Em pré-estreia realizada em uma segunda-feira fresca em São Paulo, Beto Brant, Renato Ciasca, Camila Pitanga e elenco contam detalhes sobre 'Eu Receberia as Piores Notícias dos seus Lindos Lábios'
Camila Pitanga (34) já interpretou personagens das mais diversas em sua carreira: desde publicitárias da alta sociedade, prostitutas do subúrbio carioca, médicas de caráter invejável e tantas outras mulheres. Em Eu Receberia as Piores Notícias dos seus Lindos Lábios, seu novo filme que estreou na noite desta segunda-feira, 9, em São Paulo, ela surge como uma mulher profunda e intensa, poeticamente comparada à força da mãe natureza e com toda complexidade que o universo feminino abarca, principalmente quando dividida entre o amor de dois homens.
“Lavínia é uma mulher muito intensa e que sofre muitas crises, com mergulhos viscerais. Um prato cheio para uma atriz desejosa de fazer uma coisa diferente. Em poucas palavras, eu resumiria essa personagem como uma mistura de desejo e loucura, ela passeia muito por essas polaridades”, avaliou Camila, admitindo se identificar com a facilidade de sua personagem de se jogar nas histórias. “Mas ela tem um caráter muito destrutivo, ela tem em um momento da vida em que não tem mais fome de viver, e eu sou desejosa de vida e de construção”, completou.
Dividida entre o amor de dois homens, cada um representando um pilar poético de sua relação com a vida, a Lavínia de Eu Receberia as Piores Notícias dos seus Lindos Lábios se vê diante do dilema de decidir entre Ernany (Zécarlos Machado -61), um pastor que a regenerou do mundo das ruas através da cura pela palavra; e Cauby (Gustavo Machado - 38), um fotógrafo itinerante com quem mantém uma relação extremamente passional e lúdica, que representa a espontaneidade da vida. Representação clara do impulso animal, Lavínia vai dividir seu amor entre os dois pontos de vista da relação com o mundo em um diálogo sobre os conflitos que permeiam a busca pela paz de espírito. O filme é fruto de romance homônimo de Marçal Aquino (54), a sétima parceria entre os cineastas Beto Brant (48) e Renato Ciasca com o escritor em mais de 20 anos de amizade.
Um dos pares românticos de Pitanga no filme, Gustavo Machado contou que mais do que um triângulo amoroso, o drama revela as diversas essências possíveis em um ser humano que convivem em torno de uma força maior, neste filme representada pela personagem de Camila Pitanga. “O que eu amo nesse filme é que ele é mítico, e que apesar de ter essa cara realista, ele tem vários planos de interpretação onde as coisas acontecem. Então os personagens acabam se tornando uma espécie de arquétipos, cada um representa uma potência dentro da história. A Lavínia para mim representa algo como a da mãe natureza, o impulso da vida como a força da floresta”, analisou.
No papel de um jornalista dúbio que manipula a relação do fotógrafo Cauby com a animalesca Lavínia, Gero Camilo (41) atribuiu à seu mergulho no universo do autor a construção de Victor Laurence, seu personagem no filme. “Para fazer esse filme nós invadimos a casa do Marçal Aquino, e adentrar a estante e a biblioteca de um autor é um grande mistério. Eu tive uma intimidade com Marçal que poucos têm, de usufruir o que ele como escritor tem por tesouro. Entrar nesse mundo foi o que ajudou a construir o Victor Laurence, que é um jornalista”, revelou. Para Gero, a grande questão de Victor Laurence, que joga com o poder da informação quando descobre sobre o caso de Cauby e Lavínia, levanta um ponto importante sobre a profissão de seu personagem: em que ponto da vida um jornalista abre mão de sua ética para seguir um universo orientado pelo poder econômico? Esta e outras questões o filme responde.
Por trás de um drama
“Este filme toca em um assunto muito precioso que é a busca paz de espírito, a espiritualidade dissociada de religião. É a sua comunicação com a sua existência, com o valor que se dá ao lugar que escolheu, à pessoa que escolheu para trocar seu afeto, seu erotismo, seu jogo da vida, seu pacto com os desafios”, esclareceu o diretor Beto Brant que, ao lado do parceiro Renato Ciasca, rodou o filme durante uma estadia de três meses no interior do Pará onde, segundo os cineastas, encontraram o Brasil mais repleto de cores que já viram.
