Além de estrear na TV Globo, Rebeca Carvalho teve a alegria de ver que pautas importantes em sua vida, como racismo, estão em Garota do Momento
Desde criança, Rebeca Carvalho (21) sabia que queria seguir pelo caminho das artes, mas foi quando entrou para a escola de teatro Entre Lugares, na Maré, que sua vida pegou os trilhos certos. Após atuar em algumas peças, ela foi indicada para fazer um teste para a novela Garota do Momento. E passou! Além de estrear na TV Globo, a artista, de Realengo, no Rio, teve a alegria de ver que pautas importantes em sua vida, como racismo, machismo e homofobia, estão presentes no roteiro de sua personagem. “Tem sido incrível! Quem está fora não imagina o quão fascinante e desafiador é”, diz ela, em papo exclusivo com CARAS.
– Achava que era impossível chegar até aqui?
– Achava. Nós, artistas independentes, temos o desejo de viver da arte porque é uma coisa que amamos, mas não é comum no Brasil as pessoas viverem do que amam. Isso é o mais triste. As pessoas
não vivem, elas sobrevivem. Elas trabalham com o que não gostam só para ter uma renda. Fico feliz com esse trabalho, porque sempre quis inspirar outras crianças. Se quando eu era pequena não tivesse pessoas pretas na TV, eu não teria seguido esse sonho.
– Hoje são três protagonistas negras no ar. Representatividade é um tema importante...
– A gente está vivendo um momento de sucesso. Por mais que eu tivesse inspirações na minha infância
e adolescência, não era comum. Até hoje se fala sobre o quanto a Taís Araújo foi julgada na primeira protagonista dela no horário nobre. E, hoje em dia, a gente consegue ver tantas personalidades pretas em tantos lugares, no pódio, no topo... e isso não tem valor só para a gente que está ali, mas também para quem assiste.
– Uma das pautas de Garota do Momento é o racismo. Como você vê essa abordagem?
– Quando a gente recebeu a sinopse, já me encantei. A novela tem como pauta principal o racismo
e ele não é tratado de maneira hostil, no sentido de que é muito fácil colocar personagens negros
no lugar de subalternidade. O que a gente vê na novela são personagens negros tendo suas tramas,
vivendo uma vida que pessoas negras também podem ter, não só como empregadas, como serviçais.
A Alessandra Poggi, autora, diz que a nossa intenção nessa novela é contar um Brasil que poderia ter
acontecido, mas que não aconteceu. Sei que questões de racismo, machismo e de gênero eram bem
piores. Mas será que a gente não pode sonhar um pouquinho? O horário das 6 é aquele lugar de
conforto, então a gente traz essa visão do quão ruim era, só que, ao mesmo tempo, traz leveza.
– Apesar da época, sua personagemnão deixa de ficar com quem quer ou fazer o que quer por conta do que os outros vão falar. Se vê assim também?
– Sim! Antigamente eu tinha alguns pensamentos baseados no conservadorismo. Só que, com o tempo, minha mente foi abrindo e fui entendendo que a gente pode ser julgada por qualquer coisa. Por
que vou deixar de fazer o que quero com medo do julgamento, se posso fazer o que as pessoas querem
e ainda assim ser julgada? O julgamento é inevitável, a gente nunca vai agradar 100% das pessoas. Deixar de fazer o que quero e me prender a algo que falam, que impõem, não é vida.
– A homofobia também é pauta: Ana Maria, sua personagem, acolheu o Guto – Pedro Goifman –, que está se descobrindo.
– Eu já fui e sou uma Ana Maria na vida dos meus amigos, assim como já fui um Guto e precisei de
uma Ana Maria. Já fui apoio para amigos que estavam se assumindo homossexuais, bissexuais. E antes
de me assumir, tive pessoas que me apoiaram. Ninguém consegue enfrentar o mundo sozinho. Quando
você se assume homossexual, bissexual, você tem que estar preparado para o que vier e a gente nunca
sabe como vai ser. Você vai para a rua e se preocupa se vai ser xingado por ser uma mulher e estar
com outra, ser um homem e estar com outro. Lembro de ter que defender um amigo trans não
binário, porque acontece de a pessoam não ter reação. Nessa hora, ter alguém para segurar a mão, para defender, é crucial.
– E quando você foi o Guto?
– Fui me assumir bissexual recentemente. Não era uma coisa que escondia, mas não achava que precisava falar com as pessoas. Se eu estiver com um homem, ok. Se estiver me relacionando com uma
mulher, ok também. Só que, ainda assim, entender que eu não estava fazendo nada de errado, que se eu me assumisse eu teria apoio, com certeza foi importante. Precisava me assumir, porque se aparecesse com uma mulher antes, as pessoas iriam ficar sem entender. Era necessário falar abertamente, sem ter vergonha, porque a gente é levado a ter vergonha.
– E nem ter vergonha de estar sozinha, fato que também vira questão. É o preconceito de que a mulher solteira fica pra titia...
– Eu ouvia muito isso quando era mais nova, porque não me relacionava muito. Isso não deveria ser um problema para ninguém. A gente não precisa de homem para nada. Para mim, antes só do que mal acompanhada.
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