Escrevi recentemente sobre a importância da discrição nas relações afetivas. Vou continuar o assunto referindo-me agora a um costume que gera desentendimentos entre parceiros: o hábito de contar aos amigos e parentes o que se faz ou o que se vai fazer, sem considerar que isso pode desagradar e expor o cônjuge. Imagine a cena, leitor.
O casal está em viagem e a mãe do marido liga perguntando onde o filho está, por que viajou, a que horas vai chegar e se está só ou foi com a esposa. Imagine também que a mãe liga todos os finais de semana com perguntas desse gênero.
Você acha impossível? Pois não é. A esposa se sente exposta e isso a desagrada. O marido argumenta que é legítima a preocupação da mãe, mas será? Ou seria controle? Se fosse só preocupação, não bastaria perguntar se está tudo bem?
Alguns diriam que não há problema, afinal ele não está falando coisas importantes. De fato. No entanto, a frequência com que a cena se repete pode realmente incomodar.
Do mesmo modo, já ouvi queixas de rapazes que se sentem constrangidos quando, na fila do motel, ou mesmo no quarto, a namorada, ao receber o telefonema de uma amiga, se põe a descrever o lugar e as opções que ele oferece.
Homens se incomodam também quando as esposas falam para amigas e parentes sobre os negócios que o casal está fazendo. Um paciente revoltado certa vez jurou nunca mais compartilhar com a mulher os investimentos que fazia, porque ela comentava o assunto com o irmão. Outro ficou chocado quando sua companheira invadiu a academia onde ele se exercitava, pois se achou no direito de cobrar da instrutora uma roupa mais adequada.
Com frequência recebo ligações de esposas e maridos invasivos querendo saber se o cônjuge havia estado na sessão habitual. Eles se revoltam quando não obtêm de mim a informação desejada. Não se dão conta da vergonha que impõem aos parceiros e de como isso os afasta deles.
Se pensarmos bem, trata-se de uma questão de educação. Pessoas bem-educadas sabem ser discretas, privilegiam a privacidade nas relações e respeitam o espaço do cônjuge. É certo que alguns não se incomodam com essas questões, porém, para outros, elas são aflitivas. E, cá entre nós, ainda que um hábito não incomode, não quer dize que seja adequado. É por isso que devemos refletir sobre o assunto.
Numa época em que programas de TV expõem o tempo todo a intimidade de casais, o respeito à privacidade é uma virtude. Ao compartilhar certas informações sobre a vida em comum, é preciso considerar que isso pode constranger nosso parceiro.
Como em tudo que se refere às relações, não há solução pronta para a questão. O caminho é a descoberta mútua, a atenção ao modo de ser do outro, a coragem da entrega ao dizer o que nos constrange e expõe, a conversa madura e a atenção às necessidades do outro, sem desconsiderar as próprias. Este é um caminho a ser construído pelos casais, embora, por enquanto, sensibilize só a minoria. Muitos ainda precisam descobrir que onde não há o privado, impera o público, o que nos torna reféns da opinião alheia e nos sujeita a ter nossa intimidade discutida na mesa de um bar, por pessoas que não têm o menor compromisso com nossa felicidade.