde que feito o pedido de maneira conjunta, justificada a motivação e sem que isso signifique fraude a credores. Caberá ao juiz analisar cada situação concreta”, diz Kignel. Na separação obrigatória, quando uma das partes atinge a maioridade ou quando as “causas suspensivas”, como a partilha dos bens de alguém divorciado, são finalizadas, é possível pedir autorização para trocar de regime.
Para planos de saúde, vistos e financiamentos, existe diferença entre contrato de união estável e casamento civil?
Ambas as entidades familiares – casamento civil e união estável – são reconhecidas pelo Direito e protegidas pelo Estado. “Para as finalidades acima descritas – todas corriqueiras do nosso dia a dia –, não vejo diferença entre ser casado ou viver em união estável, sendo certo que, nessa segunda hipótese, pode ser requerido o contrato escrito a fim de atestar a terceiros a convivência”, afirma Priscila.
Como comprovar a união estável?
A união estável é, nos termos da lei, a convivência pública, contínua e duradoura entre duas pessoas, inclusive do mesmo sexo, marcada pelo objetivo de constituição de família. Trata-se, por certo, de um conceito bastante amplo. Por isso, provar uma união, muitas vezes, se torna uma tarefa difícil. Afinal, é tênue a linha que separa o namoro sério da união estável. Daí porque o contrato de união estável se mostra um instrumento de segurança. Exatamente para se evitar essa dúvida se o casal está ou não em união estável, ou apenas namorando, que a recomendação é sempre pela formalização. No caso, por exemplo, do plano de saúde, uma simples conta de telefone diz apenas que duas pessoas vivem na mesma casa, mas não prova que elas são um casal. É por isso que a empresa pode solicitar o contrato. Não existe mais prazo mínimo para união estável (a regra antiga, que falava em cinco anos de conconvivência, já foi revogada). A lei, inclusive, não exige o convívio sob o mesmo teto ou a existência de filhos comuns como fatores determinantes ao reconhecimento dessa união. “Em caso de disputas judiciais, a solução do impasse dependerá da análise de provas, como fotos, declarações, contas-correntes conjuntas, dependência em clubes, planos de saúde e testemunhas”, diz Priscila. O mais importante é que os partícipes do relacionamento se comportem e sejam socialmente vistos e reconhecidos como se fossem casados. Há namorados que mantêm por anos uma relação apenas de namoro e há casais que estão há poucos meses juntos e já podem ser considerados companheiros. Namorados, ou companheiros, são vistos como tal perante a sociedade em que convivem. “Se os amigos, parentes, colegas de trabalho vêem um casal como se fossem marido e mulher, é porque eles não estão mais namorando”, conclui Kignel.
Em relação aos filhos, faz alguma diferença ter sido casada ou ter assinado um contrato de união estável?
Para os filhos não há diferença alguma se os pais são casados ou estão em união estável. Mesmo o filho fruto de uma relação passageira não tem qualquer limitação no direito de pleitear pensão alimentícia ou guarda.
O que são o contrato de convivência e o pacto antenupcial?
O contrato de convivência é o chamado contrato de união estável. Já o pacto antenupcial é o contrato firmado pelos cônjuges para, dentre outras coisas, mas principalmente, definir o regime de bens que vigorará durante o casamento. Embora o Código Civil preveja quatro tipos preestabelecidos e conceituados de regimes de bens, o casal pode escolher livremente as regras que irão reger as questões patrimoniais do casamento no pacto antenupcial. Algumas pessoas estabelecem regras e cláusulas diferenciadas e às vezes nada convencionais, como a “gratificação pelo tempo de relacionamento”. Também é possível regular questões patrimoniais específicas, como adotar o regime da separação total de bens, mas eleger como patrimônio comum o imóvel residencial do casal, ou ainda determinar tratamento especial para os bônus profissionais de um dos cônjuges. Mas o pacto só terá eficácia se for sucedido pelo casamento. Se as partes não se unirem em matrimônio posteriormente, o pacto antenupcial não terá nenhum valor legal.
