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BEBÊ: Família de coração - Histórias de adoção no Brasil

Aos poucos, com a mudança de comportamento da sociedade e o fim de certos mitos, a adoção ganha uma nova cara e transforma a família brasileira

Camila Carvas Publicado em 31/08/2012, às 10h28

“Observamos no dia a dia que as exigências de quem adota estão diminuindo e, assim, mais crianças estão tendo acesso a uma família” - Nicolau Lupianhes, juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça - Getty Images

Há mais de uma década, sete meninas de um orfanato paulista ganharam novas famílias. Com idades entre 2 e 6 anos, seis delas se mudaram para a Itália, a França e a Suécia. Uma voltou a morar com o pai no interior do Piauí. Todas receberam uma segunda chance e deixaram histórias emocionantes. Às vésperas de conhecer o casal francês que a adotaria, por exemplo, uma das garotas sonhou que sua mãe chegava para buscá-la de saia verde. E qual não foi a surpresa de quem viu uma senhora sorridente, gordinha e de saia verde entrar pela porta.

Andrea Fasciolo ainda fica comovida quando relembra sua história. Ela e o marido, ambos argentinos, vieram para o Brasil a trabalho e, depois de cinco anos tentando engravidar, o casal resolveu encarar seus próprios medos e se aproximar da ideia de adotar uma criança. E eles acabaram fazendo uma chamada adoção especial. Tardia, inter-racial e de irmãos. Três irmãos, um casal de gêmeos de 3 anos e um menino de 4. Andrea se emociona e se arrepia quando lembra da menininha perguntando, lá em 2007, durante o estágio de convivência, se ela seria sua mãe. Hoje, a garotinha reservada e tímida aguarda a chegada de mais um irmão. Andrea está grávida e ouve com carinho as recomendações da pequena que diz que ela precisa tomar leite e descansar. A família inteira, que mora na Suíça, espera o nascimento do bebê.

Casos como esses são interessantes porque desconstroem alguns preconceitos que ainda existem em relação à adoção. Apesar de ser antiga e já existir no Direito Romano – o general Júlio Cesar adotou Otávio Augusto e fez dele seu herdeiro sucessor – ainda hoje, a prática é cercada por mitos. “Um dos maiores é de que o verdadeiro afeto só surge com os laços sanguíneos”, diz Walter Gomes, supervisor da Seção de Colocação em Família Substituta da 1ª Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal. “Mas o afeto vem da convivência, o amor é o cimento da parentalidade, e isso não tem a ver com sangue”, completa. “Costumamos dizer que inclusive os pais biológicos devem adotar seus filhos naturais no sentido de se entregar completamente.” A adoção precisa ser percebida como uma demonstração de amor irrestrito e, por isso, hoje, o “pacto do silêncio” não é recomendado. É essa transparência que está ajudando a mudar a cara da adoção no país.

Adotar vem do latim adoptare e significa receber, aceitar, desejar, assumir. Quando o assunto é adoção de crianças e adolescentes, significa também uma entrega integral e a garantia ao direito da vida em família para muitos menores. “As famílias e as motivações mudaram muito nesses últimos 15 anos”, diz Mônica Natale, do Grupo de Apoio à Adoção de São Paulo (GAASP). “Antes só se adotavam bebês e hoje há muito mais adoções inter-raciais e tardias de crianças a partir de dois anos”, explica. E conforme essa nova cultura se forma, o tema aparece nas revistas e na TV, as celebridades adotam, a adoção vai saindo da marginalidade. 

Parte dessa transformação veio com a nova lei de adoção de 2009. Antes, só casais podiam adotar. Atualmente, todo adulto maior de 18 anos, que seja pelo menos 16 anos mais velho que o adotando, e tenha essa vontade, pode. Casais héteros ou homoafetivos, homens e mulheres solteiros, com ou sem filhos biológicos, todos podem adotar. Por meio de inúmeras entrevistas, o juiz procura econtrar os melhores pais para uma criança e não o inverso. A obrigatoriedade do curso preparatório também faz diferença, porque tira dúvidas, desfaz mitos e preconceitos e traz testemunhos de famílias reais que sensibilizam e esclarecem os pretendentes, fazendo com que eles reflitam acerca de suas próprias pretensões. “Quanto mais a pessoa se abre ao acolhimento incondicional, menos restrições ela faz”, diz Walter.

Ao se deparar com a realidade do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), criado em 2008, os candidatos à adoção percebem que a grande maioria das crianças que podem ser adotadas não são meninas, brancas, bebês e sem irmãos. “Infelizmente, antes da criação do cadastro não existia uma fonte segura com a quantidade de pretendentes à adoção e crianças e adolescentes aptos”, diz Nicolau Lupianhes, juiz auxiliar da corregedoria Nacional de Justiça. “Porém, observamos no dia a dia que as exigências de quem adota estão diminuindo e, assim, mais crianças estão tendo acesso a uma família”, completa.

