Um vestido de 30 cm com uma estampa meiga, uma minibermuda cargo xadrez superdescolada, um trench coat estiloso em miniatura, um tênis colorido que cabe na palma da mão. Quase impossível resistir às roupinhas de criança! Até mesmo quem não tem lho se encanta. E o mercado da moda, nacional e internacional, já percebeu isso e resolveu se divertir (e lucrar) com o universo infantil. O principal objetivo, além de aumentar as vendas, é criar uma relação de delidade fashion enquanto os futuros clientes ainda usam fraldas! Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (ABIT), Aguinaldo Diniz Filho, esse movimento ocorre em todo o mundo. “Estilistas de renome, que investiram durante anos para construir suas grifes, buscam um modo de ampliar seu público. A solução mais óbvia é conquistar os filhos dos clientes fiéis”, resume.
Fora do Brasil, enquanto o mercado de luxo ainda se recuperava da crise econômica, grandes marcas se deram conta de que as pequeninas, mas encantadoras peças de roupa poderiam ser um negócio promissor. A nal, se não é toda temporada que se lança uma bolsa ou acessório que é objeto de desejo, com as coleções infantis se conquistam novos consumidores.
Grifes como Burberry, Armani e Stella McCartney já atuavam nesse segmento, mas o entusiasmo do mundo da moda pelas roupas de criança ganhou força em 2011. A Gucci criou uma linha completa para bebês e crianças de 2 a 8 anos com preços que variam de US$50 a US$3.550. E em junho, durante os desfiles da coleção Resort, a maison francesa Lanvin apresentou 25 peças destinadas a meninas de 4 a 10 anos. Inspirado nas criações infantis da própria Jeanne Lanvin ainda no começo do século 20, Alber Elbaz diminuiu a escala de suas assinaturas e deu vida à Lanvin Petite.
Donatella Versace também ampliou os domínios da marca italiana e lançou, nesse mesmo mês de junho, no Palazzo Corsini, em Florença, a Young Versace. “Somos conhecidos por nossa estética mais rock 'n' roll, que pode ser ousada, mas não necessariamente sexy ou inapropriada”, disse a estilista no lançamento. Na prática, isso significa vestidinhos de um ombro só para meninas e camisetas com estampas de
moicanos mirins para os meninos. Segundo o CEO da marca, Gian Giacomo Ferraris, a expectativa é de que a linha infantil represente 10% das vendas da companhia em cinco anos.
No Brasil, o mercado da moda infantil também está aquecido. De acordo com pesquisas do Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI), a produção de vestuário para bebês e crianças cresceu, em número de peças, 55%. E em valores nominais, 98%. Em 2011, o faturamento desse setor, que hoje representa 24% de toda a produção de vestuário no Brasil, deverá chegar a R$ 22 bilhões com uma produção de 1,7 milhão
de peças. “Nesse período, todos os segmentos de roupa cresceram, e cresceram bem, porque houve uma melhor distribuição da renda”, afirma Marcelo Prado, diretor do IEMI. Portanto, no Brasil, o boom da moda infantil tem uma origem diferente de países da Europa e Estados Unidos. Se lá foi a crise que criou um novo mercado, aqui foi a estabilidade econômica.
Desde a década de 1990, com a introdução do Plano Real, há mais dinheiro para fazer compras. E roupa é um gênero de “primeira necessidade”. Segundo Prado, pesquisas de comportamento de compra revelam que 92% das pessoas querem estar bem vestidas. Dessas 44% são antenadas com moda e gostam de ter o que é novo. Os outros 48% querem sim estar alinhados, mas não se incomodam em usar peças de coleções
passadas. Como a roupa tem uma força de identidade visual imensa, a melhora da renda se revela por meio dela e deixa transparecer a ascensão social daquele indivíduo. Mas por que, apesar da diminuição
da taxa de fecundidade brasileira, o segmento infantil aumentou tanto? “Porque quando se tem mais renda, você se realiza comprando, inclusive marcas famosas para crianças”, diz Prado. Além disso, as mães estão tendo lhos cada mais velhas, com uma carreira mais segura e um salário maior.
