Na terapia de casal, os cônjuges levam o paciente: o casamento
Leniza Castello Branco Publicado em 07/02/2006, às 11h35
Em minha correspondência, recebo sempre perguntas sobre a terapia de casais. Creio que será útil esclarecer nossos leitores a respeito. Para começar, uma informação: na abordagem desse atendimento, o paciente ou cliente é o casamento. Assim, o trabalho visa ajudar os cônjuges a conhecer melhor o seu relacionamento e quais são as causas dos maiores atritos entre ambos. Indica-se quando a relação é afetada por um problema que os dois não conseguem resolver. Podem participar casais legalmente casados ou não, namorados, noivos, até separados.
O casal é atendido em conjunto em sessões semanais ou quinzenais que duram uma hora ou mais. O terapeuta, que não é juiz, não dirá quem tem razão nem tomará partido. Deverá ser neutro, ajudando o casal a reconhecer os pontos responsáveis pelos maiores conflitos. Também poderá ensinar técnicas para melhorar a convivência. Procurar terapia indica boa vontade, de um ou ambos, de manter a união. Mas em geral já tentaram muito e esta pode ser a última esperança. Não será fácil. O casamento, penso, não é um meio de atingir a felicidade. Muitas vezes é sofrido e espinhoso, pois viver a dois é mais difícil do que sozinho. Quando duas pessoas se relacionam, vivem momentos de amor e de rejeição, tristeza, competição. Se forem adultos, maduros e generosos, fica mais fácil. Nem sempre é assim.
Numa união saudável, ambos devem sentir amor e atração sexual, claro. E poder: expressar sentimentos, conseguir resolver conflitos e problemas que surgem naturalmente, respeitar diferenças individuais, ter responsabilidade por suas ações (sem esperar que o outro resolva suas carências) e relacionar-se fora do casamento, cultivando amigos e interesses. Muitas vezes, porém, as pessoas se casam à espera de que o outro vá prover suas necessidades materiais e psicológicas, solucionando problemas que já deveriam ter
superado antes, com os pais, um terapeuta ou consigo próprias. A crença de que "quando casar passa" está errada. Não passa. Piora, isso sim, pois são depositados sobre o parceiro.
Durante o processo terapêutico, o terapeuta precisa conhecer um pouco sobre a vida de cada um antes de se casar. O que buscava no parceiro? O que esperava do casamento? Como foi sua infância? Como era o lar de onde vieram? Cada um traz consigo o relacionamento dos pais e talvez busque no casamento um pai ou mãe ideais, que não tiveram na infância; ou procure repetir o modelo de sua família.
A queixa mais freqüente, em uma terapia de casal, é: "Ele mudou", ou "Fui enganado", ou "Casei com uma pessoa e agora estou com outra." Não. Ele não foi enganado. Apenas projetou nela seu ideal de mulher e ela fez o mesmo com ele. Mas, conhecendo-se melhor com a convivência, mutuamente frustraram as expectativas do parceiro, que não se conforma. Ora, ninguém corresponde a um ideal, pois inexiste, é um ideal. Mesmo almas gêmeas têm diferenças e o tempo as revelará.
Recomenda-se a terapia quando um ou ambos estão infelizes, não consegue se comunicar, expressar os sentimentos e se desentendem mesmo ao tentarem fazer o melhor. Quando, sozinhos, não conseguem esclarecer o que está errado, e um ou ambos pensam freqüentemente em separar-se. A terapia não é garantia contra o divórcio, nem é a salvação do casamento. Procura compreensão e união. Afinal, quem já se amou e viveu junto, mesmo que se separe, preserva algo de bom, de ternura - exceto se houve ofensas graves. Canta Gilberto Gil (63) na sensível Drão.
"Drão, não pense na separação/ não despedace o coração/ verdadeiro amor é vão/ estende-se infinito/ imenso monólito nossa arquitetura/ quem poderá fazer/ aquele amor morrer/ se o amor é como um grão/ nasce trigo vive morre nasce pão."