Em junho de 2012, o CNA mostrava 5.303 crianças e adolescentes ainda à espera de adoção e um número de pretendentes cinco vezes maior, totalizando 28.128 inscritos em todo o país. A diferença é grande, justamente, por causa do perfil exigido por quem pretende adotar. “Hoje, o principal fator de restrição é a idade das crianças”, afirma lupianhes. “Para se ter uma ideia, dos pretendentes cadastrados, quase 60% aceitam adotar somente crianças até dois anos; 75% aceitam somente até três anos e quase 90% aceitam só até quatro anos”. Mas das crianças cadastradas, apenas 158 têm até dois anos, 250 até três anos e 351 até quatro anos.

Esse descompasso faz com que, muitas vezes, a espera seja longa. Mas os mais flexíveis encurtam bastante o processo. Maria Helena da Silva fugiu dos “padrões” e, há cinco anos, no mesmo mês em que recebeu a habilitação para a adoção, atendeu o telefonema que dizia que haviam encontrado seu filho. Alessandro é negro e, na época, tinha quase 8 anos. Ela e o marido vinham de outros relacionamentos, já tinham dois filhos, de 19 e 4 anos, e compartilhavam a ideia de adotar. “Meu filho Gabriel era criado quase como filho único e não queríamos isso”, conta. Segundo Maria Helena, Gabriel e Alessandro são os verdadeiros protagonistas dessa história e responsáveis pelo sucesso da adoção. “Desde o início, aceitaram-se como irmãos e construíram um vínculo de amor tão forte que não pode ser comparado a uma questão de sangue”, diz.

Mas muita gente acredita que a adaptação das crianças mais velhas é difícil, porque elas já têm personalidade formada. As experiências de Maria Helena e Andrea mostram que essa questão é discutível. “É só pensarmos no quanto nós mesmos mudamos nos últimos 10 anos”, diz Maria Helena. “Adaptamos-nos facilmente”, explica. Claro que a mudança de realidade não é simples. Assim como não é fácil para uma mãe de primeira viagem lidar com as noites em claro e os cuidados com um bebê. Qualquer criança, biológica ou adotada, exige adaptações. “Foi pesado, porque eles tinham muita energia”, lembra Andrea. Mas o importante, em qualquer caso, é desejar. “As crianças te testam, no começam diziam ‘você não é minha mãe’”, conta Andrea. “Mas nós dizíamos ‘não, eu sou sua mãe sim e você tem que me obedecer’, isso só oferece segurança”, completa. “Eu tinha uma lista de medos, mas quase nenhum se concretizou”, conta.

Entre os candidatos a pais adotivos, nenhuma condição oferece prioridade. A ordem cronológica no Cadastro e os interesses das crianças e adolescentes é que são observados. Foi por isso que tanto Maria Helena quanto Andrea rapidamente encontraram seus filhos de coração. E, ao recebê-los, elas adotaram também um passado e possíveis feridas. Alessandro mantém contato direto com a irmã biológica mais nova, que precisava de cuidados especiais e foi adotada por outra família. O trio de brasileirinhos de Andrea sabe da adoção e, mesmo estudando em inglês e alemão, faz aulas de português para não perder as raízes. “É preciso respeitar essa história, ouvir, acolher”, diz Andrea. “O amor é diferente, porque cada filho é de um jeito, mas não posso negar que tenho uma profunda admiração pelo adotado, porque ele tem uma força incrível, resistiu a muita coisa e está inteiro, feliz e sorridente”, completa Maria Helena. Para quem acredita que ser pai ou mãe é mais do que acompanhar o crescimento da barriga, a adoção é a certeza de realizar os sonhos de quem adota e de quem é adotado. 

Pensando em adotar?

Quem deseja adotar uma criança deve procurar a Vara da Infância e da Juventude (VIJ) da sua região. Nos municípios onde não há VIJs, os interessados devem procurar o Fórum da sua comarca para iniciar o processo de habilitação, que costuma demorar cerca de seis meses. Não é preciso ter advogado, apenas vontade e, talvez, um pouco de paciência. O candidato deve entregar uma série de documentos, como certidão de comprovantes de residência e renda, e o “nada consta” criminal. Depois, abre-se um processo e inicia-se um curso de preparação psicossocial e jurídico obrigatório. Após um estudo feito por uma equipe técnica multidisciplinar, observa-se se os pretendentes têm o perfil da família adotiva, sobretudo se são afetivos e se oferecem um ambiente acolhedor que garanta o equilíbrio e a segurança dos adotados. O promotor de justiça, então, aprova a entrada do candidato no cadastro local e nacional de adoção. A partir daí, o tempo de espera está indissociavelmente ligado ao perfil do candidato em relação à criança acolhida. Por fim, depois de encontrada a combinação perfeita, pais e filhos passam por um estágio de convivência, ambos os lados são ouvidos e é dada a liberação definitiva para viverem juntos. Um acompanhamento pós-adoção completa o ciclo. Nesse momento, a criança se torna um filho, com novo registro de nascimento e tudo.

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