Para Beto, a dinâmica dos relacionamentos nesta história é simples, mas completamente desprendida dos tabus que envolvem os relacionamentos humanos pautados pela religião e seus conceitos de traição, adultério e culpa. “Ela é uma mulher entre dois caras: um deles que mostra um caminho de luz e transformação, cheio de ideologia e cura; e o outro que é lúdico, mágico, um forasteiro que quer dela o agora, a felicidade, a capacidade dela de jogar com o mundo. O que eu acho legal dessa história é que esses dois caras dão a ela o direito de escolher. Porque nós temos uma cultura de julgar a questão do adultério. E este lugar em que uma pessoa não pertence à outra, em que estão ali por fascínio, é um lugar lindo. É este lugar que o filme trata de encontrar”, contou Beto Brant.
Com várias camadas de interpretação por trás do romance, cada personagem dentro deste triângulo representa um pontos de vista de dentro do filme, que o diretor trata também de esclarecer. “Cauby, por ser fotógrafo, é um cara do olhar, que sabe buscar e seduzir pelo olhar. Ele está atrás de capturar a beleza o tempo inteiro. O Ernany é a palavra, ele traz essa ideia da cura pela transcendência e pela palavra. Já a Lavínia é uma fênix constante, um corpo que foi maltratado e que para sobreviver teve que passar por traumas e aprender renascer”.
A escolha do elenco foi minuciosa para dar vida aos ricos personagens da trama. Em seu primeiro trabalho ao lado de Camila Pitanga, o cineasta Renato Ciasca revela que não só a beleza, mas a energia e disposição da atriz foram determinantes para construir a impulsiva Lavínia. Em seu melhor momento na carreira, segundo Ciasca, Camila incorporou perfeitamente o comportamento da personagem e, claro, ter nascido no berço do cinema (a atriz é filha do ator Antônio Pitanga - 72) fez toda a diferença. “Uma das características que mais gosto na Camila é seu desapego: ela pode gostar de uma história, mas se você não concorda ela se desapega e passa sempre para a próxima”, acrescentou.
Com a brasilidade necessária para incorporar a identidade física e psicológica de Lavínia, Camila Pitanga parece ter sido a melhor escolha para representar o universo da história, que no livro e no filme é ambientada no Pará. “Encontramos ali todas as cores, calores e sentimentos tão brasileiros que procurávamos para montar essa história. Encontramos esse Brasil marcante como a gente esperava”, afirmou Renato Cisca. “As pessoas dessa região do Brasil são felizes”, completou Beto Brant.
Desafios de filmagem
Mas para uma equipe desacostumada com esse Brasil caloroso e humano da região norte, onde as altas temperaturas prevalecem na maior parte do ano, filmar sob um sol de mais de 30 graus não foi uma tarefa fácil. Segundo os diretores, a equipe levou um tempo para acostumar com o clima da região, mas uma vez adaptados, a experiência de conviver com uma população que emana esse calor não só nas questões óbvias como em comportamento, deu ainda mais a ideia de estarem justamente diante do Brasil que procuravam para filmar essa história repleta de cores.
No caso específico de Camila Pitanga, em tese, o maior desafio seria fazer as cenas de nudez e sexo com os personagens de Zé Carlos e Gustavo, seus dois pares românticos na história. Mas pelo visto esse não foi o maior desafio não. "Tive a sorte de contracenar com dois príncipes, o que facilitou muito na hora das cenas de sexo, que geralmente são complicadas de fazer. Mas foi tranquilo, achei que conseguimos passar a beleza e delicadeza daquelas relações", revelou Camila. Para ela, o mergulho vertiginoso na profundidade de Lavínia foi muito mais desafiador do que as cenas de amor em casal.
Já para Gustavo Machado, que sempre conviveu rodeado pelo mundo das artes (o multifacetado ator também pinta, escreve e tem uma banda), aprender a fotografar foi o grande desafio do filme. Conhecer a técnica foi uma das requisições dos diretores, que desde o começo pretendiam utilizar as fotos tiradas pelo próprio ator para usar nas filmagens, dando assim a oportunidade deste aplicar seu olhar também na questão estética do filme. E a julgar pelo resultado, Gustavo aprendeu direitinho. "Fiz quatro meses de aula intensiva de fotografia e não consegui largar mais, hoje sou fotógrafo e amo muito colocar o mundo dentro deste quadradinho", contou Gustavo.
Para saber mais sobre os bastidores de Eu Receberia as Piores Notícias dos seus Lindos Lábios, assista esta entrevista aqui, ó: