A estilista alagoana Martha Medeiros transformou a renda em artigo de luxo cobiçado por mulheres do mundo inteiro. Confira entrevista exclusiva para o CARAS Fashion!
A estilista alagoana
Martha Medeiros transformou a renda em artigo de luxo cobiçado por mulheres do mundo inteiro. Valorizando o trabalho artesanal de rendeiras do interior do nordeste, a estilista mistura as características
regionais do bordado com elementos da alta-costura francesa. celebridades como
Amanda Setton, do seriado
Gossip Girls, já se renderam à novidade.
Uma das particularidades de se criar moda é que a inspiração pode estar em qualquer lugar. Na arquitetura, nas ruas, em distantes culturas. Com Martha Medeiros não é diferente. Mas a questão está onde se busca esta inspiração. Para Martha, pode significar até uma viagem à Ilha do Ferro, a 320 km de Maceió. Foi lá que ela encontrou a renda
boa noite, criada a partir de uma técnica rara e que só existe nesta região, em pleno rio São Francisco.
Em busca do inusitado, a estilista construiu sua marca, hoje reconhecida internacionalmente. E fez o que muitos buscam na moda, mas poucos alcançam com sucesso: unir universos distantes para criar algo único. Sua última coleção, por exemplo, traz os temas rock (que mistura a renda com tachas e malhas metalizadas), melted (mix de renda com tecidos nobres) e dream (renda com tingimento em degradê e inspiração no mar).
"A minha proposta desde o início é produzir a melhor roupa do mundo, aliando o artesanato com a alta-costura. Acho que consegui", diz a estilista. A seguir, ela conta como isso aconteceu.
- O que torna a sua renda um artigo tão especial?
- Tudo o que faço é juntar a preciosidade desse material feito à mão com o aviamento, acabamento e corte da alta-costura francesa numa linguagem contemporânea. Mas antes disso tudo há muita pesquisa de tendências mundiais, para que a roupa tenha sempre um ar atemporal. Também faço questão de, sempre que possível, trazer as rendeiras que trabalham comigo para conhecer a cidade grande, porque, se eu deixasse, elas continuariam a fazer a renda da forma que aprenderam e nem arriscariam usar cores novas de linhas, por exemplo. E sem isso, meu trabalho ficaria sempre igual. O mais interessante e o que confere exclusividade às peças é a customização que a renda permite, desde a escolha da cor, dos fios, das
pedras e cristais que podem ser aplicados. Isso sem falar nos desenhos e pontos do material, que ampliam o leque de opções de textura e garantem o movimento do tecido, mantendo o direito e o avesso das roupas iguais.
- Como é o processo de produção das suas peças?
- Tenho parceria com rendeiras de pequenas cidades, às margens do rio São Francisco, em Alagoas, que trabalham para mim em sistema de cooperativa ou associação. Elas confeccionam a renda, que é enviada para o meu ateliê, em Maceió, onde há uma equipe para cuidar do tingimento, lavagem e bordados. Depois disso, a roupa vem para São Paulo, onde tenho outro ateliê, em que são feitas as estruturas que vão por baixo da renda, para dar forma à roupa. Por fim, vem a parte mais difícil, negociar com os fornecedores de fitas e fios para que eles produzam novas cores, além das três ou quatro que estão acostumados a fazer.
- Por que a renda é um artefato tão particular? Quais são os tipos de renda?
- A renda é o resultado de um entrelaçamento de fios de linho, seda, algodão e até mesmo ouro, que forma desenhos variados por meio de pontos. Esse trabalho manual existe no Brasil desde a época da monarquia, e foi passado de geração para geração - tanto que as mulheres rendeiras aprendem o ofício desde pequenas. É por isso que ela é tão especial. A renda filé, por exemplo, é feita a partir de uma rede de pescador. Já a renascença, a mais conhecida de todas e a mais utilizada, tem sua trama executada a partir de um desenho riscado em papel manteiga, fixado em uma almofada e executada com agulha comum, utilizando fita e lacê para unir as tramas. E a renda singeleza é a mais frágil e a mais fina de todas, e é toda trabalhada com linhas e palitos de palha.