Muito se tem falado sobre a síndrome do ninho vazio, um dos desafios que o casal maduro enfrenta. Até o cinema já abordou o assunto, em filmes como Ninho Vazio, de 2008, dirigido pelo argentino Daniel Burman (39). O roteiro é conhecido: os filhos se vão, a casa se esvazia, o ponto maior de convergência do par se dilui e subitamente marido e mulher estão nus, um diante do outro, num olhar mútuo em cujas pupilas não mais aparece a prole, mas a própria alma, com suas verdades e mentiras, convenientes e inconvenientes. É preciso um período de adaptação para elaborar a perda dos rebentos e também para enfrentar a emergência do que até então ficara em banho-maria: as lutas burlescas pela posse de pequenos poderes e evanescentes verdades, as diferenças de concepções e comportamentos, as transferências de culpas, as projeções das frustrações.
Mas isso não é tudo. Há um desafio adicional para os casais que vivem esse momento hoje. Ele está relacionado à condição histórica de mudança de mentalidades. O grupo etário em questão viveu a transição entre uma geração que dogmatizou a repressão dos instintos e outra, que já nasceu numa mentalidade permissiva.
As proibições paternas e sociais marcaram essas pessoas, pois elas tiveram de lutar não só contra a rígida ideologia dos pais, mas também contra os preconceitos incutidos nos seus inconscientes, que teimosamente lhes enviavam mensagens reprovativas, provocando culpa quando se atreviam a desafiar a moral sexual da geração que a precedeu.
Uma das formas encontradas para combater o tabu da repressão foi criar um tabu contrário: sexo livre obrigatório. Transar intensamente passou a ser um imperativo categórico. Para o casal jovem esse imperativo passava despercebido por coincidir com seus desejos apaixonados. Com a vinda dos filhos, a vida profissional e a intimidade do dia a dia, porém, a vida sexual é quase inevitavelmente afetada — se não em intensidade, ao menos em frequência. Ao mesmo tempo, o envelhecimento leva à redução fisiológica da libido. Mas o imperativo categórico “transar” unca saiu da mente do casal, que só não o realizava — justificavase — devido ao tempo dedicado aos filhos e à profissão, e pelo cansaço e tensão que estes acarretavam. Eis que chega a meia-idade, os filhos sevão, a situação financeira não mais preocupa, o tempo de lazer aumenta e os dois se veem sozinhos, envergonhada e desconfortavelmente, indo com desespero atrás do desejo sexual da mocidade. É o imperativo categórico se manifestando: eles precisam transar, pois precisam provar aos fantasmas do porão do inconsciente que são livres.
Vejam o paradoxo: eles são obrigados a ser livres e se obrigam a transar para provar que são livres. Mas o ímpeto da juventude já vai longe, o corpo envelheceu e a libido amornou, manifestando-se de maneira cada vez mais espaçada, mas também mais suave, carinhosa, serena. Quando o casal se conscientiza e incorpora estes aspectos como pertencentes a uma evolução inevitável, própria do passar do tempo, desaparece o constrangimento da obrigação sexual. Ele
poderá então esperar com tranquilidade a visita da libido para usufruir um sexo deleitoso que não tem a obrigação do orgasmo, embora possa lá chegar com sua carga de paixão.
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