No Brasil, são cerca de 50 milhões de brasileiros de 0 a 14 anos. Todos vestidos. As grandes marcas de malha, como Hering e Malwee, foram as primeiras a enxergar esse potencial. Depois, vieram marcas elitizadas e exclusivas para crianças, como Green, Tyrol e Paola da Vinci. Mas, num determinado momento, grifes de adulto se deram conta de que o mercado infantil ainda era menos concorrido e vendia bem. Daí, vieram Cris Barros Mini, VR Kids, Miss Petite, Maria Bonitinha, Mixed Kids, Fit Nina, Reserva Mini e uma in nidade de versões kids, minis e petites. Apesar de se espelharem em linhas de gente grande e usarem o mesmo maquinário, as coleções infantis são complexas porque a modelagem, a numeração e o estilo evoluem com a idade. Do tamanho 2 para o 10 não mudam apenas a largura e o comprimento, mas as atividades e as vontades das crianças.
Um dos pioneiros dessa onda foi Ronaldo Fraga, que em 2001, enquanto esperava seu primeiro filho, Ludovico, cansou-se da mesmice do que encontrava nas lojas especializadas e resolveu brincar de desenhar roupas para o menino. “Eu achava que as roupinhas eram muito contidas em cor e estampas”, conta o estilista. “Sempre acreditei que a roupa infantil tem que conversar com a cultura brasileira, mas naquela época tudo era escrito em inglês!”, lembra. Foi assim, sem pretensões comerciais, que nasceu a Ronaldo Fraga para Filhotes, com um universo gráfico mais afetuoso e referências regionais. Daí os amigos fizeram encomendas, a mídia noticiou e a coisa cou séria. Hoje, as coleções para crianças de 0 a 10 anos representam 60% das vendas da marca e são vendidas em 200 pontos em todo o país. Até hoje, os lhos de Fraga são suas "cobaias" e consultores. Na primeira metade de 2012, a Filhotes deve começar a caminhar com as próprias pernas, sem o nome do criador.
Mas, para muita gente, a tentação de ver o filho como uma extensão de si é quase natural. Não à toa, logo depois do nascimento, os pais já começam a se enxergar no bebê: nariz da mãe, boca do pai e olhos da vovó.
E os pequenos também se espelham nos mais velhos. Andam pela casa com os sapatos do pai, pegam escondido a maquiagem da mãe. “Mas vesti-los igual aos pais pode encobrir a personalidade da própria criança a partir do momento em que ela se sente na obrigação de ter as mesmas características da mãe”, explica Joana Singer, psicóloga clínica do núcleo Paradigma. Como a individualidade se forma a partir das escolhas,
é importante levar em consideração a opinião da criança.
“Sempre acreditei que a roupa infantil tem que conversar com a cultura brasileira” Ronaldo Fraga, estilista
A moda é parte da formação cultural e “veste” cada fase da vida. Nossa imagem passa uma mensagem. Durante a infância, é preciso brincar e transmitir a ideia que, de fato, se é uma criança. Há alguma coisa errada quando a roupa sugere “algo mais” ou não permite que se brinque como poderia. Crianças precisam poder correr, pular e sentar no chão. Pensando assim, a Corello montou uma equipe especializada para lançar, no começo de 2010, a Miss Petite. As cores, a propaganda, a embalagem, tudo é mais leve e romântico. E sem salto. “As rasteirinhas e sapatilhas não são apenas menores, são mais flexíveis e molinhas, porque o pé
das crianças é mais sensível”, diz Carla Silvarolli, diretora de estilo da marca.
Essa experiência com crianças pode ser muito divertida para os pais e, para as marcas, um ótimo negócio. Porém, ela está longe de ser simples e não é garantia de sucesso. Quem investe em “miniaturização”
não se sustenta, porque os pequenos crescem e não se submetem ao estilo dos pais para sempre. “A partir do momento que a criança passa a não depender tanto dos adultos, toma mais iniciativa na escolha das roupas e exige o que quer usar”, afirma Diniz Filho, presidente da ABIT. Como diz Ronaldo Fraga, não são as crianças que devem desejar o que os pais têm. Mas sim o contrário. É hora das mães cobiçarem o guardaroupa das filhas! Talvez as peças quem um pouco apertadas, mas até nesses casos, o limite é a imaginação. E ser, ou brincar de ser criança, é sempre bom.
“Você se realiza comprando, inclusive, marcas famosas para crianças” Marcelo Prado, diretor do IEMI
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