Pessoas que não dão o braço a torcer podem ter tido uma mãe autoritária

Nahman Armony Publicado em 01/04/2014, às 20h29 - Atualizado em 10/05/2019, às 11h20

. -

Algumas dificuldades na relação de casal têm a ver com o que é popularmente chamado “carne de pescoço”. Um dos dois tem a personalidade estruturada de tal modo que jamais lhe é possível, em uma altercação ou em uma inicialmente amena troca de ideias, concordar com o parceiro, por mais que ele apresente razões sólidas para seus pensamentos e sentimentos. Isso pode desgastar mortalmente a relação, que, não fosse essa característica de personalidade, poderia ser frutuosa e feliz.

A origem desse traço de caráter, comumente apelidado de “não dar o braço a torcer”, podemos encontrar na relação ambiente/criança, e mais especialmente na relação mãe/filho. Estamos, então, diante de uma mãe invasiva, dona da verdade, autoritária, que não leva em consideração desejos, necessidades e respostas do filho, desconsiderando-os por meio de uma torrente de palavras que acaba com qualquer possibilidade de manifestação verbal. A vontade da mãe sempre é a que prevalece.

Para preservar sua autoestima, a criança opõe à enxurrada de argumentações falaciosas uma barreira que não distingue o significado do que está sendo dito, pois qualquer brecha, qualquer admissão de que existe alguma verdade no que a personificação materna diz é usado por esta como arma para derrubar a individualidade e independência da criança.

A internalização dessa maneira de ser tem mais desvantagens do que vantagens. As vantagens estão na construção de uma personalidade forte, que não se dobra, não se deixa seduzir nem influenciar. Certo grau de firmeza é útil na neutralização das seduções que o mundo oferece. Mas, levada ao extremo, torna a pessoa pouco adaptável e de difícil convívio, prejudicando suas relações pessoais e profissionais. Também a impede de aproveitar as percepções do outro a respeito de si e de aprender com a experiência alheia, perdendo extraordinária fonte de crescimento psíquico. E, talvez o mais grave, perturba suas relações intersubjetivas, em especial as mais íntimas.

Da gama de reações que podem ocorrer a partir dessa forma de funcionamento psíquico, destaco três situações. Na primeira, a vítima das invasões maternas mantém o comportamento de oposição como algo indispensável à sua sobrevivência psicológica, e, apesar disso, já fora do enfrentamento direto, assimila algumas das coisas ditas pelo companheiro, modificando seu comportamento. É uma situação que, embora com alguma precariedade, permite manter a relação amorosa. A precariedade vem do fato de o não reconhecimento de atitudes inadequadas mexer narcisicamente com o seu par, pois ele não se vê reconhecido, já que suas ponderações não são aceitas.

A segunda situação é a da bissexta aceitação da percepção do companheiro. Ela dá lugar à esperança de redução do fechamento incondicional ou quase incondicional às palavras do outro. E na terceira situação, o pior cenário, é a absoluta inutilidade de qualquer tentativa de abertura da barreira, tamanho é o medo de ser atacado e dominado, o mesmo medo que o levou um dia a se defender da figura materna. Pode-se dizer que a relação está fadada ao fracasso. Só uma terapia poderá modificar essa maneira de ser.  

Revista

Leia também

Rebeca Andrade avalia sua trajetória: 'Nada cai do céu, mas é possível'

Gi Fernandes reafirma soberania de suas decisões: 'Tive dentro de mim que eu ia conseguir'

Maurício Destri destaca transformações após a paternidade: 'Alinhado com meu amadurecimento'

Frederico Lapenda: Trajetória de cinema

Gustavo Mioto abre o coração ao falar de Ana Castela: 'Uma das salvações para o sertanejo'

Kênia Bárbara comemora personagem em Os Outros: 'Confiança no processo'