No Chile, Letícia Persiles conta como ser mãe modificou a sua visão de mundo e confessa as suas dúvidas em relação à educação do primeiro filho
O olhar de Letícia Persiles (30) faz toda a diferença. Mais do que a intensidade e a beleza do tom verde, a atriz e cantora sempre soube focar sua vida e carreira com determinação e personalidade: da estreia na TV, em 2008, na série global Capitu, na qual viveu a mítica personagem de Machado de Assis (1839–1908), dos olhos de ressaca, ao conceito do novo CD, o delicado As Cartas de Amor e Saudade. Mãe de Ariel (4), da união com o diretor da Globo Luiz Fernando Carvalho (53), ela conta durante a temporada CARAS/Neve que a maternidade inspirou o trabalho. “Ela não muda só a rotina. É bem mais, transforma a percepção do mundo, passamos a ver a partir de outro ponto de vista”, explica ela, que escreveu todas as letras e músicas do disco, com exceção dos clássicos Dos Cruces e Youkali Tango.
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– Como define o seu olhar?
– Em termos de beleza, não posso avaliar, deixo isso para quem olha de fora. Sobre meu trabalho, sempre achei fundamental observar tudo. Ator que não faz isso tem repertório menor para montar personagens. Com a música é igual. É saber do que está falando, por isso não deixo de fazer pesquisas.
– Seu grupo anterior, Manacá, misturava rock com o movimento sebastianista e o universo do escritor Ariano Suassuna. De que forma chegou ao tema?
– Através da música. Sempre gostei de ritmos como forró, baião, coco. Depois estudei o tema e li o romance A Pedra do Reino. Viajei a Pernambuco, onde a história é passada, algo realmente impressionante, mistura profano e sagrado.
– Você é religiosa?
– Me emociona a questão da fé e sou muito ligada em festas populares. Embora não tenha religião, a noção do sagrado é necessária. É saber convergir, enxergar outra dimensão no mundo material, outras esferas da existência. A arte também é isso.
– Foi o que inspirou o CD?
– Sim, passei a ter outro olhar, para dentro, para a passagem do tempo e as relações de afeto. Parei tudo em termos de trabalho. Amamentei dois anos e meio. Era outro ritmo. Estava feliz com o mundo real e com o lúdico. Gerar o alimento do filho não é falso. É algo de verdade, não é ilusão. É a própria vida seguindo.
– Valeu a pena parar?
– Claro, nem questiono. Sei que fui privilegiada, vejo mães sofrendo após o fim da licença-maternidade porque precisam voltar a trabalhar. Não gosto de julgar, mas eu não faria de outra forma, a menos que não tivesse como botar pão na mesa. Para mim foi necessário, quase hormonal. Nem pensei em carreira. Depois recuperei a sanidade. (risos)
– Você está cheia de dúvidas para escolher a escola do Ariel?
– Sou mãe de primeira viagem, estou aprendendo. Eu e Luiz trabalhamos com arte, temos uma rotina diferente. Então, a escola precisa compreender de onde vem essa criança. Tenho medo de que em um colégio mais tradicional a adaptação seja mais difícil. Dou muita liberdade. Pintamos a parede da casa, passo noções de arte. Ao mesmo tempo, sei que existe o vestibular. Por isso, as dúvidas.
– E a questão dos limites?
– Acho tão legal quando a criança tem firmeza do que quer. E Ariel é assim. Então, é muito difícil. Não quero tolher, tirar a criatividade e a confiança, mas sei que é preciso explicar as questões de espaço e de respeito. Reafirmar isso é um trabalho diário. Mas é algo delicado, fácil de errar.
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– Deseja outro filho?
– Agora seria complicado. Precisaria viver o mesmo processo e o momento é outro. Não gosto de fazer esse tipo de plano.
– Como escreve suas músicas?
– É algo muito misterioso. Acho que vem do sagrado mesmo.
– Trabalha como atriz e como cantora. Tem preferência?
– Não acho que uma atividade atrapalhe a outra, ao contrário, se complementam. Mais do que isso, é a mesma coisa, é tudo circo. Claro que cada uma tem suas especificações, técnicas, mas a energia é a mesma. Tudo é o picadeiro, o sagrado da arte.
– O olhar para a moda também é diferenciado?
– É preciso um ritual para o show, o teatro, há ligação com o sagrado. Estar no palco é como receber uma entidade. Não dá para encarar isso com qualquer roupa. Converso com minha figurinista, Thanara Schönardie, e construímos juntas. Não é conceitual. Uso o que gosto, cores, formas, texturas, tecidos, rendas e referências folclóricas e lúdicas. Não sou fechada a nada.
– Como se cuida fisicamente?
– Faço tecido, acrobacia aérea. Com isso, não preciso de mais nada. Trabalho com o peso do corpo. Uso todos os músculos e a cabeça, porque é uma atividade lúdica.
– Tem rituais de beleza?
– Gosto de maquiagem e adoro batom. Tanto pelo colorido como porque posso usá-lo até como blush. Um batom muda sua cara.
– E a estreia na neve?
– Encantadora. Parece cobertura de marshmallow, me senti Willy Wonka na Fantástica Fábrica de Chocolate. Olho a paisagem e vejo suspiros, doces, chantilly para todos os lados. E ainda tem passarinhos, cachorros, bichos. Achava que o ambiente era inóspito, inabitável, mas está cheio de vida.
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