No ar em Vai na Fé, Regiane Alves fala da importância de brigar pelo beijo entre duas mulheres na trama e revela que pode deixar a Globo depois de 24 anos na emissora
Recomeçar. Essa é a grande lição que Clara, personagem de Regiane Alves (44) na global das 7, Vai na Fé, deixa para a atriz na reta final da trama. Depois da pandemia e de intensas mudanças na vida pessoal — ela acaba de terminar o namoro com o empresárioDuda Peixoto —, Regiane ganha mais uma consagração na carreira ao interpretar a modelo que abandonou a profissão em função do marido e redescobriu o prazer ao lado de outra mulher, vivida por Priscila Sztejnman (35). O casal da ficção virou febre na vida real e mobilizou muito mais que comentários nas redes sociais.
Uma verdadeira batalha foi travada para que um beijo entre as duas atrizes fosse ao ar, conquista do elenco e dos fãs. “Por que tivemos essa discussão de novo? Fiquei frustrada, mas dei a volta por cima!”, celebra Regiane, em papo exclusivo com a CARAS no Hotel Pestana Rio Atlântica, no Rio de Janeiro.
– Como definiria o seu momento profissional?
– Esse trabalho foi uma abertura de conhecimento e de ter mais contato com a comunidade LGBTQIAPN+. Elas se sentiram representadas, participaram, me falaram que tem uns 300 fã-clubes meus! Só fez sucesso por essa forte identificação. Me vejo feliz neste momento. Entramos no ritmo de se despedir, fica muita saudade. Uma novela é a formação de uma família. É difícil reunir esse grupo, cada um tem sua carreira. Sucesso ou fracasso, os encontros ficam.
– Imaginava tanta comoção em torno do beijo?
– Quando surgiu o clima entre elas, aconteceu naturalmente. Foi ali que eu percebi a importância do trabalho, de representar pessoas que não são vistas. Gravamos as cenas dos beijos, mas um pedido de dentro da Globo para ter mais cuidado fez com que não fossem ao ar. Estamos em 2023, faz parte
da sociedade, sim! Eu e a Priscila compramos a causa. É uma forma de amor. O amor tem que ser dito, não deve ser privado. O amor de duas mulheres vai ofender tanto dessa forma? Os valores estão invertidos? Eu vivo no meio artístico, tenho amigos gays, faz parte da minha vida. Eles precisam ser representados. Tenho amigas que falam dos filhos com sexualidade fluida. Faz parte da geração. Todo mundo quer ser visto. Como artista e cidadã, trabalho para que isso seja aceito.
– Qual a importância de lutar pela cena do beijo?
– A gente gravou vários beijos que tinham sido cortados, estávamos quase desistindo. Fiquei frustrada? Claro que fiquei. Mas eu dei a volta por cima. Represento uma comunidade, devo muito a eles. Foi feito um movimento dos fãs, dos sites. Um dia, nos disseram para gravar de novo, a cena estava roteirizada. Tinha muita gente no estúdio para acompanhar, parecia final da Copa do Mundo. Gerou expectativa. A Pri é uma ótima parceira de cena, ela é precisa, é dedicada. Queremos sempre fazer de forma orgânica, foi uma cena muito delicada. Foi uma vitória quando foi ao ar. Não tem como fingir que não existe. Sempre explico para os meus filhos que precisamos respeitar. Os meios de comunicação deveriam, por obrigação, representar o brasileiro. Vai na Fé tem protagonistas negros. Isso é um avanço, temos que naturalizar.
– O que a Clara te ensinou?
– Que nunca é tarde para recomeçar. A Clara é humana, ela se sente insegura, tem medo. Ela está em transformação, autoconhecimento. Talvez o público goste dela por isso. Ela tenta acertar e erra. A Clara colocou a felicidade na mão do Theo, papel interpretado por Emilio Dantas, e esqueceu dela. A autoestima da mulher deve ser elevada, trabalhada, precisamos descobrir a força que temos. É a beleza dos 40 anos, talvez a melhor época da vida. Estamos vivendo bons tempos de aceitação em relação ao seu corpo, gostar dele como é sem comparações. Existia um padrão de beleza e você era quase obrigada a se encaixar, eu, menina, sempre pensava que os corpos são tão diferentes, as pessoas são diferentes e o bacana da vida é essa diferença. É cafona todo mundo igual. Chique é você ter personalidade, estilo, respeitar os seus limites. Você sabe das decisões, do que quer ou não quer, não sente culpa. Temos o trabalho a nosso favor, nossa independência. Os 40 são os novos 30 anos! Nós precisamos discutir e retratar isso.
– E como foi esse processo de recomeço para a Regiane?
– Fiquei oito anos casada, me separei, com dois filhos pequenos. Fiquei um tempão solteira, por opção, por querer me achar. Me descobri com muita terapia, muito cuidado. Foi um momento de busca interior, de espiritualidade, de fé. A sociedade sempre acha que você precisa estar com alguém. O lance é se permitir, pensar onde foram seus erros, o que você pode ou não aceitar. Já passei muito pelo que a Clara passou.
– Viveria um romance com outra mulher como a Clara?
– Acho que qualquer história de amor vale desde que haja desejo e vontade de ambas as partes. Nunca tive uma história de amor com outra mulher, e acho bom lembrar que o que o outro faz na intimidade deve ser respeitado.
– Você está no ar na trama das 7 e também na reprise de Mulheres Apaixonadas, exibida há 20 anos. Como avalia a sua trajetória ao longo de todos esses anos?
– Devagar e sempre. Eu sou uma atriz que nunca acreditou muito no sucesso nem no fracasso. Tinha
uma busca constante de versatilidade na carreira. Buscava personagens diferentes. Eu fui para o teatro, fui para o cinema. Estou há 24 anos na TV Globo e meu contrato com a emissora deve encerrar em breve. Fui caminhando, construindo minha carreira tijolinho por tijolinho. Sou dedicada. Nunca paro de tentar evoluir. Eu sei que estou em um momento muito bom hoje, com uma personagem linda e popular. As pessoas querem falar comigo. Daqui a pouco, já preciso pensar qual será a próxima. Precisamos sempre estar em movimento. Não ficar mal com um fracasso nem se deslumbrar com o sucesso. Continuar sempre caminhando.
FOTOS: SELMY YASSUDA; STYLING: SAMANTHA SZCZERB; BELEZA: ZUH RIBEIRO; LOOKS: INDEX, ALINE VERVAN, NAYANE, ERICA ROSA, GUTÊ E TVZ; AGRADECIMENTOS: HOTEL PESTANA E ALAN VICTOR
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