Caso 1: ela fez regime após anos de casada e se tornou outra mulher. Redescobriu o prazer de sair, de ir a baladas e até a micaretas, mas ele dorme ou prefere se divertir vendo televisão.
Caso 2: ele sempre foi submisso aos desejos dela. Agora descobriu outros interesses e ela se sente ameaçada por isso.
O que há de errado com cada uma dessas pessoas? Nada. Com os relacionamentos? Tudo!
Para entendermos melhor o que acontece, vamos voltar ao início do casamento. De qualquer casamento. A mulher em geral se casa esperando que o homem mude com o passar do tempo — e ele não muda. O homem em geral se casa esperando que a mulher não mude com o passar do tempo — e ela muda. Se nenhum dos dois está preparado para lidar com a frustração das expectativas ou se só um se transforma nessa relação, passando a ter novo olhar sobre a vida, o casamento está fadado a acabar. A outra alternativa é que se transforme em solidão a dois. Isso é pior do que estar realmente só, situação em que ao menos a pessoa pode contar consigo mesma e refletir sobre seus erros e acertos. Um casamento em que um dos parceiros não percebe (ou não aceita) que o outro cresceu ou se modificou — e fica preso na relação como um bicho que não quer perder sua presa — lembra o pires de uma xícara: serve apenas de apoio, mas não tem profundidade.
Em seu livro Por Que os Homens São como São, o norte-americano Warren Farrell (68) sinaliza que homens e mulheres se sentem frustrados por razões diferentes. Cada um tem seu desejo secreto, sua fantasia primária, aquela que o impulsiona para o que está faltando em sua vida. Se esses desejos são muito diferentes após o casamento, um hiato começa se estabelecer entre os dois, a ponto de não se reconhecerem mais um no outro e começarem a se questionar: “O que estou fazendo aqui?”.
O que, afinal, significa estar junto? Ou, melhor dizendo, até quando vale a pena estar junto? Se há uma receita para fazer o amor durar é esta: não deixar de cuidar de si mesmo — e aqui falamos de mente e corpo —, não deixar de pensar sobre sua vida e sobre o que está fazendo dela, qual o seu futuro, e não abandonar os amigos. Além disso, deixar que seu parceiro ou parceira faça o mesmo. Adequar-se ao papel conjugal não quer dizer ficar sujeito às supostas preferências — ou ordens — do outro. A liberdade de cada um é o que oxigena a relação. A regra é simples: se você gosta mesmo da pessoa, deixe-a livre. Se ela voltar é porque sempre foi sua; se não voltar, é porque nunca foi.
Mas liberdade combina com casamento? Sim. Liberdade combina com crescimento individual, que é saudável para a vida a dois, em que um se recarrega com a energia do outro e os dois crescem juntos, amadurecendo e fortalecendo o vínculo. Casais que vivem assim aprendem a enfrentar os desafios constantes que toda relação apresenta.
Mas isso não é tão simples, e muitas vezes resulta em dor. Amar, mais do que uma gostosura, é um consumo grande de energia. Quando, numa relação, um dos dois percebe que o envolvimento é unilateral, ele segue adiante, buscando amar a si mesmo primeiro, até o momento em que fica pronto para encontrar outra pessoa e começar tudo de novo. Afinal, como escreveu Clarice Lispector (1920-1977): “Quem caminha sozinho pode até chegar mais rápido, mas aquele que vai acompanhado com certeza vai mais longe”.
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