Com a mulher, ele conta sua via-crúcis após 110 dias de internação e mostra fé na cura
O humorista
Chico Anysio (80) vem dando exemplo de superação e amor à vida. Ao lado da empresária
Malga Di Paula (41), sua mulher há 13 anos, ele recebeu CARAS em seu apartamento na Barra da Tijuca, Rio, e falou de seu drama. Vem enfrentando uma série de internações decorrentes, principalmente, do enfisema pulmonar diagnosticado há 25 anos, após ter fumado por período igual. A mais dura batalha foi vencida este ano, quando esteve à beira de perder a vida em três ocasiões durante os 110 dias em que permaneceu internado, até 21 de março.
"Não tenho medo da morte, ela é inexorável. A vida só nos dá essa garantia. Mas tenho pena de morrer porque são tantas as ideias para realizar e não vou ter tempo. E há tanto filho que precisa ainda de mim, os netos que posso ajudar a criar", afirmou ele.
"E ainda há três amigos atores para quem dou cesta básica e três para quem pago aluguel, caso contrário, eles morrem de fome e não moram", completou.
A via-crúcis de Chico foi provocada inicialmente com a obstrução da artéria coronariana, quando ele foi então submetido a uma angioplastia no fim de dezembro. O quadro se agravou com uma pneumonia nos dois pulmões. Além disso, ele precisou passar por uma traqueostomia, que deixou problemas na fala. O ator teve que passar por sessões de fonoaudiologia e atualmente faz fisioterapia diariamente para voltar a andar. Mesmo usando cadeira de rodas para se locomover e, em muitos momentos, um aparelho portátil de oxigênio, Chico tem ido ao Projac semanalmente, onde grava a personagem Salomé, do
Zorra Total.
"Ele não usa oxigênio o dia todo, mas, para fisioterapia, precisa. Por conta do enfisema, tem somente 40% de capacidade respiratória", frisou Malga, que, apoiada pelo governo turco, vem dividindo seu tempo com o projeto de construção de um memorial para São Jorge, na Capadócia, onde o santo teria nascido. A inauguração está prevista para 2012.
- Chico, como você se sente?
- Tinha problemas no coração para os quais não dava atenção de tão pequenos que aparentavam. Só após ir para o hospital, percebi que eram enormes. Mas me livrei de todos e estou melhor do que antes. Só falta reaprender a andar. Em 45 dias estarei como era.
Malga - Faz uma hora de fisioterapia respiratória e uma de motora todos os dias. E já progrediu bastante. Quando voltou para casa, não conseguia ficar em pé. Fora isso, toma a medicação e não tem nenhuma restrição.
- E para você, Malga, quais foram as maiores dificuldades?
- Foi uma fase horrível. Faço até terapia, estou com depressão póstraumática. Várias vezes falaram que ele não passaria daquela noite. Mesmo quando estava em coma, dizia a ele, "fique vivo", porque a qualquer momento pode surgir a cura para a doença. Sempre acreditei que iria trazê-lo para casa. Quando chegamos do hospital, ele disse: "Você prometeu e cumpriu". Que bom que tudo deu certo, mas minha certeza de vez em quando se abalava devido ao quadro. O pior momento foi de 15 a 20 de janeiro. Ficava deitado, dormindo, sem noção do que estava acontecendo. E me disseram que ele estava com a superbactéria. Restava apenas o último antibiótico. Se não desse certo, teria que buscar um americano.
- A vontade dele de sobreviver fez a diferença?
Malga - Com certeza. Desde que acordou na UTI tem sido superaplicado em tudo que é preciso.
- Chico, você chegou a achar que não sairia vivo do hospital?
Chico - Pelo contrário, sempretive certeza de que iria melhorar.
- Qual foi o pior momento?
Chico - Quando soube que meus filhos estavam contra eu mudar de médico, influenciados pelo meu irmão. Comigo ele não estava 100%, então, nós trocamos.
- O que seu médico fala sobre o enfisema, existe algum prognóstico positivo?
Chico - Não, é um mal que veio para ficar. Mas para tentar reverter isso, estou abrindo com Malga a Fundação Chico Anysio, sem fins lucrativos, para angariar recursos para cientistas que estão no Brasil, o país mais adiantado nos estudos com células-tronco, mas que falta dinheiro para as pesquisas. Vou tentar ajudá-los. E é um dinheiro bendito, quem dá desconta no imposto de renda. A célula-tronco é a grande novidade da medicina. Há especialistas com a certeza de que ela pode curar até mesmo um tetraplégico.
Malga - Tenho urgência de arrecadar esse dinheiro para dar continuidade às pesquisas, primeiro porque pode ser a cura para o problema do Chico. E também porque pode ajudar 220 milhões de pessoas no mundo que sofrem do mesmo mal. Acho que em dois meses conseguiremos a liberação para começar a correr atrás de tudo. Precisamos obter recursos para tratar 40 pessoas. O Chico vai ser uma delas. Quando estava internado e falavam que não resistiria, dizia que ele ainda tinha muita coisa para fazer, como deixar esse legado para a humanidade, tentar começar a encontrar a cura do enfisema e conscientizar as pessoas contra o tabaco.
- Como ele reagiu à morte da irmã, a atriz Lupe Gigliotti, em dezembro do ano passado?
Malga - Deixamos para contar no dia anterior à volta dele para casa. Chico ficou um tempo em silêncio e cantou uma música feita para ela, sobre a mana velha que lhe dava um dinheirinho. Foi emocionante, não esperava essa reação. Mas ficou com pena, pois não pôde vê-la. E questionei o motivo pelo qual só havia perguntado uma vez por ela, no que respondeu: "Porque Lupe esteve aqui no hospital".
Chico - Recebi com naturalidade, sem grande sofrimento, porque era esperado. Ela tinha me ligado na véspera da minha internação, se sentia cada vez pior e achava que não ia sair dessa. Quando soube, pensei: "Descansou". O câncer é terrível, me levou amigos e agora, minha irmã.
- Estava lúcido quando a viu?
Chico - Estava acordado. Lembro de ela me falar, "já vou, não posso demorar".
Malga - Pelo que diz, isso teria acontecido após a morte de Lupe. Não sabemos o que existe além do que os nossos olhos veem. Certamente, são coisas especiais.
- Essa internação modificou o modo de ele encarar a vida?
Malga - Acho que sim. Ele passava os dias no computador. Agora, quer curtir mais, adora ir ao shopping fazer compras. É um homem romântico. A primeira vez que foi passear após a internação, me trouxe uma medalha linda de São Jorge. Chorei, a fé nele me ajudou a ficar forte ao lado do Chico.
- O companheirismo e a força da Malga foram importantes?
Chico - Malga é o que de melhor aconteceu na minha vida. É minha professora, aluna, namorada, amante, companheira, colega, um presente de São Francisco. Sem ela, não sou nada. Quando a conheci, me trouxe a vida. Eu estava para baixo. Com a chegada dela, renasci. E acho que vou chegar aos 90 porque ainda me restam quatro vidas. Três ficaram no hospital.
Malga - Ele também é tudo para mim, meu príncipe encantado. Minha história é parecida com um conto de fadas. Já fui a Gata Borralheira. O Chico mudou minha vida, sou tão feliz, me sinto uma princesa. Todo dia, aprendo muito com ele, que é uma enciclopédia.
- Deseja retornar aos palcos?
Chico - Só quando voltar a andar e estiver 100%. Tenho um show, o
Eu Conto, Vocês Cantam, que vai ser a minha despedida dos palcos. Depois, não vai ter mais sentido sair de casa no fim de semana para fazer show.