...termo a outro, como chamar de raposa o astuto, pois seus atos lembram o animal predador. Quanto a teocracia, formada do grego theós e krátos, deus e poder, é governo outorgado por deuses ou Deus.
Escárnio: de origem controversa, provavelmente de escarnir, do germânico
skirnjan, burlar, enganar, debochar, pelo latim vulgar
scarnire ou
schernire. As cantigas de escárnio e maldizer atestam que o significado satírico do vocábulo estava presente na língua já no século XIII.
Cruz e Sousa (1861-1898) tem um poema intitulado
Escárnio Perfumado:
"Quando no enleio/ De receber umas notícias tuas,/ Vou-me ao correio,/ Que é lá no fim da mais cruel das ruas,/ Vendo tão fartas,/ D'uma fartura que ninguém colige,/ As mãos dos outros, de jornais e cartas/ E as minhas, nuas - isso dói, me aflige.../ E em tom de mofa,/ Julgo que tudo me escarnece, apoda,/ Ri, me apostrofa,/ Pois fico só e cabisbaixo, inerme,/ A noite andar-me na cabeça, em roda,/ Mais humilhado que um mendigo, um verme...".
Metáfora: do grego
metaphorá, pelo latim
metaphora, transporte. Figura de linguagem que transporta o significado de um termo para outro, como chamar de raposa a pessoa astuta, por seus atos semelharem os do animal predador de aves. Outro exemplo com o mesmo mamífero é escarnecer de pessoa em quem não se pode confiar: diz-se que nomearam a raposa para cuidar do galinheiro. Algumas estão muito desgastadas, como a de dizer de quem faz aniversário que colheu mais uma flor no jardim da existência. Na fala coloquial do brasileiro há abundantes metáforas com o futebol. O presidente da República,
Luiz Inácio Lula da Silva (60), por exemplo, lançou mão de uma no começo de seu governo, denominando
José Dirceu (60) capitão do time (o ministro mais importante) para armar o time (organizar a equipe) e driblar (vencer) a crise.
Punir: do latim
punire, punir, castigar, aplicar a pena, em latim
poena, radicado no verbo grego
poiné, resgate pago aos parentes da vítima de homicídio. Não confundir com
penna, a pluma das aves, utilizada para escrever, pena em português. Ao estudar o sistema legal do povo hebraico, o filósofo
G. W. Leibniz (1646-1716) criou a palavra alemã
Theodicee, traduzida como
théodicée para o francês, língua da qual chegou ao português teodicéia, para designar um sistema jurídico baseado em preceitos divinos. A base foram as palavras gregas
theós, deus, e
diké, direito, justiça. Como nesse sistema crime é pecado, as prescrições jurídicas, morais e religiosas são misturadas. O primeiro pecado, por isso mesmo o original, foi identificado por teólogos como a soberba, porque a criatura não reconheceu o seu lugar e quis ser igual a Deus. Outros viram ali a condenação da ciência, porque o casal, tentado por Satanás, ousou provar do fruto da árvore do Bem e do Mal. Em tal sistema, Deus primeiro legisla; em seguida, identifica e denuncia a transgressão; e por fim julga, aplicando a pena de expulsão do paraíso, acrescida de dores no parto e submissão ao marido, para Eva, e o ganho do sustento com o trabalho, para Adão, culminando com a morte, item previsto na criação:
"No dia em que comerdes do fruto proibido, nesse dia morrereis."
Roçar: do latim vulgar
ruptiare, roçar, radicado no verbo culto
rumpere, romper, rasgar, arrombar, fazer marcas, formado a partir do particípio
ruptus, rompido. O nome de conhecida favela do Rio de Janeiro, a Rocinha, tem essa raiz, pois procede de roça, terreno de onde se tirou o mato para o cultivo. Como era costume os moradores da orla terem uma pequena roça naquele morro, a localidade ganhou o nome de Rocinha. Roçar tem também o sentido de tocar de leve, deixando marcas metafóricas, tal como aparece em
Cântico para Soraya, uma Princesa Sefardita, recente livro da poeta
Neide Archanjo (64), publicado em francês pelas
Éditions Eulina Carvalho, em Paris, e em português pela Girafa, em São Paulo:
"Teus lábios/ fitas escarlates/ aguardam o meu beijo./ Com um só/ de teus olhares/ roubaste meu desejo./ Negros cabelos/ roçam meu rosto/ e sussurram mistérios/ aos meus ouvidos." Ou em francês:
"Tes lèvres/ rubans écarlates/ attendent mon baiser./ D'un seul/ de tes regards/ tu accapares mon désir/. Des cheveux noirs/ caressent mon visage/ susurrant dês mystères/ à mes oreilles."
Teocracia: do grego
theokratía, governo de deuses, pela formação
theós, deus, e
krátos, poder, autoridade, governo, supremacia. Foi dos primeiros sistemas de governo e o poder era concebido como outorgado por deuses àqueles dirigentes e não a outros. Com o advento do monoteísmo, de que é exemplo-símbolo o Estado hebreu, surgiu uma monarquia teocrática baseada em leis que teriam sido ditadas por Javé. Todavia, o rei era fiscalizado pelas 12 tribos, que observavam se ele seguia os livros sagrados, denominados
Torá, a Lei. No século II a.C., a
Torá recebeu o nome de
Pentateuco, ao ser traduzida para o grego -
penta, cinco;
teúchos, livros -, porque cinco livros formavam o conjunto:
Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio.