Passado o período da paixão, quando o casal não consegue se desgrudar, cada um dos parceiros começa a recuperar a sua individualidade e a exercer a sua independência. Nada mais natural e saudável, mas nem por isso livre de riscos para a relação.
Na busca do entendimento perfeito, os apaixonados muitas vezes renunciam a seus próprios gostos e opiniões. Essa situação tem prazo de validade limitado. O senso de identidade, tão necessário para a autoestima e para uma ação produtiva no mundo, vai sendo corroído pelas abdicações da personalidade. Em algum momento torna-se premente para um ou para os dois recuperar a individualidade. Não é impossível readquiri-la mantendo a atmosfera de encantamento e paixão. Mas a recuperação de si mesmo exige ao menos pequenos afastamentos.
Esses momentos de separação, embora sejam necessários e até desejados, geram frustração. É uma frustração inconsciente, motivada pelo simples fato de a atenção não estar se dirigindo integralmente ao parceiro. Podemos comparar esses sentimentos dos amantes apaixonados aos do bebê em relação à mãe e seus movimentos de aproximação e afastamento. Na paixão há mesmo uma certa regressão que nos aproxima desses primeiros tempos. As frustrações e a necessidade de obter (se falamos de bebês) ou de preservar (se falamos de adultos) um sentimento de identidade provocam afastamentos, enquanto o enamoramento e o amor promovem aproximações.
A dinâmica se complica quando o afastamento é sentido como rejeição, o que provoca no parceiro uma resposta também de afastamento. Tudo isso pode ocorrer sem que o casal tenha consciência do que está motivando os sentimentos e as ações. Em geral, o amor acaba promovendo a reaproximaçãodo casal e a dinâmica se repete inúmeras vezes, mas vai se tornando mais suave e suportável com o tempo e a convivência.
A isso chamamos de amadurecimento da relação: ao se depararem com a realidade do outro e do dia a dia, os sentimentos primitivos mobilizados pela paixão sofrem modificações, de forma a tornar suportáveis — e posteriormente naturais — as relativas desatenções de um para com o outro. Sem perder o encantamento, cada um vai aprendendo a manter sua personalidade, ainda que modifique esta ou aquela característica pessoal. Alguma coisa de um passa sutilmente a integrar o jeito de ser do outro, não havendo o sentimento de perda de personalidade, nem tampouco o de invasão. Tudo se passa num plano inconsciente e o equilíbrio poderá ser alcançado ainda neste plano.
No plano consciente, os parceiros poderão aprender a negociar suas diferenças. Mas também poderá acontecer de se assustarem com os eventuais afastamentos e aproximações, achando que o amor está terminando, que está havendo desconsiderações. Aí, há o risco de um ou outro ter reações drásticas, que cheguem mesmo a inviabilizar a continuidade da relação. É por isso que se faz importante conhecer os motivos que provocam tais sentimentos e ações, assim como compreender que eles fazem parte da própria dinâmica evolutiva da relação. Sabendo como esta se desenvolve, o casal pode se preservar de desgastes desnecessários e evitar perdas irreparáveis.