No caso de heranças, o que acontece em cada um dos regimes?
A herança do cônjuge em cada um dos regimes é uma questão complexa, que depende de diversos fatores, e deve ser analisada caso a caso. “O maior desafio trazido pelo novo Código Civil está na modificação das regras sucessórias”, diz Kignel. “Isso porque o cônjuge sobrevivente se tornou ‘herdeiro necessário’ mesmo quando casado pelo regime da separação total de bens”, completa. A exceção está no regime da separação obrigatória, onde o cônjuge sobrevivente não é herdeiro necessário. “Essa inovação tem causado muita polêmica, porque enquanto casados e havendo divórcio, não há partilha; todavia, aberta a sucessão com o falecimento, o cônjuge que não teria qualquer direito patrimonial passa a ser herdeiro necessário e não pode ser excluído da herança”, diz o advogado. “Não existe uma única ferramenta jurídica para organizar as regras sucessórias”, avalia Kignel. Basicamente, se consideram, além de um pacto antenupcial bem escrito, a lavratura de um testamento que poderá diminuir a interferência patrimonial de agregados. “Além disso, conforme cada caso concreto, estruturas societárias podem ser montadas para proteger o patrimônio familiar”, completa o advogado. “Uma saída bastante utilizada para tentar ao menos minimizar essa indesejada confusão patrimonial é gravar os bens que serão transmitidos aos filhos com cláusulas de incomunicabilidade”, acrescenta Priscila.
Os tipos de regimes de bens
-Comunhão universal ou total
Significa a comunhão de todos os bens do casal, inclusive os já existentes antes da união. Serão comuns do casal, inclusive, doações e heranças recebidas apenas por uma das partes, antes ou depois do casamento.
-Comunhão parcial
Também conhecido por Regime Legal, pois vigora no silêncio dos contraentes. Determina que os bens existentes antes do casamento não se comunicam entre as partes e os bens adquiridos a título oneroso, ou seja, por compra, após o casamento passam a ser comuns, independentemente de quem tenha vindo os recursos financeiros. Os bens já existentes à época da celebração do matrimônio e aqueles recebidos por causa alheia ao casamento, ou seja, por doação ou herança, estão fora da comunhão parcial.
-Separação total
Todos os bens existentes antes e durante o casamento não se comunicam, independentemente se adquiridos a título gratuito ou oneroso. “Igualmente, as dívidas permanecem sob total responsabilidade daquele que as contraiu”, completa Priscila. No divórcio deste casal não há partilha porque não há patrimônio comum, subsistem com inteira independência dois patrimônios: o do marido e o da mulher. Mas no caso de viuvez, o cônjuge é o herdeiro necessário.
-Separação obrigatória
Como o próprio nome diz, esse regime não é escolhido pelo casal, mas imposto pela lei. Assim, a separação obrigatória ocorre, por exemplo, quando uma das partes, ao iniciar a relação, tem mais do que 70 anos de idade ou quando ainda for menor de 18. “Também devem casar com separação obrigatória de bens o divorciado, enquanto a partilha de bens do antigo casamento não for finalizada, e os viúvos que tiverem filhos do cônjuge falecido, enquanto não fizerem o inventário dos bens deixados pelo morto”, acrescenta Priscila. Neste regime, tal qual na separação total, não há qualquer comunicação entre os bens.
-Participação final nos aquestos
“Esse regime foi introduzido no Direito Brasileiro pelo Código Civil de 2002 e é, sem dúvida alguma, o regime mais desconhecido da população”, diz Priscila. “Trata-se, podese dizer, de um regime misto, pois durante o casamento observa as normas do regime da separação total de bens – ou seja, cada cônjuge possui um patrimônio próprio e distinto –, e, na dissolução do enlace, são aplicadas as regras da comunhão parcial de bens, pois cada cônjuge terá direito à metade dos bens adquiridos pelo casal a título oneroso durante a união matrimonial”, completa.
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