De tempos em tempos, variam as "permissões culturais" para determinados sintomas ou quadros psicológicos e relacionais. Se em um momento são rejeitados, em outro passam a ser admitidos, sem maiores críticas ou autocontrole. A TPM, tensão pré-menstrual, é um bom exemplo disso.
É sabido que fatores fisiológicos e hormonais desencadeiam os sintomas pré-menstruais. Não vou discutir isso. Atenho-me aqui ao álibi que a permissão cultural à TPM pode dar a determinados comportamentos gerados por ela e ao impacto deles na vida conjugal.
Por muito tempo ouvi queixas de mulheres sobre os sintomas dessa fase e a incompreensão do parceiro em relação a eles. Também ouvi muitos relatos de homens sobre seu desconforto com relação às queixas e ao comportamento da companheira no período em questão e sobre a sua sensação de impotência diante dele.
Aos poucos fui enxergando como os sintomas da mulher e as reações do homem se tornavam um jogo retroalimentador, do qual nenhum dos dois saía ganhando. Passei a chamar esse fenômeno de TPM do casal.
A certeza de que em determinado momento do mês a mulher vai ficar mais irritada, mais sensível, mais agressiva prepara o terreno para o parceiro se permitir ficar mais irritante, menos cuidadoso, mais irônico. E ela, sabendo que ele não vai acolher amorosamente seus sintomas, sente-se no direito de ficar magoada e fragilizada.
Não importa quem começa o processo, mas é importante procurar enxergá-lo para tentar mudar os comportamentos. Assim, o temido período pode passar a ser aproveitado pelo casal para descobrir novas formas de ficar mais próximo, amoroso, cuidadoso.
As dificuldades emocionais e/ou sexuais, as carências com relação ao parceiro, a vida agitada e a sobrecarga de tarefas que já fazem parte da vida da mulher ficam exacerbadas nesses dias, com o aumento da sensibilidade. As lágrimas tornam-se difíceis de controlar e a irritação aumenta, assim como expectativa de atenção e carinho - e tudo é agravado pela certeza de que o parceiro não vai atendê-la.
Por sua vez, o homem, certo de que aquilo que já não vai bem na relação piorará nessa fase e de que não vai conseguir fazer o que a parceira deseja, rejeita acatar as demandas dela. Em lugar disso, faz brincadeiras e ironias sobre a TPM ou exigências, cobranças de comportamentos mais adequados.
O casal desenvolve uma sequência previsível de ações e reações. A hipersensibilidade dela aciona a impaciência dele, que desencadeia a carência dela, que traz à tona a carência e a cobrança dele e a mágoa dela. Os conteúdos podem variar, mas o mecanismo é sempre o mesmo.
Somente casais que conseguem enxergar esse jogo destrutivo podem desmontá-lo. A mudança pode ser individual - uma das partes percebe o que está havendo e desenvolve controle sobre sua parte na interação - ou conjunta - e, neste caso, será mais intensa e profunda. Se os dois compreendem que ambos colaboram para construir as dificuldades relacionais, eles podem estabelecer uma parceria para enfrentá-la, um mostrando ao outro o que incomoda e o que pode ser mudado. O casal que adquire essa consciência, que percebe tratar-se de um processo a dois, consegue também construir uma estratégia para tornar a fase menos dolorosa e mais criativa.